Correio Braziliense
Quem olha para o cenário político tem razões
para ser pessimista, porque o impasse entre o Palácio do Planalto e o Congresso
transbordou para a virulência nas redes sociais
O Ibovespa bateu novo recorde ontem, em meio
a uma crise política protagonizada pelo Palácio do Planalto e o Congresso, em
razão da antecipação da disputa eleitoral de 2026, tanto pelo presidente Luiz
Inácio Lula da Silva quanto pela oposição, que é liderada pelo ex-presidente
Jair Bolsonaro. A Bolsa avançou 1,35% e encerrou o dia aos 140.928 pontos,
atingindo um novo recorde. Até então, o maior nível havia sido registrado em 20
de maio, quando bateu 140.110 pontos. O dólar continua em queda, cotado a R$ 5,4049,
o menor nível desde junho de 2024 (R$ 5,3605).
Como explicar uma situação como essa, num momento em que as análises são as mais catastrofistas em relação ao desempenho da economia por parte dos analistas do mercado financeiro e dos políticos de oposição? Ainda mais num momento de impasse em relação ao ajuste fiscal, no qual o governo quer aumentar a arrecadação e não cortar os gastos sociais, enquanto a oposição e o mercado pregam exatamente o contrário.
Por exemplo: os investidores estrangeiros
injetaram cerca de R$ 21,5 bilhões na Bovespa até maio, o maior ingresso desde
2019. Isso impulsiona as ações de empresas com maior liquidez e pressiona o
índice para cima. Em parte, a expectativa de desaceleração do ciclo de juros
também influenciou o comportamento da Bolsa, porque a ata do Copom sinalizou o
fim do ciclo de alta da Selic (14,75% ao ano), o que favorece bancos e setores
alavancados.
Um outro fator é a trégua de 90 dias entre
Estados Unidos e China, que derrubou incertezas da guerra comercial,
beneficiando especialmente commodities. Com isso, as cotações de minério de
ferro e petróleo subiram, o que favorece ações de empresas brasileiras do
setor, como a Vale e Petrobras. O ambiente internacional também ajuda, porque a
inflação nos EUA veio abaixo do esperado e aumentaram as chances de cortes de
juros pelo Federal Reserve (Fed), o banco central norte-americano, que está
sendo muito criticado pelo presidente Donald Trump. O impacto nos mercados
emergentes, como o do Brasil, é positivo.
Mesmo batendo recordes, o Ibovespa ainda está
“barato” em reais, quando cotado em dólares ou corrigido pela inflação. Isso
atrai investidores estrangeiros que buscam valorizações. Por isso, o Ibovespa
subiu 1,35% e atingiu a nova máxima de cinco anos, puxada pelos setores de
finanças, energia e utilidades. Em maio, já havia rompido pela primeira vez a
barreira dos 140 mil pontos, superando 140.203 no chamado intraday — as
operações ou eventos que ocorrem dentro de um único dia de negociação, entre a
abertura e o fechamento do mercado.
Impasses
Entretanto, quem olha para o cenário político
tem sobras de razões para ser pessimista, porque o impasse entre o Palácio do
Planalto e o Congresso transbordou para as redes sociais de forma muito
virulenta e a radicalização ultrapassou os limites das narrativas. Ontem,
manifestantes invadiram a sede do Banco Itaú, na Avenida Faria Lima, em São
Paulo, em protesto pela não taxação de super-ricos. Imagens publicadas pelo
Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST) mostram dezenas de pessoas
invadindo o edifício com cartazes de mensagens como “Chega de mamata”, “Taxação
dos super-ricos já” e “O povo não vai pagar a conta”.
Além do MTST, a chamada Frente Povo sem Medo,
que reúne militantes do PT e do PSol, participou da invasão, que está sendo
atribuída ao deputado federal Guilherme Boulos (PSol-SP), que havia prometido
organizar um protesto contra deputados e senadores após derrubarem o decreto do
governo que aumentava as alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras
(IOF), na semana passada. A invasão ocorreu um dia depois de o PT realizar um
evento on-line para organizar a militância e influenciadores digitais, com objetivo
de partir para o ataque em defesa do governo e de políticas de “justiça
social”.
Episódios como esse não ajudam o governo nas
negociações com o Congresso e atiçam a oposição a se radicalizar ainda mais. É
uma ação que parece até provocação, porque a proposta de aumento das alíquotas
do IOF não atinge os bancos tradicionais, como o Itaú, mas apenas as fintechs,
os bancos digitais, que pagam muito menos impostos. A questão fiscal virou uma
guerra de narrativas que miram as eleições de 2026. O presidente Luiz Inácio
Lula da Silva caiu nessa armadilha ao tentar responder à queda de popularidade
nas pesquisas, que reduzem sua expectativa de poder e enfraquecem o Executivo
na relação com o Congresso.
Ainda bem que os ministros do Supremo
Tribunal Federal, que estão em contato com os caciques do Congresso, em Lisboa,
estão conversando para apagar o fogaréu da crise entre Poderes. Relator das
ações que tratam das emendas impositivas no STF, o ministro Flavio Dino, por
exemplo, conforme relato de nossa colega Ana Maria Campos, colunista do Correio
Braziliense, anunciou que o Judiciário arbitrará uma solução para o impasse,
“se não houver uma conciliação entre Executivo e Legislativo”.
O ministro falou sobre o assunto ao
participar do painel “Governança Orçamentária e Democracia em Regimes
Presidencialistas”, ontem, no XIII Fórum de Lisboa. Segundo Dino, quando as
emendas impositivas nasceram, o país passou a ter dificuldades de governabilidade
com vários presidentes da República de diferentes partidos. Dino afirma que o
STF não quer resolver a questão sozinho, mas o país não pode enfrentar impasses
atrás de impasses por causa dessas emendas.
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