quarta-feira, 7 de maio de 2025

A sociedade sem classes: o caso da experiência tupi – Ivan Alves Filho*

Ao analisar a desagregação da sociedade tupi, no nosso litoral, no decorrer do século XVI, vali-me de uma leitura do mito da Terra Sem Males, o qual demonstrava que havia um conflito de interesses entre os dois setores que mais gozavam de prestígio no interior das tribos, isto é, os guerreiros e os sacerdotes. Os primeiros tendiam a reforçar o poder central, rechaçado pelos últimos. 

Na verdade, esse conflito revelava que havia uma cobiça em marcha e que ela partia de um setor minoritário dos tupi, uma vez que a tribo já conseguira gerar um excedente considerável, e sobretudo estocar os seus alimentos. 

Eis o que abria a via, objetivamente, para a sociedade dividida em classes, com o afastamento de determinadas castas da atividade produtiva; sobretudo aquelas que gozavam de maior prestígio, como os sacerdotes e os militares, isto é, os donos da alma e do corpo, da paz e da guerra. Conforme escrevi em um livro meu, A saída pela Democracia, três antropólogos elaboraram um levantamento com 425 tribos ao redor do mundo e chegaram à conclusão que nenhuma dessas tribos praticavam a agricultura e a pecuária. Há uma relação inequívoca entre desenvolvimento das forças produtivas e dominação de classes. 

Hoje, pode estar ocorrendo justamente o contrário: o desenvolvimento das forças produtivas possibilita – pelo afastamento da ação exercida pelo homem sobre o processo diretamente produtivo – a extinção das classes e, na sequência, da exploração do homem pelo homem. São as voltas que a História promove. Para que isso ocorra, naturalmente, é preciso uma intervenção política, uma vez que as forças produtivas não caminham sozinhas.

*Ivan Alves Filho é historiador

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