domingo, 11 de maio de 2025

Mera provocação – Eliane Cantanhêde

O Estado de S. Paulo

Como os vândalos do 8/1, o deputado Ramagem é só pretexto para salvar Bolsonaro do STF

A decisão relâmpago da Câmara de suspender o julgamento do atual deputado Alexandre Ramagem é a antessala da aprovação da anistia para os golpistas de antes, durante e depois do 8 de Janeiro e, mais uma vez, perigosamente, isola o Supremo na linha de frente na defesa das instituições e da democracia. Tanto no caso de Ramagem quanto na anistia, o objetivo é livrar a cara de Jair Bolsonaro.

Ao votarem contra o Supremo e a favor de Ramagem, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e o plenário da Câmara fizeram uma provocação ostensiva ao Poder Judiciário e abriram uma crise institucional, pois a Constituição é clara ao estabelecer que o Congresso pode sustar ações penais exclusivamente contra parlamentares e apenas por crimes cometidos durante o mandato.

Foram dois erros intencionais. Três dos cinco processos contra Ramagem, por tentativa de golpe, foram por crimes anteriores ao mandato, quando ele era diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) no governo Bolsonaro. E, ao não se referir unicamente a ele, a Câmara deixou em aberto a extensão da suspensão a todos os integrantes do “núcleo crucial” do golpe, como Bolsonaro, generais e o almirante Almir Garnier. Nenhum deles tem mandato.

A primeira turma do STF contra-atacou atendendo a suspensão só para Ramagem e só nos casos de dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado, em 8/1, quando ele já tinha sido diplomado deputado, e negando para abolição violenta do estado democrático de direito, golpe de Estado e organização criminosa, na Abin. E o STF ratificou que o Congresso não tem poder para sustar ações de quem não tenha mandato parlamentar – como o ex-presidente.

O “caso Ramagem” mostra a força e a audácia do bolsonarismo no Congresso e vem no rastro de uma série de erros, derrotas e más notícias para o presidente Lula, seu governo e sua base parlamentar. Como resultado do desequilíbrio, o poderoso e fluido Centrão, que pode ir para um lado e para o outro, desliza cada vez mais ostensivamente para o lado bolsonarista – apesar de ministérios, viagens no avião presidencial e salamaleques nas residências oficiais da Câmara e Senado.

Até onde Lula pode contar, ou confiar, em Davi Alcolumbre, no Senado, e Hugo Motta, na Câmara? Não precisa nenhum Sherlock Holmes para responder. Aliás, o jovem Motta, legítimo representante do Centrão e filhote do antecessor Arthur Lira, foi decisivo para o golpe da Câmara contra a Constituição e o Supremo, sabendo que, como os vândalos do 8/1, Ramagem é só pretexto para tumultuar o ambiente e tentar salvar Bolsonaro – do STF e da cadeia.

 

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