sexta-feira, 4 de julho de 2025

Quanto Lula quer crescer nas pesquisas até o fim do ano - Andrea Jubé

Valor Econômico

O objetivo é que ele alcance 40% de ótimo e bom

Aprendi uma palavra nova, não com a inteligência artificial, mas com o poeta Manoel de Barros (1916-2014), uma quase terapia nesses tempos de muito embate e intolerância, instabilidade e reveses. “Arúspices”: palavrinha estranha e feia, mas que dialoga com o ambiente político. Ela me fez pensar no presidente Luiz Inácio Lula da Silva em confronto com o Congresso, e sob alta pressão dos aliados porque 2026 chegou mais cedo, a campanha está nas ruas, nas redes digitais e sua popularidade estacionou abaixo da margem de segurança.

Traduzo. A palavra apareceu num poema em que Manoel de Barros conta a história de “Mário-pega-sapo” que, de noite, entretinha-se em abrir os anfíbios que capturava de dia em riachos, barrancos e terrenos baldios. “Abria um por um de canivete os sapos para ler nas entranhas deles o seu futuro. Eu pensava que aquele Mário-pega-sapo fosse um descendente dos arúspices, sacerdotes romanos que adivinhavam o futuro remexendo no altar as entranhas de seus inimigos”.

Os versos me evocaram uma cena de filme de terror, em que o presidente aparece com um bisturi em mãos, dissecando no altar da capelinha do Alvorada as vísceras de algum adversário, tal qual na Roma antiga, para adivinhar o seu futuro eleitoral: o quarto mandato ou a quarta derrota.

Adivinhação e mandigas ficaram para trás porque a política tem ferramentas como pesquisas quantitativas e qualitativas que permitem o ajuste de rota dos candidatos. Foi debruçados sobre pesquisas públicas e internas, numa conjuntura de baixa aprovação do governo, que generais do PT traçaram uma meta para fazer Lula chegar mais competitivo a seis meses da eleição. O objetivo é que ele alcance, até o fim do ano, 40% de ótimo e bom nas pesquisas. Algo como recuperar mais de um ponto percentual ao mês dentro desse prazo.

O diretor da Quaest Felipe Nunes disse à coluna que o PT estabeleceu uma “meta ousada”, considerando que a mais recente pesquisa Genial/Quaest, divulgada em 4 de junho, mostrou Lula com uma aprovação de 26% dos entrevistados. Segundo o levantamento, a avaliação negativa do governo é de 43%, enquanto 28% consideram a gestão regular, e 3% não sabem ou não responderam.

Nunes destacou, contudo, que um processo de recuperação da popularidade como este traçado pelo PT já aconteceu no passado. Lembrou que Dilma Rousseff, em julho de 2013, apresentou queda expressiva de 57% para 30% de avaliação positiva. Porém, em dezembro do mesmo ano, apresentou 41% de aprovação, um crescimento de 11 pontos percentuais. Ela se reelegeu em 2014, embora sem concluir o segundo mandato.

Outro exemplo: Nunes recorda que Lula também viu sua avaliação positiva derreter de 41% em março para 29% em agosto de 2005, no auge do Mensalão. Depois, pontuou quase 40% de positivo no começo de 2006, e se reelegeu. Ele ressalva que se tratam de realidades diferentes de país, e alerta que o eleitor está “mais exigente, e o produto mais desgastado”. Conclui observando que o PT “já fez essa virada em outros dois momentos da história, e pode fazer novamente”.

A pesquisa Quaest que mostrou Lula com 26% de avaliação positiva, há um mês, foi a primeira divulgada pelo instituto depois que veio à tona, em abril, o escândalo dos descontos ilegais em aposentadorias e pensões do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). O episódio deu munição para a oposição, que explora, sem cessar o caso, disseminando nas redes sociais “Lula ladrão do INSS”. A crise interrompeu um processo de melhora da imagem que estava em curso desde o início do ano, quando notícias falsas de que o governo cobraria imposto sobre o Pix viralizaram e impactaram a aprovação do presidente.

A cúpula petista acredita que essa meta é desafiadora, mas não impossível. A percepção é de que se Lula despontar em março com uma aprovação de 40%, essa marca resgataria a “expectativa de poder”, e desestimularia a eventual candidatura do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), que nesse prazo, terá de se desincompatibilizar do cargo para o projeto presidencial.

Até o momento, ele é o nome que desperta mais apreensão no PT porque tem potencial de atrair os partidos de centro e de direita, que estão hoje na base lulista, o empresariado e o setor produtivo. Porém, o carioca que busca se consolidar como político paulista também enfrenta seus fantasmas.

Se a competitividade de Lula depende da popularidade, Tarcísio precisa do apoio declarado do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), principal líder da oposição, para se viabilizar eleitoralmente. Caciques do Centrão pressionam o ex-mandatário para que ele formalize esse apoio até o fim do ano, mas Bolsonaro resiste. Está com a saúde abalada e apreensivo com a reta final do julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF), que o acusa de tramar um golpe para impedir a posse de Lula em 2023.

Manoel de Barros foi um sábio que escreveu o “Livro das Ignorãças”. Outro verso dele dialoga com Lula. “Eu vim pra cá sem coleira, meu amo. Do meu destino eu mesmo desidero”. Em meio século de política, independente do resultado, o petista sempre foi senhor de seu destino. Para ganhar ou perder, aliados asseguram que ele não vai arredar da nova briga eleitoral.

 

Nenhum comentário: