Restrição a dados sobre gastos viola Constituição
O Globo
Vedar acesso a documentos contradiz promessa
de Lula e contribui para alimentar suspeitas
É um desafio inaceitável ao bom senso, às
boas práticas da administração pública e à Constituição a restrição imposta
pelo Ministério da Gestão e Inovação (MGI) a documentos relativos a acordos com
estados, municípios e organizações não governamentais. O MGI afirma ter
retirado a documentação da plataforma sobre gastos públicos em respeito a
parecer da Advocacia-Geral da União (AGU)
que alega necessidade de preservar informações privadas, como determina a Lei
Geral de Proteção de Dados.
É uma alegação risível. A Constituição determina expressamente a obrigação de garantir publicidade a todos os gastos do governo. Deve ficar explícito o destino de cada centavo: quem recebeu, quanto recebeu e por que recebeu. Para preservar os dados pessoais em respeito à privacidade de certos destinatários das verbas, basta omiti-los ou ocultá-los na documentação. Barrar completamente o acesso aos documentos é uma medida drástica que viola a transparência — uma das principais promessas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “Sem transparência não há democracia”, afirmou Lula cinco meses depois de sua posse. “O acesso à informação, como direito fundamental previsto em nossa Constituição, precisa estar cada vez mais presente na vida do cidadão e na cultura de cada agente público.”
Infelizmente, as palavras de Lula não têm
correspondido à prática de seu governo. Na campanha, ele afirmou que acabaria
com sigilos de cem anos impostos por Jair Bolsonaro. No poder, impôs sigilo a
informações da maior relevância para a compreensão das relações entre o público
e o privado em sua gestão. É o caso do rol de visitantes à primeira-dama Janja Lula
da Silva no Palácio da Alvorada; dos gastos do Planalto com o helicóptero
presidencial e com alimentação no Alvorada; das visitas dos filhos de Lula ao
Planalto; da declaração prestada pelo ministro Alexandre Silveira sobre
possíveis conflitos de interesse antes de assumir o cargo; e, inicialmente, até
da lista de convidados para sua posse e das imagens das câmeras de segurança do
Planalto da invasão golpista no 8 de Janeiro (ambas só foram liberadas depois
de pressão ou decisões da Justiça).
O veto à documentação sobre gastos estimados
em R$ 600 bilhões foi decido pelo MGI justamente num momento em que fica
explícita a destinação suspeita de verbas de ministérios a ONGs vinculadas a
petistas. Pior ainda, ele se estende aos recursos transferidos por meio de
emendas parlamentares — que continuam deixando a desejar em termos de
transparência, por isso são alvo de ações no Supremo Tribunal Federal (STF).
Foram ocultados os documentos de prestação de contas dos municípios que
receberam recursos por meio das emendas do relator, conhecidas como “orçamento
secreto” e julgadas inconstitucionais pelo STF em razão da falta de
transparência em 2022.
É imperativo que o Supremo ordene a abertura
das informações ocultadas. A medida do MGI viola as normas internacionais de
transparência necessárias para a saúde de qualquer democracia, dificulta o
controle dos gastos públicos e é incompatível com as promessas do próprio Lula.
É perfeitamente possível assegurar o sigilo adequado a dados pessoais quando
justificável. Qualquer informação a mais que seja ocultada apenas contribui
para aumentar as suspeitas que se acumulam sobre os agentes públicos.
Acordo sobre Favela do Moinho pode se tornar
exemplo de ação integrada
O Globo
Gestões Lula e Tarcísio acertam ao priorizar
parceria técnica em vez de insistir em confronto político
Foi tranquilizador o acordo firmado entre os
governos federal e paulista para realocar os moradores da Favela do Moinho, uma
das últimas remanescentes no centro de São Paulo. Até
agora, o debate em torno da requalificação da favela se tornara um lamentável
exemplo de politização. Enquanto as gestões do governador Tarcísio
de Freitas (Republicanos) e do presidente Luiz Inácio Lula da
Silva (PT) trocavam acusações, o projeto de realocação da população e
reurbanização da região era adiado ou sabotado.
O estado alegava “má vontade” federal,
enquanto o Ministério da Gestão exigia garantias adicionais para liberar a
cessão do terreno, propriedade da União. No último capítulo, o governo federal
chegou a cancelar a transferência da área, alegando violência das forças de
segurança contra os moradores e demolição prematura das casas. Felizmente, no
novo acordo prevaleceu uma visão técnica.
Pelos termos acertados com a contribuição do
Ministério das Cidades, o auxílio-aluguel aos moradores subirá de R$ 800 para
R$ 1.200 mensais. O modelo de reassentamento será inspirado no programa Minha
Casa, Minha Vida adotado recentemente no Rio Grande do Sul. As famílias poderão
adquirir imóveis por meio de “compra assistida”, em vez de apenas receber uma
carta de crédito. O custo dos novos imóveis — cerca de R$ 250 mil cada — será
compartilhado entre União (R$ 180 mil) e estado (R$ 70 mil), sem gerar dívidas
posteriores às famílias beneficiadas.
O ponto crucial foi a concordância do governo
federal em ceder ao estado o terreno, desde que não haja emprego da força
policial para retirar os moradores, uma condicionante sensata. “Qualquer tipo
de violência deixa esse acordo completamente inviabilizado”, diz o ministro das
Cidades, Jader Filho.
Ao todo, vivem no local 821 famílias em
situação precária, num ambiente inseguro, sujeito a incêndios frequentes e foco
de tráfico comandado pelo crime organizado. São condições inaceitáveis de
habitação. Por isso a adesão das famílias à mudança já era expressiva: de
acordo com o governo estadual, 719 das 821 concordavam com o plano, e quase 500
já tinham escolhido seus imóveis.
No lugar da favela, o projeto pretende criar
o Parque do Moinho e permitir a expansão das estações de trem próximas — tudo
aquilo de que a cidade mais precisa. A experiência recente mostra que programas
habitacionais funcionam quando levam em conta as necessidades da população,
oferecendo proximidade das áreas centrais e infraestrutura adequada.
A parceria entre União, estado e município mostra a importância de trabalhar em
conjunto para resolver questões urbanas complexas. Politizar decisões técnicas
só causa atraso e sofrimento às famílias envolvidas. O resultado alcançado na Favela
do Moinho poderá se tornar um modelo a seguir para outras regiões da cidade e
do país.
Brasil envelhece sem ter enriquecido nem se
educado
Folha de S. Paulo
Queda contínua no número de nascimentos
demanda mais reforma previdenciária, reforço do SUS e debate sobre imigração
O número de nascimentos no Brasil caiu
pelo quinto ano consecutivo em 2023. Foi o menor desde 2015, ano a partir
do qual há dados mais rigorosos, conforme as Estatísticas do Registro Civil
do IBGE,
divulgadas nesta sexta-feira (16).
A queda foi de 0,7% em relação a 2022. O
total de registros ficou 12% abaixo da média de 2015 a 2019, ano imediatamente
anterior ao do início da pandemia.
Trata-se de mais um dos indicadores que
contribuem para explicar a redução do crescimento da população —além de quedas
abruptas de natalidade e fecundidade, uma taxa de imigração irrelevante,
se não negativa.
Segundo projeções também do IBGE, a taxa de
expansão da população brasileira era de cerca de 1,3% ao ano no início deste
século. Ela baixou a 0,7% no início da década passada e, atualmente, está
próxima de 0,4%. O número de habitantes do Brasil deixaria de crescer em torno
de 2040.
É possível especular que um decênio de crise
econômica e o impacto da Covid-19 podem ter contribuído para uma baixa
adicional da propensão a ter filhos. No entanto a tendência vem de longe, a
rigor desde a urbanização rápida do país.
A ampliação da renda e da escolaridade
desacelerou ainda mais o aumento populacional. São processos observados em
quase qualquer parte do mundo.
A autodeterminação das mulheres quanto a
opções de vida e carreira deve ter tido peso relevante, se por mais não fosse
porque sustentam
o peso maior da geração e criação de filhos.
Para homens e mulheres que também trabalham
fora de casa, é difícil cuidar das crianças de modo adequado, dada a
precariedade do sistema de creches e de escolas em tempo dito integral. Sobem
os custos relativos de saúde e educação privadas.
São problemas de longo prazo de política
pública, que ora não ocupam o centro do debate. Sejam quais forem os motivos da
baixa da natalidade, seus efeitos até aqui já bastam para criar outras
preocupações.
O Brasil envelhece sem ter enriquecido ou ao
menos se educado de modo satisfatório; natalidade e fecundidade desaceleram em
ritmo de países avançados. O bônus demográfico está perto de acabar —trata-se
aqui do período em que é maior a proporção de pessoas em idade de trabalhar em
relação à de aposentados e crianças na sociedade.
A despesa com aposentados já cresce de modo
insustentável, e a demografia vai agravar esse problema e o gasto com cuidados
com os mais idosos.
Será preciso uma
reforma previdenciária mais profunda, mais atenção à saúde preventiva,
aperfeiçoamento e expansão do SUS, incrementar
condições sociais para a criação de crianças. Já é momento, ademais, de pensar
nas políticas de imigração.
Convirá ao Brasil atrair pessoas para ampliar
sua força de trabalho, em vez de, como hoje, perder mão de obra qualificada que
busca vida melhor em outros países.
A queda singular da inflação argentina
Folha de S. Paulo
Mesmo com risco de alta devido à mudança da
política cambial, índice de preços cai a 2,8% em abril e 47,3% em 12 meses
Nobel de Economia em
1971, Simon Kuznets disse que a Argentina era
um país singular: tinha tudo para ser desenvolvido, mas vivia sob a
instabilidade econômica. Se o país ainda não deixou para trás o diagnóstico, ao
menos mostra agora sua singularidade com uma queda surpreendente da inflação.
O
índice de preços ao consumidor em abril foi de 2,8%, enquanto o Banco
Central argentino e consultorias projetavam taxa acima de 3%, dada a mudança da
política cambial em meados do mês. O recuo em relação a março foi de 0,9 ponto
percentual.
O dado de abril puxou para baixo a inflação
nos últimos 12 meses de 55,9%, em março, para 47,3% e deu início à revisão de
estimativas de economistas para o ano —a agência Moody’s prevê 30%, a depender
das pressões cambiais e dos preços dos combustíveis.
De todo modo, o resultado deste 2025 tende a
ser promissor, quando se leva em conta o inegável impacto da duríssima política
de ajuste orçamentária levada a cabo por Javier Milei,
que levou a inflação de 211% em 2023, sob o regime de esquerda populista, para
118% no ano passado.
Mas é recomendável cautela. Há preocupação,
por exemplo, que exclui variações de preços sazonais e de itens regulados. Esse
indicador ficou em 3,2% em abril, acima da taxa oficial.
Note-se também que, em abril, o cenário mudou
substancialmente por meio do acordo de US$ 20 bilhões com o Fundo Monetário
Internacional (FMI),
que exigiu a correção da arcaica política de controle cambial do país —apesar
do risco de uma desvalorização do peso afetar a carestia.
Milei corretamente aquiesceu. A cotação
oficial passou
a flutuar numa banda de 1.100 a 1.400 pesos, com ajustes mensais de 1%. O
teto de US$ 200 para compra de dólares por pessoas físicas no mercado oficial,
vigente desde 2019, foi extinto, assim como restrições a importadores.
Logo após o anúncio das medidas, a
desvalorização do peso alcançou 8,4%. Desde então, porém, o câmbio oficial
se estabilizou na primeira metade da banda, com efeitos marginais sobre a
inflação. Mesmo com o fim do teto, os argentinos não correram ao dólar, como
fizeram diante de reformas cambiais no passado.
Por óbvio pesam dúvidas sobre a inflação nos próximos meses. Seja por fatores internos, como a reforma cambial ainda incompleta e a dificuldade para atrair investimentos, seja pelas incertezas globais, o governo Milei ainda terá de navegar entre a ousadia e a prudência para de fato estabilizar a economia argentina —este, sim, um feito que será singular.
O calvário das vítimas dos larápios do INSS
O Estado de S. Paulo
Aposentados e pensionistas carregam fardo de
ter de comprovar pilhagem de seus benefícios em fraude que escancara
descontrole de sucessivos governos e só reforça a necessidade de uma CPMI
Decorrido quase um mês da Operação Sem
Desconto, que desviou, por baixo, R$ 6 bilhões de aposentadorias e pensões
previdenciárias, a única certeza a emergir do escândalo até agora é que o
sistema do INSS é falho, impreciso e desprovido de mecanismos que evitem sua
burla. Já passa de 1 milhão o número de beneficiários que contestaram o
desconto de contribuições associativas e sindicais em folha de pagamento desde
quando o INSS abriu o canal de comunicação no aplicativo da autarquia.
Uma auditoria da Controladoria-Geral da União
(CGU), que deu azo à deflagração da operação, em parceria com a Polícia Federal
(PF), sugere que a ladroagem deve ter feito milhões de vítimas – afinal o INSS
emitiu 9,4 milhões de notificações. E são elas, as vítimas, que agora têm de
enfrentar um calvário em busca de ressarcimento por um prejuízo que muitas nem
sequer haviam identificado. De fato, o relatório divulgado pela CGU no dia em
que a ação policial foi deflagrada, no final de abril, apontava que a maioria
dos beneficiários desconhecia os descontos ou achava que eles eram
obrigatórios.
A CGU puxou o fio de fraudes que ocorriam a
conta-gotas, com débitos de pequenos valores em um volume extraordinário de
benefícios, numa ramificação tão abrangente que torna indecoroso o descontrole
do governo sobre a manipulação dos benefícios do INSS – e não apenas deste
governo, a bem da verdade. Como apontam as investigações, os descontos foram
iniciados em 2016, durante o governo Michel Temer, e ganharam escala em 2022,
na gestão Jair Bolsonaro, quando houve dispensa da necessidade de revalidação anual.
No primeiro dia de recebimento de
contestações, 41 entidades associativas foram citadas por aposentados e
pensionistas como responsáveis por descontos indevidos, bem mais que o total de
12 que vinham sendo investigadas pela PF e que tiveram pouco mais de R$ 2
bilhões bloqueados para ressarcir as vítimas. É pouco e, como já admitiu a
ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, recursos do erário poderão
vir a ser utilizados para reembolsar aposentados e pensionistas roubados sob as
barbas do poder público.
Ao menos até agora, o governo Lula da Silva
não deu mostras de que conseguirá arquitetar uma solução que atenda a todos os
lesados no menor tempo possível, como seria razoável para uma situação
indefensável como esta. Para boa parte das vítimas, fazer uma reclamação por
meio de um aplicativo digital é algo pouco amigável e até mesmo inacessível.
Ademais, a julgar pelo comportamento do
governo desde quando estourou o escândalo, preocupa a morosidade e os caminhos
tortuosos que podem ser adotados para corrigir o descalabro. Entre a
deflagração da operação e a demissão de Carlos Lupi do Ministério da
Previdência, passaram-se nove longos dias, apesar das evidências de que, no
mínimo, houve negligência por parte do agora ex-ministro.
Ao nomear como substituto Wolney Queiroz,
braço direito de Lupi, Lula trocou seis por meia dúzia. O novo ministro, por
óbvio, culpa o governo Bolsonaro pela proliferação de associações fraudulentas.
Providencialmente, Queiroz parece ter esquecido que ele próprio, como deputado,
em 2021, foi coautor da emenda que adiou a exigência de revalidação anual dos
descontos em folha.
Tudo isso só fortalece a necessidade de uma
Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) para apurar um esquema que
parece ter contado ora com a omissão, ora com a colaboração de muitas
autoridades no Executivo e no Congresso nos últimos anos.
O governo tenta evitar que a CPMI seja
instalada, mas, se isso não for possível, buscará colocar aliados em cargos
importantes do colegiado, como a presidência e a relatoria, para delimitar as
investigações, responsabilizar a gestão Bolsonaro pela origem do problema e, de
quebra, vender a falácia de que foi Lula quem acabou com o esquema.
Tão importante quanto descobrir como isso
começou é apurar como tudo continuou por tanto tempo. Mas o fundamental é
estabelecer controles rígidos no INSS para impedir que escândalos como este
jamais voltem a se repetir. Do contrário, será mais uma CPMI que acabará em
pizza.
A criatividade inesgotável dos cupins da
República
O Estado de S. Paulo
Nova manobra engendrada por parlamentares
desvirtua ‘emendas de bancada’ e agrava ainda mais processo de captura do
Orçamento pelo Congresso, à margem da devida responsabilização
Quando se trata da deformação do manejo do
Orçamento da União para atender aos interesses particulares dos parlamentares,
a criatividade do Congresso parece infinita. Além do longo rol de problemas que
envolveram a ampliação, imposição e diversificação das emendas nos últimos
anos, felizmente agora com regras mais rígidas a partir da pressão pública e da
atuação do Supremo Tribunal Federal (STF), o Estadão mostrou nos
últimos dias um outro tipo de ardil criado pelos congressistas: parte das
chamadas “emendas de bancada estadual”, originalmente destinadas a financiar
projetos estruturantes de interesse dos Estados, como a construção de hospitais
e rodovias, passou a ser usada fora de sua finalidade original. Entre 2017 e
2024, foram quase R$ 20 bilhões registrados inicialmente de forma genérica,
como se os recursos fossem destinados a governos estaduais, e depois
redirecionados para prefeituras. O resultado é a pulverização das emendas entre
mais de 4 mil municípios, desvirtuando a sua função original.
A manobra é proibida, salvo exceções, mas,
como é comum na onírica realidade de Brasília, a exceção virou regra. Na
prática, ela faz com que as emendas de bancada, originalmente criadas para
financiar projetos de impacto regional, sigam a mesma lógica das chamadas
emendas individuais: distribuição pulverizada para prefeituras e foco em
redutos eleitorais e nas alianças locais dos parlamentares, além da facilidade
de execução mais rápida, o que tende a gerar dividendos políticos supostamente
maiores. “Elas foram criadas para financiar obras coletivas, que não são
possíveis de executar por meio das emendas individuais. Transformá-las em
repasses pulverizados é desvirtuar completamente esse propósito”, afirmou o
pesquisador do Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP)
Humberto Nunes Alencar, que compilou os dados.
O “erro” começa no início da tramitação do
Orçamento no Congresso, momento em que os parlamentares indicam os destinos das
emendas do ano seguinte. Por lei, toda emenda de bancada fica vinculada a um
ministério, que executa os recursos nos Estados. A limitação, no entanto, é
burlada por meio de uma manobra recorrente: com o Orçamento aprovado,
coordenadores de bancada pedem à pasta que divida uma única emenda de bancada
em dezenas de repasses para prefeituras. Com um governo de base frágil e,
portanto, sempre disposto a evitar fissuras no Congresso, os ministérios
praticamente só carimbam a artimanha. Para 2025, a previsão é de que essa
modalidade movimente R$ 14,2 bilhões, montante que o governo federal é obrigado
a pagar desde 2019.
O desvirtuamento de propósito tem sido peça
frequente da marotagem parlamentar que distorce o Orçamento público. No caso
das emendas de bancada, por exemplo, como também mostrou este jornal, de 2020 a
2024 foram mais de R$ 51 bilhões distribuídos entre os Estados sem critérios
técnicos na divisão dos recursos, como a população, o nível de arrecadação de
impostos e indicadores socioeconômicos. O esforço para criar diques de
contenção ao problema das emendas parlamentares começou em 2021, quando o Estadão revelou
a existência de um sofisticado esquema de compra de apoio urdido pelo governo
de Jair Bolsonaro e pela caciquia do Congresso – o chamado “orçamento secreto”.
O STF declarou sua inconstitucionalidade em
dezembro de 2022, mas se descobriu que a prática seguiu firme no governo de
Lula da Silva, com ministérios transferindo dinheiro para municípios sob ordens
de deputados e senadores e fora do alcance de controles institucionais claros e
precisos. Recentemente, o STF, em ação liderada pelo ministro Flávio Dino em
acordo com os presidentes da Câmara e do Senado, impôs regras mais rígidas e
exigências de maior transparência na definição e uso dos recursos do Orçamento.
Como se nota, porém, o raio de ação dos cupins da República é amplo o
suficiente para seguir inquietando o País, abrindo brecha sobre brecha.
Há muito o que corrigir, e não só entre os
ardis do Congresso. Não é boa para o País a continuidade desse arranjo
institucional degenerado que confere aos parlamentares um poder inaudito sobre
o Orçamento federal sem a contrapartida da devida responsabilização.
Indignação seletiva
O Estado de S. Paulo
Lula não cansa de caluniar Israel enquanto
contemporiza crimes de seus ‘companheiros’
Mal desceu da tribuna na Praça Vermelha após
o festim militar de Vladimir Putin, Lula da Silva voltou a acusar Israel de
“genocídio”. Não foi um deslize, mas a reafirmação de um discurso parcial,
ideológico e temerário. Ao repetir essa acusação sem base jurídica, Lula
compromete a já surrada credibilidade diplomática do Brasil.
“Na Faixa de Gaza é um genocídio de um
exército muito bem preparado contra mulheres e crianças a pretexto de matar
terroristas”, disse o presidente em conversa com jornalistas no dia 10 passado.
Chamar de genocídio a campanha militar
israelense é mais que exagero: é deturpação. Genocídio exige intenção
deliberada de exterminar um povo – o que não se aplica à guerra iniciada após o
massacre do Hamas. Os meios de Israel são passíveis de reprovação, mas seus
objetivos – libertar reféns, eliminar arsenais e neutralizar o Hamas – são
defensáveis e justos. Comparar tais ações ao “Holocausto”, como já fez o
petista, é ofensivo às vítimas do nazismo e uma infame banalização da História.
Lula ignora crimes mais evidentes, como os de
Putin na Ucrânia. Suas palavras, ditas durante a celebração imperial russa,
contrastam com seu silêncio sobre crimes como o sequestro de milhares de
crianças pelo “companheiro” Putin.
A hostilidade do lulopetismo a Israel
antecede a guerra de Gaza. As acusações de genocídio começaram antes mesmo do
revide ao Hamas. Já as condenações ao Hamas foram sempre elusivas, genéricas e
relutantes. Lula evita tanto quanto pode chamar o grupo pelo que ele é: uma
organização terrorista, teocrática, genocida, inimiga da humanidade e,
sobretudo, do povo palestino.
Tampouco reconhece o papel do Irã, que
financia o Hamas e milícias similares. A foto do vice-presidente Geraldo
Alckmin em Teerã ladeado por jihadistas ilustra uma diplomacia que perdeu o
norte moral. Não haverá paz no Oriente Médio sem enfrentar o papel
desestabilizador do Irã – mas Lula prefere o silêncio.
Seu pacifismo é retórico. Fala muito, mas
nada propõe. Que ideias Lula tem para envolver os países árabes moderados? Que
pressão faz sobre Estados que sustentam o Hamas? Que planos tem para corredores
humanitários ou desmilitarização? Limitado a platitudes sobre “cessar-fogo”,
aplica sempre uma lógica assimétrica de críticas.
Sua diplomacia seria apenas folclórica, não
fosse danosa. O Brasil não tem força militar nem peso econômico para mediar
grandes conflitos, mas poderia se valer de uma reputação moral que tem sido
dilapidada por quem confunde protagonismo com exibicionismo.
E onde poderia, de fato, influenciar, como na
América Latina, Lula se omite. Maduro, Ortega e os generais cubanos são
tratados com deferência. Prisões políticas, perseguições religiosas, execuções
sumárias são ignoradas. Quando não silencia, Lula inverte responsabilidades:
culpa os EUA pelo êxodo venezuelano, o embargo pela miséria cubana e o
“imperialismo” pelas tensões regionais.
Sua indignação é seletiva. Chama genocídio a uma guerra justa, mas silencia sobre quem, de fato, sequestra crianças. A fala de Lula em Moscou não ajuda a causa da paz nem a dos palestinos. Serve apenas à sua vaidade.
Gripe aviária é emergência sanitária
Correio Braziliense
O vírus não é transmitido pelo consumo de
carne de aves nem de ovos, mas a doença pode afetar tratadores e pessoas com
contato direto com as aves infectadas
O Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa)
confirmou a presença do vírus da influenza aviária de alta patogenicidade
(IAAP) em um matrizeiro de aves comerciais em Montenegro, no Rio Grande do
Sul. É o primeiro foco detectado no Brasil pela doença, que circula na
Ásia, na África e na Europa.
O vírus não é transmitido pelo consumo de
carne de aves e ovos, mas a doença pode afetar tratadores e pessoas com contato
direto com as aves infectadas. Trata-se de uma emergência sanitária grave, que
está no centro das atenções das autoridades brasileiras, sobretudo dos
ministérios da Agricultura e Pecuária, Saúde e Meio Ambiente.
Um plano de contingência está em execução. O
serviço veterinário do governo vem sendo treinado e equipado para o
enfrentamento dessa doença há mais de 20 anos, com o monitoramento de aves
silvestres, a vigilância epidemiológica na avicultura comercial e de
subsistência, o treinamento constante de técnicos dos serviços veterinários
oficiais e privados, ações de educação sanitária e a implementação de
atividades de vigilância nos pontos de fronteira.
Mesmo assim, surgiu um foco no Sul. A notícia
é péssima para o agronegócio brasileiro, porque afeta a imagem da carne de
frango brasileira e compromete acordos comerciais recentes, num momento de
expansão das exportações do produto. É fundamental que o governo atue com
rapidez e transparência.
A adoção imediata de protocolos sanitários
rigorosos e a comunicação clara com os parceiros internacionais são medidas
essenciais para conter impactos econômicos e preservar a confiança no sistema
de controle sanitário brasileiro. A demora ou a omissão podem custar caro, não
apenas ao setor exportador, mas à economia como um todo.
A Rio Grande do Sul é o terceiro maior
produtor de frango do Brasil, atrás apenas do Paraná e de Santa Catarina.
Juntos, esses três estados respondem por quase 58% do volume de carne de frango
produzida no país. Goiás (9,10%) e São Paulo (8,65%) também são grandes
produtores.
As exportações de frango registraram um
recorde de 5,294 milhões de toneladas, uma receita de US$ 9,928 bilhões. O que
está em risco são nossas exportações para a Ásia, sobretudo China (562,2 mil
toneladas), Emirados Árabes Unidos (455,1 mil), Japão (443,2) mil toneladas e
Arabia Saudita (270,8 mil), países que recentemente ampliaram acordos
comerciais com o Brasil, ), além da União Europeia (231,9 mil toneladas).
Quinta-feira, a China suspendeu as importações de carne de frango brasileira por 60 dias, após a confirmação do primeiro caso de gripe aviária em Montenegro, conforme protocolo sanitário bilateral; nesta sexta-feira, a Argentina e a União Europeia fizeram a mesma coisa. Além disso, as exportações de carne de frango e produtos avícolas do Rio Grande do Sul foram suspensas temporariamente para todos os países, por decisão das autoridades sanitárias brasileiras.
Aumentam evidências sobre tentativa de golpe
O Povo(CE)
Os responsáveis por essa aventura
antidemocrática têm de pagar, nos termos da lei, pelo mal que causaram
O ex-presidente da República Jair Bolsonaro e
seus aliados continuarão insistindo na tese de que não houve tentativa de golpe
de Estado. Vão desconsiderar as substanciais provas recolhidas pela Polícia
Federal (PF) e o relatório da Procuradoria Geral da República (PGR) fazendo a
ligação dos fatos pós eleição de 2022, quando a tentativa de golpe começou a
ser urdida, terminando por desaguar no 8 de janeiro de 2023.
O conjunto de provas levou a Primeira Turma
do Supremo Tribunal Federal (STF) a aceitar, por unanimidade, a denúncia contra
Bolsonaro e mais sete aliados, por tentativa de golpe de Estado.
Na sequência, o STF aprovou a denúncia da PGR
em relação a três outros grupos, como parte de uma organização criminosa cujo
objetivo era impedir a posse de um governo legitimamente eleito.
Mesmo assim, a oposição insiste que esses
acontecimentos não caracterizam tentativa de golpe de Estado, pois a operação
não teria sido posta em prática.
Mas o fato é que houve ações que caracterizam
a tentativa, como expôs a denúncia da PGR. Além do mais, por óbvio, em uma
situação dessas, é a tentativa de pôr um plano em prática é que tem de ser
criminalizada. Pois, se o planejado obtivesse sucesso, o País estaria hoje sob
o comando autoritário dos sublevados.
Agora, um áudio recuperado nas investigações
revela que o plano "Punhal Verde e Amarelo" não era apenas uma
fantasia que saiu da cabeça de meia dúzia de amalucados.
Seus organizadores estavam falando sério
quando planejavam matar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, seu vice
Geraldo Alckmin e o ministro do STF Alexandre de Moraes.
O policial federal Wladimir Matos Soares
afirmou, por mensagem de áudio, que estava preparado para tomar o poder e
"matar meio mundo de gente". Ele afirma que fazia parte da equipe de
operações especiais com a tarefa de defender o ex-presidente com armas,
aguardando apenas ordens para seguir adiante com o plano de mantê-lo no poder.
Mas queixou-se que Bolsonaro "deu para trás", pois teria sido
"traído dentro do Exército".
As provas se avolumam de tal maneira que fica
difícil até aos mais ferrenhos defensores de Bolsonaro, inclusive ele próprio,
contestarem as evidências.
Esta semana, o ex-presidente admitiu ter
discutido com militares sobre a decretação de estado de sítio, uma tentativa de
impedir a posse de Lula, dentro das "quatro linhas da Constituição".
Ora, mas por que a medida extrema se não
havia nenhuma "comoção grave de repercussão nacional" no País?
O que existia era a tentativa de impedir a
posse do presidente legitimamente eleito para beneficiar Jair Bolsonaro e seus
aliados.
É praticamente impossível negar que estava em
curso uma tentativa de golpe de Estado.
Assim, os responsáveis por essa aventura antidemocrática têm de pagar, nos termos da lei, pelo mal que causaram.
Nenhum comentário:
Postar um comentário