quarta-feira, 7 de maio de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Analfabetismo funcional persistente é vexame nacional

Folha de S. Paulo

Estudo mostra desempenho pífio até entre formados no ensino médio; é preciso valorizar os modelos integral e técnico

É vexatório que quase um terço dos brasileiros entre 15 e 64 anos viva no mundo das letras e dos números praticamente no escuro.

O índice de 29% de analfabetos funcionais nesse estrato em 2024 reflete a ineficiência histórica das três esferas de governo na gestão da educação, que impacta a qualidade de vida dos indivíduos e o desenvolvimento do país.

O Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf), calculado pela ONG Ação Educativa, mostra queda do início da série história, em 2001, quando marcou 39%, até a estagnação em 27% entre 2009 e 2015. Depois houve alta para 30% em 2018 e, agora, uma redução pífia de um ponto percentual.

A categoria engloba desde os que não conseguem ler palavras ou um número de telefone (analfabetismo absoluto), que representam 7% no indicador recente, até os 22% que leem e escrevem, mas não compreendem textos longos nem fazem contas maiores (analfabetismo rudimentar).

Grande parte (65%) dos analfabetos funcionais está na faixa etária entre 40 e 65 anos. Mas a taxa de 17% tanto no estrato de 15 a 29 anos como no de 30 e 39 anos é também alarmante.

O Inaf mostra como a inaptidão em língua portuguesa e matemática ocorre entre os brasileiros que passaram pela rede de ensino. Entre os que concluíram os anos finais do ensino fundamental, a porcentagem é de 43%; entre os formados no ensino médio, 17%. E é impressionante que 12% dos diplomados no ensino superior estejam nessa condição.

Os números revelam que a redução do indicador no começo do século foi impulsionada pela expansão do acesso à educação. As escolas, contudo, não conseguem alavancar a aprendizagem, que há anos apresenta níveis precários em avaliações nacionais e internacionais. Um dos resultados é o flagelo da evasão escolar.

Aqueles que abandonam os estudos ficam desemparados. Um em cada cinco municípios (1.092 dos 5.500) não oferta vagas em Educação de Jovens e Adultos (EJA). Em 2024, o país atingiu o menor número de matrículas no programa (2,4 milhões) desde o começo da série histórica do Censo Escolar, em 1996.

É preciso eliminar gargalos no EJA e ampliar a modalidade de ensino integral, que eleva a carga horária das disciplinas tradicionais, como português e matemática, e permite ao aluno escolher áreas do conhecimento com base em suas aptidões, como o ensino técnico —que, segundo o Datafolhadesperta interesse significativo entre os jovens.

Trata-se de estabelecer políticas contínuas e independentes de ideologias. Sem isso, o Brasil continuará com a produtividade congelada —entre 2010 e 2023, ela cresceu ínfimo 0,3%, segundo cálculo da FGV— e, por consequência, lento no combate a desigualdades, ainda mais considerando o acelerado processo de envelhecimento da população.

Acima de tudo, retirar quase um terço desse estrato social da escuridão é dever civilizatório.

A fragilidade do primeiro-ministro alemão

Folha de S. Paulo

Premiê sofre derrota histórica em votação inicial; mesmo confirmado em 2º turno, terá apoio incerto para agenda complexa

O conservador Friedrich Merz assumiu entre solavancos inesperados o posto de primeiro-ministro da Alemanha nesta terça (6), em ambiente de franca incerteza sobre a lealdade da coalizão parlamentar que sustentará seu governo.

O quadro seria, por si só, desafiador para qualquer chefe de governo. A agenda de Merz inclui reverter um quadro recessivo que já dura dois anos na maior potência econômica do continente, tornar seu país pilar da defesa da União Europeia e, não menos importante, afastar os riscos de ascensão da ultradireita.

Seu começo não foi nada bom. Vitorioso nas eleições parlamentares de fevereiro, o líder da União Democrática Cristã (CDU) passou à história como o primeiro postulante a chefe de governo derrotado em sua confirmação pelo Bundestag, o Parlamento federal, desde o pós-guerra.

O que seria um ato protocolar, com exigência de maioria simples em votação secreta, converteu-se em exibição da fragilidade da coalizão costurada pela CDU com a também conservadora CSU e o SPD, a centro-esquerda do agora ex-primeiro-ministro Olaf Sholz.

Seis parlamentares desta que será a base legislativa do governo Merz impediram sua imediata aclamação. Houve necessidade de um segundo turno, que o confirmou por 325 votos. Não obstante, dado o universo de 328 deputados da coalizão, três escapuliram do aval ao novo premiê.

Merz tomou posse diante do presidente da Alemanha, Frank-Walter Steinmeier, no mesmo dia. Nesta quarta (7), embarca para Paris e Varsóvia para discutir a guerra na Ucrânia e a defesa da União Europeia ante a Rússia, em tempos de improvável suporte dos Estados Unidos de Donald Trump.

O primeiro-ministro provou-se incansável na formatação da aliança do centro-democrático alemão, com considerável ajuda de Sholz. Consolidá-la e estendê-la, entretanto, será decisivo neste momento em que a Alternativa para a Alemanha (AfD), classificada oficialmente como legenda de extrema direita, dispõe da segunda maior bancada no Bundestag.

Sem surpresa, lideranças da AfD alardearam o mergulho do país em instabilidade política após as duas votações. Obviamente, não chega a tanto.

O premiê assumiu com o aval prévio do Bundestag à flexibilização do regime de austeridade fiscal. Seus passos seguintes serão o reforço dos gastos com defesa e a injeção de € 500 bilhões na recuperação da infraestrutura.

O que prevalece agora é a dúvida sobre o real apoio legislativo para que Merz seja capaz de levar adiante sua agenda complexa.

Analfabetismo funcional envergonha Brasil

O Globo

Em sete anos, país foi incapaz de demonstrar progresso no indicador que mede leitura e escrita básicas

O Brasil tem avançado na educação em ritmo muito aquém do razoável — e do necessário. Em 2001, quatro em dez brasileiros de 15 a 64 anos eram considerados analfabetos funcionais, condição em que o indivíduo tem pouca ou nenhuma capacidade de selecionar informações em textos médios e de lidar com operações matemáticas básicas. Passados 23 anos, três em dez ainda estavam nessa situação inaceitável, revela o Indicador de Analfabetismo Funcional (Inaf), coordenado pela organização Ação Educativa, pela consultoria Conhecimento Social e pela Fundação Itaú, em parceria com Fundação Roberto Marinho, Instituto Unibanco, Unesco e Unicef. Apenas 10% são considerados proficientes em leitura e escrita.

Um dado é particularmente preocupante: não houve melhora desde 2018. Em tempos de inteligência artificial, cerca de 78% têm desempenho baixo ou médio em atividades digitais. Para ter uma ideia de quão desesperadora é a situação do nosso sistema educacional, um em cada dez brasileiros com diploma universitário (12%) é considerado analfabeto funcional.

A pesquisa não se baseia em testes de conteúdo, mas mede o uso de leitura, escrita e matemática. Feita por amostra, é resultado de mais de 2 mil entrevistas presenciais em zonas rurais e urbanas de todas as regiões, com margem de erro de 2,2 pontos percentuais. Separa a população em cinco categorias: analfabetos, aqueles com conhecimento rudimentar, elementar, intermediário ou proficiente. Analfabetos funcionais são os classificados como analfabetos ou com conhecimentos rudimentares. Os de nível intermediário ou proficiente formam o grupo com alfabetização consolidada.

O levantamento expõe desníveis geracionais e regionais. Na faixa etária dos 15 aos 24 anos, os analfabetos funcionais são 16%, e os que compõem o grupo de alfabetização consolidada 43%. Dos 50 aos 64 anos, a situação se inverte: as proporções são 51% e 20%. Tais números revelam a necessidade de programas educacionais para quem saiu da escola. Em todo o país, cerca de 68 milhões com 18 anos ou mais não concluíram a educação básica.

As iniciativas do Ministério da Educação (MEC) para ampliar e melhorar a oferta de cursos voltados à educação de adultos têm sido incapazes de mudar o quadro. É preciso engajar empresas, estados e municípios, considerando o contexto de vida da população-alvo. O Nordeste, com o maior percentual de analfabetos funcionais, deve receber atenção especial. Quatro em dez nordestinos estão nessa categoria. A região também tem a menor parcela de alfabetizados consolidados (27%).

O desempenho melhor dos mais jovens é consequência da progressiva inclusão educacional desde o início do século. Embora acesso, permanência e qualidade do ensino tenham melhorado, há muito mais por fazer. Alguns estados apresentam desempenho vexatório. Amapá, Bahia, Maranhão e Rio Grande do Norte conseguiram a façanha de ficar entre os cinco piores colocados nas três categorias do ranking brasileiro que mede qualidade do ensino. Estão nos últimos lugares do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) nos anos iniciais (primeiro ao quinto ano), nos anos finais (do sexto ao nono ano) e no ensino médio. É preciso muita negligência e muito descaso para obter tal desempenho.

Autoridade Climática continua no papel, apesar da urgência ambiental

O Globo

Promessa da campanha de Lula, agência dedicada ao aquecimento global motiva embate no governo

Anunciada na campanha eleitoral, a Autoridade Climática ainda não passa de intenção, mesmo transcorrida mais da metade do governo Luiz Inácio Lula da Silva, revelou reportagem do GLOBO. Apenas em setembro do ano passado foi concluída a minuta da proposta de sua criação, sem que haja previsão de quando ocorrerá. Não é certo sequer se existirá até novembro, a tempo da Conferência Mundial do Clima da ONU em Belém, a COP30.

É indiscutível a necessidade dessa nova estrutura no governo federal. A transição para uma economia de baixo carbono e a frequência com que se sucedem eventos climáticos extremos requerem respostas rápidas e eficazes, tanto nas medidas preventivas quanto no socorro aos atingidos. A Autoridade Climática vai contra a lógica da burocracia, organizada em feudos estanques que não se comunicam. Seu objetivo é integrar diversas áreas do governo em busca da agilidade necessária para alcançar um objetivo comum.

Por isso a melhor solução é vinculá-la à Presidência da República, de modo que seu titular tenha autoridade e poder para mobilizar os recursos necessários a desempenhar suas tarefas, sobretudo diante das emergências ambientais, que inexoravelmente se tornarão mais frequentes e intensas.

No governo, porém, a criação da Autoridade Climática ainda suscita divergências entre a Casa Civil, de Rui Costa, que coordena o projeto, e o Ministério do Meio Ambiente, de Marina Silva. Marina é contra ela ser subordinada à Casa Civil ou à Presidência. Costa se opõe a ela ficar no Meio Ambiente, como anunciado, para que não seja considerada segundo escalão do governo. Ora, trata-se de necessidade premente, que não pode ficar sujeita a disputas de poder entre ministros.

Marina costuma citar como modelo a Agência Internacional de Energia Atômica, entidade vinculada à ONU que regula o uso da energia nuclear no planeta. A diferença é que a agência de cooperação científica é um organismo multilateral que trata com Estados, e não com ministérios de um mesmo governo. Obviamente, dentro de uma mesma administração deveria ser muito mais fácil trabalhar em conjunto. Costa cita como exemplo o cargo de “enviado especial para o clima”, criado nos Estados Unidos durante o governo Joe Biden e ocupado pelo democrata John Kerry. Embora, nas palavras de Costa, ele tivesse “caráter mais diplomático”, também atuava junto ao próprio governo. O debate sobre o modelo prossegue sem que se vislumbre uma conclusão. Em entrevista na segunda-feira, Marina afirmou que “estamos fazendo a finalização”. Mas não deu prazo.

Lula já deveria ter intervindo para mediar a disputa. Não é aceitável que a criação da Autoridade Climática, necessária para reunir esforços de diversos ministérios de forma coordenada e essencial para mitigar os efeitos do aquecimento global, ainda não tenha sido concretizada. Que não seja preciso ocorrer outra catástrofe para a promessa ser cumprida.

País não consegue reduzir mais o analfabetismo funcional

Valor Econômico

A situação da educação e do preparo mínimo para o ingresso na vida laboral é crítica

Educação e produtividade da economia andam juntas, e a falta de avanços maiores em uma explica a estagnação na outra. Desde 2018 não há redução no número de analfabetos funcionais no Brasil - os que mal compreendem um texto curto e têm dificuldades em resolver operações aritméticas simples, como soma e multiplicação. Após o número cair de 39% em 2001 para 27% em 2009, houve interrupção da queda, e depois uma alta apenas marginal, para 29%, em 2024, de acordo com os números do Indicador Nacional de Alfabetismo Funcional (Inef), com base em levantamento coordenado pela organização Ação Educativa e pela consultoria Conhecimento Social, em correalização com a Fundação Itaú e parceria com a Fundação Roberto Marinho, o Instituto Unibanco, a Unesco e o Unicef.

A ausência de progressos é um péssimo sinal, realçado pela revolução recém-iniciada da Inteligência Artificial, que dará maiores frutos e acentuará a dianteira tecnológica dos países em que o grau de instrução for maior. O ambiente brasileiro, apesar da universalização do ensino, não é favorável. O único consolo é que o número de analfabetos funcionais já foi maior e caiu de geração em geração. Mais da metade (51%) dos trabalhadores entre 50 e 64 anos se enquadram nesta categoria. O percentual recua para 34% na faixa entre 40 e 49 anos, e para 22% entre 30 e 39 anos.

A situação da educação e do preparo mínimo para o ingresso na vida laboral é crítica. O levantamento apontou que o alfabetismo elementar, no qual há capacidade (apesar de que com dificuldade) para interpretar textos médios e realizar operações básicas na matemática é de 36%. A soma dos que estão despreparados para empregos que exijam mais do que trabalho manual e daqueles que conseguem de alguma forma estar à altura de funções não complexas atinge 65%, ou dois terços da população apta para o trabalho.

O maior número de jovens que passaram a ter acesso ao ensino médio não resultou em melhoria de seu grau de alfabetização. O número de analfabetos funcionais entre os jovens de 15 a 24 anos era de 14% em 2018 e subiu para 16% em 2024. Os resultados dos exames do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) reprovam a educação pública oferecida. Na edição de 2023, 70% dos estudantes do terceiro ano do ensino médio da rede pública não tinham aprendizagem adequada em leitura, e 95% mostraram conhecimentos inferiores aos esperados em matemática. Os resultados das provas de avaliação internacional, como o Pisa, mostram o Brasil nas piores colocações em interpretação de textos, matemática e ciências, com melhorias pequenas e eventuais.

A baixa qualificação em ciências exatas e matemática, na contramão do que a evolução tecnológica está exigindo, se reflete na estrutura profissional do país. No vestibular mais concorrido do país, a Fuvest, com 107 mil candidatos em 2024, a exceção são Medicina e Ciências Biomédicas; os cursos de engenharia, por exemplo, não estão sequer entre os dez mais procurados. É simplesmente impossível ao país obter avanços tecnológicos, que se desdobrem em aumento de produtividade da economia, sem engenharia, matemática, física, química e computação.

Como o progresso econômico depende a longo prazo e fundamentalmente da capacidade de produzir mais e melhores bens e serviços ao menor custo possível, há muita coisa fora da ordem no sistema educacional brasileiro. A esmagadora predileção pelas ciências humanas, em especial o Direito, com a explosão de cursos de qualidade precária ou baixa, resulta na inadequação profissional retratada em pesquisas recentes.

Um contingente expressivo de pessoas com curso superior exerce profissões que exigem menor qualificação do que supostamente o diploma lhe atribui. Estudo feito pela Geofusion em 2024 revelou que de cada 10 alunos formados nos cinco cursos que somam mais de um quarto dos universitários do país (pedagogia, direito, administração, enfermagem, contabilidade), apenas um consegue ter um emprego à altura de sua formação (O Globo, 02/06/2024).

O desarranjo educacional, em que um dos ápices é o abandono do curso de educação básica por 500 mil jovens por ano, segundo pesquisa da Fundação Roberto Marinho e do Insper, implica que há desperdício por todos os lados. Só a desistência desses jovens traz perda estimada de 3,5% do PIB. Há dinheiro perdido na formação de pessoas que não serão absorvidas no mercado, no abandono escolar depois que os alunos já percorreram a maior parte do ensino fundamental e nos gastos das empresas para formar os trabalhadores de que necessitam e não encontram no mercado.

O país tem dados passos inseguros na direção correta, que nem sempre tem continuidade ou recursos adequados disponíveis. Melhorar e tornar contínua a formação de professores, dar-lhes salários adequados, implantar estímulos para reduzir a evasão escolar e adotar uma educação profissional de qualidade são medidas da agenda educacional presente. Mas torná-las mais que desejos tem sido difícil.

Brasil tem analfabetos demais

O Estado de S. Paulo

Quase um terço da população do País é analfabeta funcional, e só 23% têm altas habilidades digitais. Combinados, esses indicadores escancaram a tragédia brasileira

O porcentual de brasileiros de 15 a 64 anos na condição de analfabetos funcionais, termo aplicado a quem mesmo sabendo ler e escrever não consegue interpretar textos ou fazer contas mais complexas, segue em 29%, mesmo patamar de 2018, de acordo com o Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf), coordenado pela Ação Educativa e pela consultoria Conhecimento Social, em parceria com Fundação Itaú, Fundação Roberto Marinho, Instituto Unibanco, Unesco e Unicef.

Realizado entre dezembro de 2024 e fevereiro de 2025, o levantamento mostra ainda que entre os jovens de 15 a 29 anos o analfabetismo funcional piorou: era 14% em 2018 e subiu para 16% na leitura mais recente.

A pandemia de covid-19 aparece como uma das razões para a piora no indicador de analfabetismo funcional entre os jovens, já que, no necessário período de isolamento social, muitas pessoas deixaram de frequentar as escolas ou tiveram seu processo de aprendizagem comprometido.

É inegável que a pandemia fez com que várias conquistas humanas andassem para trás em escala global, como demonstram indicadores de crescimento econômico e de endividamento das nações. Mas, quando se olha a série histórica do Inaf mais atentamente, chama atenção o fato de o porcentual de analfabetos funcionais no País já vir estagnado desde muitos antes da pandemia.

Em 2001, o porcentual de brasileiros analfabetos funcionais era de 39%. O índice foi recuando lentamente até a marca de 27% em 2009, que se repetiu nos levantamentos de 2011 e 2015. Em 2018, subiu para os 29% que se repetiram na investigação mais recente.

Ou seja, mesmo antes de a pandemia prejudicar a educação mundo afora, o que ainda não foi superado em vários aspectos, a educação do brasileiro já era um problema.

Não é que não tenha havido avanços nos últimos anos, como demonstram a quase universalização do acesso ao ensino fundamental, bem como a expansão dos ensinos médio e superior. A qualidade, contudo, segue sendo um problema. Mais do que estar na escola, é preciso que esse acesso ocorra com qualidade. É inaceitável que praticamente um terço da população brasileira não tenha condições de interpretar um texto ou de efetuar contas mais complexas, inabilidades que comprometem o cotidiano dos analfabetos funcionais, bem como seu potencial de empregabilidade.

“Os indicadores apontam que estamos diante de um momento gravíssimo. É alarmante saber que apenas 10% da população brasileira seja considerada proficiente em leitura, escrita e matemática. Como enfrentar a desigualdade e ampliar a produtividade com uma população nessas condições?”, questiona o presidente da Fundação Itaú, Eduardo Saron.

Pois é esse o desafio que o Brasil tem diante de si, e que deveria mobilizar políticos, independentemente de matizes ideológicos, e gestores públicos, uma vez que a economia global é cada vez mais digital e demanda que os cidadãos não apenas dominem o básico do conhecimento tido como tradicional, como também sejam capazes de navegar pelo mundo digital e interagir com ferramentas de inteligência artificial de modo minimamente satisfatório.

Não bastasse o número de analfabetos funcionais ser alarmante, o lnaf também identificou que apenas um em cada quatro brasileiros entre 15 e 64 anos, ou 23% da população, tem nível considerado elevado de habilidade digital. Foi a primeira vez que o levantamento mediu o nível de alfabetização no contexto digital.

Atividades que parecem triviais para alguns, como fazer uma compra online, inscrever-se para um evento por meio de canais digitais ou procurar um filme em uma plataforma de streaming são desafiadoras para uma infinidade de brasileiros.

Além disso, fraudes como a do INSS expõem como é urgente ampliar o chamado letramento digital da população, já que a comunicação com prestadores de serviços e bancos, por exemplo, se dá cada vez mais por canais virtuais.

Faces da mesma moeda, o analfabetismo funcional e a falta de habilidades digitais dos brasileiros exigem que o País promova, ao mesmo tempo, educação básica de qualidade e aprimoramento daqueles que, mesmo alfabetizados em um mundo analógico, vivem às escuras no presente, que já é digital.

A desastrosa gestão da crise do INSS

O Estado de S. Paulo

Lula deveria ter demitido toda a cúpula do Ministério da Previdência, ordenado a devolução imediata do dinheiro e determinado uma investigação implacável. Não fez nada disso

Duas semanas após a rumorosa Operação Sem Desconto, o governo ainda parece atordoado e incapaz de reagir à altura do escândalo. À letargia em demitir Carlos Lupi do Ministério da Previdência, mesmo diante do fato óbvio de que a permanência dele era insustentável desde o primeiro dia da crise, soma-se a incompreensível escolha de seu braço direito, o então secretário-executivo Wolney Queiroz, para chefiar a pasta neste momento.

Queiroz, quando era deputado federal por Pernambuco, foi coautor de uma proposta que adiou a necessidade de revalidar anualmente os débitos em folha de pagamento em benefícios do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Como revelou o Estadão, isso se deu por meio de uma emenda a uma medida provisória de 2021, que usou a pandemia de covid-19 como pretexto para estender o prazo até o fim do ano seguinte. Depois, em 2022, outra medida provisória extinguiu qualquer exigência de controle nos descontos.

Culpar apenas Lupi ou Queiroz pelo problema seria ingenuidade. O fato de que todas essas propostas foram aprovadas sem muita dificuldade pelo Congresso nas últimas legislaturas evidencia a existência de um acordo entre os partidos para facilitar a tramitação. O esquema não teria ganhado escala nem durado tantos anos se muitas autoridades e parlamentares não tivessem fechado os olhos e tapado os ouvidos enquanto entidades e associações arrecadavam bilhões à custa de aposentados e pensionistas.

Diante de tudo o que já veio à tona, é seguro supor, como diz a sabedoria popular, que há mais caroço nesse angu. Ainda em junho de 2023, Lupi foi alertado sobre o aumento das denúncias de beneficiários sobre débitos sem autorização em reunião do Conselho Nacional da Previdência Social. Como presidente do colegiado, o ex-ministro alegou que o tema não estava na pauta de discussões e, em vez de convocar uma reunião extraordinária para abordá-lo de imediato, manobrou para que o assunto não fosse debatido até abril do ano seguinte.

O detalhe é que Queiroz também participava das reuniões desse mesmo conselho e foi, no mínimo, tão omisso quanto Lupi. E é improvável que alguém no governo não soubesse disso antes de confirmá-lo no cargo, o que só mostra como Lula da Silva continua a reboque dos acontecimentos. Ao agir como um avestruz, o Executivo federal parece não entender que traz a crise para dentro do Palácio do Planalto, enquanto a oposição explora o caso no Congresso.

Mesmo que não tenha compactuado com o esquema de descontos fraudulentos, toda a cúpula do Ministério da Previdência já deveria ter sido demitida no dia 23 de abril, quando a Polícia Federal e a Controladoria-Geral da União (CGU) deflagraram a operação. Era a única maneira de o governo demonstrar que é mesmo implacável com a corrupção, sobretudo quando se trata de roubo de dinheiro dos aposentados, muitos em situação de vulnerabilidade.

Em vez disso, o Executivo convocou uma entrevista coletiva na qual um verborrágico Lupi defendeu o ex-presidente do INSS Alessandro Stefanutto, seu apadrinhado, mesmo diante das evidências de rapinagem. Depois, em vez de determinar que o então ministro se recolhesse, deixou-o livre para expor a si mesmo e ao governo, que ainda deve muitas respostas aos aposentados e pensionistas.

Não basta suspender os descontos nem dizer que o dinheiro será devolvido. É preciso explicar quando e se o pagamento virá em uma ou mais parcelas, até mesmo para evitar que estelionatários tentem arrancar mais recursos de um público naturalmente exposto a golpes por meio de anúncios falsos nas redes sociais.

Sob o ponto de vista fiscal, também é preciso saber se as entidades devolverão os bilhões que arrecadaram nos últimos anos ou se o rombo será assumido pela União – o que é mais provável, tendo em vista as boas relações que o governo lulopetista mantém com as entidades sindicais.

Feitas as contas, fica claro que Lula da Silva só se preocupa com os companheiros sindicalistas e com a manutenção do apoio do PDT ao governo. Já em relação aos aposentados lesados, Lula gasta energia na exata medida de suas necessidades eleitorais, e nem uma gota de suor a mais.

O legado do ‘Oráculo de Omaha’

O Estado de S. Paulo

Warren Buffett, que anunciou aposentadoria, acumulou fortuna apostando no longo prazo

Aos 94 anos, Warren Buffett, um dos homens mais ricos do mundo, anunciou que se aposentará no final deste ano, quando deixará o cargo de CEO da Berkshire Hathaway, a holding de investimentos em ações que ele consolidou ao longo de décadas.

Filho de um corretor de ações que também serviu por quatro mandatos como representante de Nebraska, o Estado natal dos Buffett, no Congresso dos Estados Unidos, Warren demonstrou desde a adolescência interesse por ganhar dinheiro.

Embora não precisasse fazê-lo por necessidade econômica, o jovem Warren comprava e revendia porta a porta garrafas de refrigerante – as ações da Coca-Cola são um dos investimentos mais longevos de Warren.

Mais tarde, já na capital norte-americana, virou entregador do jornal The Washington Post, o que além de ajudá-lo a ganhar dinheiro também despertou seu interesse pelo ramo da comunicação – Warren foi acionista do The Washington Post por 40 anos.

O apreço pela informação e o estudo das empresas nas quais investe são marcas distintas de Warren, também conhecido como o “Oráculo de Omaha”, alcunha que recebeu da comunidade financeira, sempre atenta às decisões de investimento do homem que ao longo da vida acumulou patrimônio pessoal de mais de US$ 100 bilhões.

Em um mundo em que muitas fortunas espetaculares viraram pó, e no qual oportunidades de investimentos com retornos financeiros estratosféricos não param de surgir, a estratégia de investimento de Warren Buffett pode soar demasiadamente simples: adquirir e manter ações de companhias com perfil sólido, mas negociadas abaixo do valor potencial. Patrimônios se constroem no longo prazo.

A carteira de investimentos da Berkshire Hathaway explicita bem a doutrina do “Oráculo de Omaha”. Composta por poucas companhias, é um misto de ações da velha economia, como as do setor de petróleo e consumo, mas que nos últimos anos passou a incorporar papéis de segmentos como o de tecnologia.

Óbvio que, em uma trajetória tão longa, o “Oráculo de Omaha” também cometeu erros.

Os acertos, contudo, entre os quais se destacam a decisão, em 2016, de adquirir ações da Apple, e o comedimento, tanto nos comentários políticos como na maneira de conduzir a vida, superam os equívocos por ampla margem. Além do estilo simples e nada ostentador, Warren também é conhecido pela prática da filantropia.

Não deixa de ser simbólico que o anúncio de aposentadoria de Warren, um dos expoentes do capitalismo norte-americano, ocorra em momento em que as políticas comerciais de Donald Trump ameaçam tão profundamente a fortuna das empresas e dos cidadãos daquele país.

Conhecido também pela generosidade e pela defesa da prosperidade global, Warren defendeu, sem citar o atual presidente, que o comércio não pode ser um ato de guerra.

Trata-se de um recado importante, ainda mais quando vindo de alguém que sabe que construir fortunas exige tempo e dedicação, mas que a destruição de valor pode ocorrer do dia para a noite.

Warren se aposenta, mas o legado do “Oráculo de Omaha” é digno de se tornar referência duradoura.

Reposicionamento da Petrobras é acertado

Correio Braziliense

É a partir da estatal que o Brasil pode ampliar ainda mais a sua independência energética e financiar, inclusive, uma matriz ainda mais sustentável, focada em energia e combustíveis limpos

O noticiário sobre a Petrobras muitas vezes fica concentrado apenas na cotação dos combustíveis. Ontem, a estatal iniciou mais um corte no preço do diesel para as distribuidoras (de R$ 0,16), que deve representar alguma queda no valor apresentado na bomba. Uma notícia positiva para frear parte da inflação dos alimentos, diante de uma logística nacional extremamente dependente do transporte terrestre. 

No entanto, pouco se discute sobre o reposicionamento da Petrobras nos últimos anos. Contra a corrente liberal de outrora, a estatal passou por uma mudança de política durante o governo Lula, a partir de uma agenda estatizante para retomada de ativos cedidos à iniciativa privada em gestões anteriores. 

Como maior empresa brasileira, a Petrobras tem a obrigação de se posicionar muito além de uma perfuradora de poços, ainda que essa atividade seja primordial para o setor petroleiro da companhia. É a partir da estatal que o Brasil pode ampliar a sua independência energética e financiar, inclusive, uma matriz ainda mais sustentável, focada em energia e combustíveis limpos — uma migração que requer investimentos altíssimos em ciência e tecnologia. 

O comunicado ao mercado financeiro feito pela companhia no último dia 23 comprova o acertado reposicionamento. O conselho de administração da Petrobras obteve acordo para retomar duas fábricas de fertilizantes, em Camaçari (BA) e Laranjeiras (SE), com abertura de uma licitação para operar nas duas plantas. O negócio envolve a Unigel, uma multinacional do setor petroquímico, abrindo mão do arrendamento das unidades, que duraria até 2030. 

As duas fábricas foram arrendadas pela estatal em 2019, mas estão paradas desde 2023 por causa de dificuldades financeiras. Trata-se dos chamados fertilizantes nitrogenados, muito usados pelo agronegócio. Um produto comum é a ureia, por exemplo. Para a produção, a fábrica precisa do gás natural como matéria-prima, um dos ramos mais consolidados da estatal. Ou seja, são empreendimentos de baixo risco e com enormes ganhos para o Brasil.

Outras iniciativas recentes vão na mesma linha. Na semana passada, a Petrobras lançou uma licitação para a contratação das empresas que vão realizar as obras de construção de unidades operacionais no Polo GasLub, em Itaboraí (RJ). O objetivo é ampliar em 12 mil barris por dia (bpd) a fabricação de óleos lubrificantes; 75 mil bpd de diesel S-10; e 20 mil bpd de querosene de aviação com baixo teor de enxofre. A estimativa é de que sejam gerados até 10 mil empregos diretos e indiretos. As obras estavam paradas desde 2015.

Em movimento semelhante, há um ano, a Petrobras retomou a contratação de embarcações próprias, a partir da compra de quatro navios da classe Handy. A ideia é ampliar a indústria naval brasileira para atender demandas de transporte de produtos por via marítima. A nova agenda da empresa reposiciona a Petrobras ao lado do povo brasileiro, como maior patrimônio do país. 

É preciso observar que algumas questões exigem muito debate, como a perfuração na foz do Amazonas, na chamada Margem Equatorial. Por se tratar de um empreendimento que pode causar impactos ambientais, que divide o Ibama e a própria Petrobras, a questão merece todo cuidado possível. Sobretudo em um ano no qual o Brasil recebe a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30), em Belém. 

Bolsonaristas voltam a fazer ato em Brasília

O Povo

Anistiar quem tentou dar um golpe de Estado seria provocar uma ferida profunda na própria democracia

Mais uma manifestação pela anistia aos participantes do ato golpista de 8 de janeiro de 2023 será realizada nesta quarta-feira, desta vez em Brasília. O ato acontece na sequência de dois outros eventos públicos com o mesmo objetivo, ocorridos no Rio de Janeiro e em São Paulo. Ambos os encontros tiveram participação abaixo da previsão dos organizadores.

O protesto de hoje é cercado de expectativas, pois é a primeira atividade de massas convocada por bolsonaristas, em Brasília, após o violento atentado que depredou a sede dos Três Poderes.

Em consequência dos crimes cometidos, o Supremo Tribunal Federal (STF) já condenou 371 pessoas, responsabilizando outras 527, que admitiram crimes graves, fazendo acordo com o Ministério Público Federal.

Em uma rede social, o ex-presidente Jair Bolsonaro anotou que será realizada uma "caminhada pacífica em direção ao Congresso Nacional", e que ele estará presente, se estiver em boas condições de saúde, após a cirurgia a que se submeteu.

Considere-se um avanço importante o fato de Bolsonaro preconizar uma manifestação sem violência, diferente do 8 de janeiro, resultado de uma tentativa de golpe de Estado, urdida dentro do Palácio do Planalto, quando ele era presidente.

Um plano que previa inclusive o assassinato do então candidato eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, seu vice Geraldo Alckmin, e de um integrante do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes.

O ex-presidente e seus aliados vêm agindo em várias frentes na tentativa de aprovar um projeto de anistia para beneficiar os participantes do 8 de janeiro, sob a alegação de que muitos deles foram envolvidos supostamente sem entender a gravidade dos atos que praticavam.

No entanto, o objetivo final dos promotores dos eventos pela anistia é beneficiar Bolsonaro, que pretende escapar da inelegibilidade determinada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação.

O ex-presidente pretende encontrar uma saída que possibilite a sua inscrição como candidato presidencial em 2026, atualmente impossível, pois sua inelegibilidade segue até 2030. Afora outros processos contra ele que tramitam no STF.

Com essa "caminhada" a oposição tem pelo menos dois objetivos: mostrar que o bolsonarismo tem poder de mobilização, e pressionar os parlamentares a aprovarem o projeto de anistia, tentando convencê-los que a proposta tem apoio popular, apesar de as pesquisas mostrarem o contrário.

Em um regime democrático, as manifestações pacíficas são asseguradas a todos os cidadãos e grupos políticos. No entanto, também é livre o direito de discordar de suas reivindicações. O que vale para este caso: anistiar quem tentou dar um golpe de Estado seria provocar uma ferida profunda na própria democracia.

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