sábado, 17 de maio de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Restrição a dados sobre gastos viola Constituição

O Globo

Vedar acesso a documentos contradiz promessa de Lula e contribui para alimentar suspeitas

É um desafio inaceitável ao bom senso, às boas práticas da administração pública e à Constituição a restrição imposta pelo Ministério da Gestão e Inovação (MGI) a documentos relativos a acordos com estados, municípios e organizações não governamentais. O MGI afirma ter retirado a documentação da plataforma sobre gastos públicos em respeito a parecer da Advocacia-Geral da União (AGU) que alega necessidade de preservar informações privadas, como determina a Lei Geral de Proteção de Dados.

É uma alegação risível. A Constituição determina expressamente a obrigação de garantir publicidade a todos os gastos do governo. Deve ficar explícito o destino de cada centavo: quem recebeu, quanto recebeu e por que recebeu. Para preservar os dados pessoais em respeito à privacidade de certos destinatários das verbas, basta omiti-los ou ocultá-los na documentação. Barrar completamente o acesso aos documentos é uma medida drástica que viola a transparência — uma das principais promessas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “Sem transparência não há democracia”, afirmou Lula cinco meses depois de sua posse. “O acesso à informação, como direito fundamental previsto em nossa Constituição, precisa estar cada vez mais presente na vida do cidadão e na cultura de cada agente público.”

Infelizmente, as palavras de Lula não têm correspondido à prática de seu governo. Na campanha, ele afirmou que acabaria com sigilos de cem anos impostos por Jair Bolsonaro. No poder, impôs sigilo a informações da maior relevância para a compreensão das relações entre o público e o privado em sua gestão. É o caso do rol de visitantes à primeira-dama Janja Lula da Silva no Palácio da Alvorada; dos gastos do Planalto com o helicóptero presidencial e com alimentação no Alvorada; das visitas dos filhos de Lula ao Planalto; da declaração prestada pelo ministro Alexandre Silveira sobre possíveis conflitos de interesse antes de assumir o cargo; e, inicialmente, até da lista de convidados para sua posse e das imagens das câmeras de segurança do Planalto da invasão golpista no 8 de Janeiro (ambas só foram liberadas depois de pressão ou decisões da Justiça).

O veto à documentação sobre gastos estimados em R$ 600 bilhões foi decido pelo MGI justamente num momento em que fica explícita a destinação suspeita de verbas de ministérios a ONGs vinculadas a petistas. Pior ainda, ele se estende aos recursos transferidos por meio de emendas parlamentares — que continuam deixando a desejar em termos de transparência, por isso são alvo de ações no Supremo Tribunal Federal (STF). Foram ocultados os documentos de prestação de contas dos municípios que receberam recursos por meio das emendas do relator, conhecidas como “orçamento secreto” e julgadas inconstitucionais pelo STF em razão da falta de transparência em 2022.

É imperativo que o Supremo ordene a abertura das informações ocultadas. A medida do MGI viola as normas internacionais de transparência necessárias para a saúde de qualquer democracia, dificulta o controle dos gastos públicos e é incompatível com as promessas do próprio Lula. É perfeitamente possível assegurar o sigilo adequado a dados pessoais quando justificável. Qualquer informação a mais que seja ocultada apenas contribui para aumentar as suspeitas que se acumulam sobre os agentes públicos.

Acordo sobre Favela do Moinho pode se tornar exemplo de ação integrada

O Globo

Gestões Lula e Tarcísio acertam ao priorizar parceria técnica em vez de insistir em confronto político

Foi tranquilizador o acordo firmado entre os governos federal e paulista para realocar os moradores da Favela do Moinho, uma das últimas remanescentes no centro de São Paulo. Até agora, o debate em torno da requalificação da favela se tornara um lamentável exemplo de politização. Enquanto as gestões do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) e do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) trocavam acusações, o projeto de realocação da população e reurbanização da região era adiado ou sabotado.

O estado alegava “má vontade” federal, enquanto o Ministério da Gestão exigia garantias adicionais para liberar a cessão do terreno, propriedade da União. No último capítulo, o governo federal chegou a cancelar a transferência da área, alegando violência das forças de segurança contra os moradores e demolição prematura das casas. Felizmente, no novo acordo prevaleceu uma visão técnica.

Pelos termos acertados com a contribuição do Ministério das Cidades, o auxílio-aluguel aos moradores subirá de R$ 800 para R$ 1.200 mensais. O modelo de reassentamento será inspirado no programa Minha Casa, Minha Vida adotado recentemente no Rio Grande do Sul. As famílias poderão adquirir imóveis por meio de “compra assistida”, em vez de apenas receber uma carta de crédito. O custo dos novos imóveis — cerca de R$ 250 mil cada — será compartilhado entre União (R$ 180 mil) e estado (R$ 70 mil), sem gerar dívidas posteriores às famílias beneficiadas.

O ponto crucial foi a concordância do governo federal em ceder ao estado o terreno, desde que não haja emprego da força policial para retirar os moradores, uma condicionante sensata. “Qualquer tipo de violência deixa esse acordo completamente inviabilizado”, diz o ministro das Cidades, Jader Filho.

Ao todo, vivem no local 821 famílias em situação precária, num ambiente inseguro, sujeito a incêndios frequentes e foco de tráfico comandado pelo crime organizado. São condições inaceitáveis de habitação. Por isso a adesão das famílias à mudança já era expressiva: de acordo com o governo estadual, 719 das 821 concordavam com o plano, e quase 500 já tinham escolhido seus imóveis.

No lugar da favela, o projeto pretende criar o Parque do Moinho e permitir a expansão das estações de trem próximas — tudo aquilo de que a cidade mais precisa. A experiência recente mostra que programas habitacionais funcionam quando levam em conta as necessidades da população, oferecendo proximidade das áreas centrais e infraestrutura adequada. A parceria entre União, estado e município mostra a importância de trabalhar em conjunto para resolver questões urbanas complexas. Politizar decisões técnicas só causa atraso e sofrimento às famílias envolvidas. O resultado alcançado na Favela do Moinho poderá se tornar um modelo a seguir para outras regiões da cidade e do país.

Brasil envelhece sem ter enriquecido nem se educado

Folha de S. Paulo

Queda contínua no número de nascimentos demanda mais reforma previdenciária, reforço do SUS e debate sobre imigração

O número de nascimentos no Brasil caiu pelo quinto ano consecutivo em 2023. Foi o menor desde 2015, ano a partir do qual há dados mais rigorosos, conforme as Estatísticas do Registro Civil do IBGE, divulgadas nesta sexta-feira (16).

A queda foi de 0,7% em relação a 2022. O total de registros ficou 12% abaixo da média de 2015 a 2019, ano imediatamente anterior ao do início da pandemia.

Trata-se de mais um dos indicadores que contribuem para explicar a redução do crescimento da população —além de quedas abruptas de natalidade e fecundidade, uma taxa de imigração irrelevante, se não negativa.

Segundo projeções também do IBGE, a taxa de expansão da população brasileira era de cerca de 1,3% ao ano no início deste século. Ela baixou a 0,7% no início da década passada e, atualmente, está próxima de 0,4%. O número de habitantes do Brasil deixaria de crescer em torno de 2040.

É possível especular que um decênio de crise econômica e o impacto da Covid-19 podem ter contribuído para uma baixa adicional da propensão a ter filhos. No entanto a tendência vem de longe, a rigor desde a urbanização rápida do país.

A ampliação da renda e da escolaridade desacelerou ainda mais o aumento populacional. São processos observados em quase qualquer parte do mundo.

A autodeterminação das mulheres quanto a opções de vida e carreira deve ter tido peso relevante, se por mais não fosse porque sustentam o peso maior da geração e criação de filhos.

Para homens e mulheres que também trabalham fora de casa, é difícil cuidar das crianças de modo adequado, dada a precariedade do sistema de creches e de escolas em tempo dito integral. Sobem os custos relativos de saúde e educação privadas.

São problemas de longo prazo de política pública, que ora não ocupam o centro do debate. Sejam quais forem os motivos da baixa da natalidade, seus efeitos até aqui já bastam para criar outras preocupações.

O Brasil envelhece sem ter enriquecido ou ao menos se educado de modo satisfatório; natalidade e fecundidade desaceleram em ritmo de países avançados. O bônus demográfico está perto de acabar —trata-se aqui do período em que é maior a proporção de pessoas em idade de trabalhar em relação à de aposentados e crianças na sociedade.

A despesa com aposentados já cresce de modo insustentável, e a demografia vai agravar esse problema e o gasto com cuidados com os mais idosos.

Será preciso uma reforma previdenciária mais profunda, mais atenção à saúde preventiva, aperfeiçoamento e expansão do SUS, incrementar condições sociais para a criação de crianças. Já é momento, ademais, de pensar nas políticas de imigração.

Convirá ao Brasil atrair pessoas para ampliar sua força de trabalho, em vez de, como hoje, perder mão de obra qualificada que busca vida melhor em outros países.

A queda singular da inflação argentina

Folha de S. Paulo

Mesmo com risco de alta devido à mudança da política cambial, índice de preços cai a 2,8% em abril e 47,3% em 12 meses

Nobel de Economia em 1971, Simon Kuznets disse que a Argentina era um país singular: tinha tudo para ser desenvolvido, mas vivia sob a instabilidade econômica. Se o país ainda não deixou para trás o diagnóstico, ao menos mostra agora sua singularidade com uma queda surpreendente da inflação.

O índice de preços ao consumidor em abril foi de 2,8%, enquanto o Banco Central argentino e consultorias projetavam taxa acima de 3%, dada a mudança da política cambial em meados do mês. O recuo em relação a março foi de 0,9 ponto percentual.

O dado de abril puxou para baixo a inflação nos últimos 12 meses de 55,9%, em março, para 47,3% e deu início à revisão de estimativas de economistas para o ano —a agência Moody’s prevê 30%, a depender das pressões cambiais e dos preços dos combustíveis.

De todo modo, o resultado deste 2025 tende a ser promissor, quando se leva em conta o inegável impacto da duríssima política de ajuste orçamentária levada a cabo por Javier Milei, que levou a inflação de 211% em 2023, sob o regime de esquerda populista, para 118% no ano passado.

Mas é recomendável cautela. Há preocupação, por exemplo, que exclui variações de preços sazonais e de itens regulados. Esse indicador ficou em 3,2% em abril, acima da taxa oficial.

Note-se também que, em abril, o cenário mudou substancialmente por meio do acordo de US$ 20 bilhões com o Fundo Monetário Internacional (FMI), que exigiu a correção da arcaica política de controle cambial do país —apesar do risco de uma desvalorização do peso afetar a carestia.

Milei corretamente aquiesceu. A cotação oficial passou a flutuar numa banda de 1.100 a 1.400 pesos, com ajustes mensais de 1%. O teto de US$ 200 para compra de dólares por pessoas físicas no mercado oficial, vigente desde 2019, foi extinto, assim como restrições a importadores.

Logo após o anúncio das medidas, a desvalorização do peso alcançou 8,4%. Desde então, porém, o câmbio oficial se estabilizou na primeira metade da banda, com efeitos marginais sobre a inflação. Mesmo com o fim do teto, os argentinos não correram ao dólar, como fizeram diante de reformas cambiais no passado.

Por óbvio pesam dúvidas sobre a inflação nos próximos meses. Seja por fatores internos, como a reforma cambial ainda incompleta e a dificuldade para atrair investimentos, seja pelas incertezas globais, o governo Milei ainda terá de navegar entre a ousadia e a prudência para de fato estabilizar a economia argentina —este, sim, um feito que será singular.

O calvário das vítimas dos larápios do INSS

O Estado de S. Paulo

Aposentados e pensionistas carregam fardo de ter de comprovar pilhagem de seus benefícios em fraude que escancara descontrole de sucessivos governos e só reforça a necessidade de uma CPMI

Decorrido quase um mês da Operação Sem Desconto, que desviou, por baixo, R$ 6 bilhões de aposentadorias e pensões previdenciárias, a única certeza a emergir do escândalo até agora é que o sistema do INSS é falho, impreciso e desprovido de mecanismos que evitem sua burla. Já passa de 1 milhão o número de beneficiários que contestaram o desconto de contribuições associativas e sindicais em folha de pagamento desde quando o INSS abriu o canal de comunicação no aplicativo da autarquia.

Uma auditoria da Controladoria-Geral da União (CGU), que deu azo à deflagração da operação, em parceria com a Polícia Federal (PF), sugere que a ladroagem deve ter feito milhões de vítimas – afinal o INSS emitiu 9,4 milhões de notificações. E são elas, as vítimas, que agora têm de enfrentar um calvário em busca de ressarcimento por um prejuízo que muitas nem sequer haviam identificado. De fato, o relatório divulgado pela CGU no dia em que a ação policial foi deflagrada, no final de abril, apontava que a maioria dos beneficiários desconhecia os descontos ou achava que eles eram obrigatórios.

A CGU puxou o fio de fraudes que ocorriam a conta-gotas, com débitos de pequenos valores em um volume extraordinário de benefícios, numa ramificação tão abrangente que torna indecoroso o descontrole do governo sobre a manipulação dos benefícios do INSS – e não apenas deste governo, a bem da verdade. Como apontam as investigações, os descontos foram iniciados em 2016, durante o governo Michel Temer, e ganharam escala em 2022, na gestão Jair Bolsonaro, quando houve dispensa da necessidade de revalidação anual.

No primeiro dia de recebimento de contestações, 41 entidades associativas foram citadas por aposentados e pensionistas como responsáveis por descontos indevidos, bem mais que o total de 12 que vinham sendo investigadas pela PF e que tiveram pouco mais de R$ 2 bilhões bloqueados para ressarcir as vítimas. É pouco e, como já admitiu a ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, recursos do erário poderão vir a ser utilizados para reembolsar aposentados e pensionistas roubados sob as barbas do poder público.

Ao menos até agora, o governo Lula da Silva não deu mostras de que conseguirá arquitetar uma solução que atenda a todos os lesados no menor tempo possível, como seria razoável para uma situação indefensável como esta. Para boa parte das vítimas, fazer uma reclamação por meio de um aplicativo digital é algo pouco amigável e até mesmo inacessível.

Ademais, a julgar pelo comportamento do governo desde quando estourou o escândalo, preocupa a morosidade e os caminhos tortuosos que podem ser adotados para corrigir o descalabro. Entre a deflagração da operação e a demissão de Carlos Lupi do Ministério da Previdência, passaram-se nove longos dias, apesar das evidências de que, no mínimo, houve negligência por parte do agora ex-ministro.

Ao nomear como substituto Wolney Queiroz, braço direito de Lupi, Lula trocou seis por meia dúzia. O novo ministro, por óbvio, culpa o governo Bolsonaro pela proliferação de associações fraudulentas. Providencialmente, Queiroz parece ter esquecido que ele próprio, como deputado, em 2021, foi coautor da emenda que adiou a exigência de revalidação anual dos descontos em folha.

Tudo isso só fortalece a necessidade de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) para apurar um esquema que parece ter contado ora com a omissão, ora com a colaboração de muitas autoridades no Executivo e no Congresso nos últimos anos.

O governo tenta evitar que a CPMI seja instalada, mas, se isso não for possível, buscará colocar aliados em cargos importantes do colegiado, como a presidência e a relatoria, para delimitar as investigações, responsabilizar a gestão Bolsonaro pela origem do problema e, de quebra, vender a falácia de que foi Lula quem acabou com o esquema.

Tão importante quanto descobrir como isso começou é apurar como tudo continuou por tanto tempo. Mas o fundamental é estabelecer controles rígidos no INSS para impedir que escândalos como este jamais voltem a se repetir. Do contrário, será mais uma CPMI que acabará em pizza.

A criatividade inesgotável dos cupins da República

O Estado de S. Paulo

Nova manobra engendrada por parlamentares desvirtua ‘emendas de bancada’ e agrava ainda mais processo de captura do Orçamento pelo Congresso, à margem da devida responsabilização

Quando se trata da deformação do manejo do Orçamento da União para atender aos interesses particulares dos parlamentares, a criatividade do Congresso parece infinita. Além do longo rol de problemas que envolveram a ampliação, imposição e diversificação das emendas nos últimos anos, felizmente agora com regras mais rígidas a partir da pressão pública e da atuação do Supremo Tribunal Federal (STF), o Estadão mostrou nos últimos dias um outro tipo de ardil criado pelos congressistas: parte das chamadas “emendas de bancada estadual”, originalmente destinadas a financiar projetos estruturantes de interesse dos Estados, como a construção de hospitais e rodovias, passou a ser usada fora de sua finalidade original. Entre 2017 e 2024, foram quase R$ 20 bilhões registrados inicialmente de forma genérica, como se os recursos fossem destinados a governos estaduais, e depois redirecionados para prefeituras. O resultado é a pulverização das emendas entre mais de 4 mil municípios, desvirtuando a sua função original.

A manobra é proibida, salvo exceções, mas, como é comum na onírica realidade de Brasília, a exceção virou regra. Na prática, ela faz com que as emendas de bancada, originalmente criadas para financiar projetos de impacto regional, sigam a mesma lógica das chamadas emendas individuais: distribuição pulverizada para prefeituras e foco em redutos eleitorais e nas alianças locais dos parlamentares, além da facilidade de execução mais rápida, o que tende a gerar dividendos políticos supostamente maiores. “Elas foram criadas para financiar obras coletivas, que não são possíveis de executar por meio das emendas individuais. Transformá-las em repasses pulverizados é desvirtuar completamente esse propósito”, afirmou o pesquisador do Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP) Humberto Nunes Alencar, que compilou os dados.

O “erro” começa no início da tramitação do Orçamento no Congresso, momento em que os parlamentares indicam os destinos das emendas do ano seguinte. Por lei, toda emenda de bancada fica vinculada a um ministério, que executa os recursos nos Estados. A limitação, no entanto, é burlada por meio de uma manobra recorrente: com o Orçamento aprovado, coordenadores de bancada pedem à pasta que divida uma única emenda de bancada em dezenas de repasses para prefeituras. Com um governo de base frágil e, portanto, sempre disposto a evitar fissuras no Congresso, os ministérios praticamente só carimbam a artimanha. Para 2025, a previsão é de que essa modalidade movimente R$ 14,2 bilhões, montante que o governo federal é obrigado a pagar desde 2019.

O desvirtuamento de propósito tem sido peça frequente da marotagem parlamentar que distorce o Orçamento público. No caso das emendas de bancada, por exemplo, como também mostrou este jornal, de 2020 a 2024 foram mais de R$ 51 bilhões distribuídos entre os Estados sem critérios técnicos na divisão dos recursos, como a população, o nível de arrecadação de impostos e indicadores socioeconômicos. O esforço para criar diques de contenção ao problema das emendas parlamentares começou em 2021, quando o Estadão revelou a existência de um sofisticado esquema de compra de apoio urdido pelo governo de Jair Bolsonaro e pela caciquia do Congresso – o chamado “orçamento secreto”.

O STF declarou sua inconstitucionalidade em dezembro de 2022, mas se descobriu que a prática seguiu firme no governo de Lula da Silva, com ministérios transferindo dinheiro para municípios sob ordens de deputados e senadores e fora do alcance de controles institucionais claros e precisos. Recentemente, o STF, em ação liderada pelo ministro Flávio Dino em acordo com os presidentes da Câmara e do Senado, impôs regras mais rígidas e exigências de maior transparência na definição e uso dos recursos do Orçamento. Como se nota, porém, o raio de ação dos cupins da República é amplo o suficiente para seguir inquietando o País, abrindo brecha sobre brecha.

Há muito o que corrigir, e não só entre os ardis do Congresso. Não é boa para o País a continuidade desse arranjo institucional degenerado que confere aos parlamentares um poder inaudito sobre o Orçamento federal sem a contrapartida da devida responsabilização.

Indignação seletiva

O Estado de S. Paulo

Lula não cansa de caluniar Israel enquanto contemporiza crimes de seus ‘companheiros’

Mal desceu da tribuna na Praça Vermelha após o festim militar de Vladimir Putin, Lula da Silva voltou a acusar Israel de “genocídio”. Não foi um deslize, mas a reafirmação de um discurso parcial, ideológico e temerário. Ao repetir essa acusação sem base jurídica, Lula compromete a já surrada credibilidade diplomática do Brasil.

“Na Faixa de Gaza é um genocídio de um exército muito bem preparado contra mulheres e crianças a pretexto de matar terroristas”, disse o presidente em conversa com jornalistas no dia 10 passado.

Chamar de genocídio a campanha militar israelense é mais que exagero: é deturpação. Genocídio exige intenção deliberada de exterminar um povo – o que não se aplica à guerra iniciada após o massacre do Hamas. Os meios de Israel são passíveis de reprovação, mas seus objetivos – libertar reféns, eliminar arsenais e neutralizar o Hamas – são defensáveis e justos. Comparar tais ações ao “Holocausto”, como já fez o petista, é ofensivo às vítimas do nazismo e uma infame banalização da História.

Lula ignora crimes mais evidentes, como os de Putin na Ucrânia. Suas palavras, ditas durante a celebração imperial russa, contrastam com seu silêncio sobre crimes como o sequestro de milhares de crianças pelo “companheiro” Putin.

A hostilidade do lulopetismo a Israel antecede a guerra de Gaza. As acusações de genocídio começaram antes mesmo do revide ao Hamas. Já as condenações ao Hamas foram sempre elusivas, genéricas e relutantes. Lula evita tanto quanto pode chamar o grupo pelo que ele é: uma organização terrorista, teocrática, genocida, inimiga da humanidade e, sobretudo, do povo palestino.

Tampouco reconhece o papel do Irã, que financia o Hamas e milícias similares. A foto do vice-presidente Geraldo Alckmin em Teerã ladeado por jihadistas ilustra uma diplomacia que perdeu o norte moral. Não haverá paz no Oriente Médio sem enfrentar o papel desestabilizador do Irã – mas Lula prefere o silêncio.

Seu pacifismo é retórico. Fala muito, mas nada propõe. Que ideias Lula tem para envolver os países árabes moderados? Que pressão faz sobre Estados que sustentam o Hamas? Que planos tem para corredores humanitários ou desmilitarização? Limitado a platitudes sobre “cessar-fogo”, aplica sempre uma lógica assimétrica de críticas.

Sua diplomacia seria apenas folclórica, não fosse danosa. O Brasil não tem força militar nem peso econômico para mediar grandes conflitos, mas poderia se valer de uma reputação moral que tem sido dilapidada por quem confunde protagonismo com exibicionismo.

E onde poderia, de fato, influenciar, como na América Latina, Lula se omite. Maduro, Ortega e os generais cubanos são tratados com deferência. Prisões políticas, perseguições religiosas, execuções sumárias são ignoradas. Quando não silencia, Lula inverte responsabilidades: culpa os EUA pelo êxodo venezuelano, o embargo pela miséria cubana e o “imperialismo” pelas tensões regionais.

Sua indignação é seletiva. Chama genocídio a uma guerra justa, mas silencia sobre quem, de fato, sequestra crianças. A fala de Lula em Moscou não ajuda a causa da paz nem a dos palestinos. Serve apenas à sua vaidade.

Gripe aviária é emergência sanitária

Correio Braziliense

O vírus não é transmitido pelo consumo de carne de aves nem de ovos, mas a doença pode afetar tratadores e pessoas com contato direto com as aves infectadas

O Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) confirmou a presença do vírus da influenza aviária de alta patogenicidade (IAAP) em um matrizeiro de aves comerciais em Montenegro, no Rio Grande do Sul.  É o primeiro foco detectado no Brasil pela doença, que circula na Ásia, na África e na Europa.

O vírus não é transmitido pelo consumo de carne de aves e ovos, mas a doença pode afetar tratadores e pessoas com contato direto com as aves infectadas. Trata-se de uma emergência sanitária grave, que está no centro das atenções das autoridades brasileiras, sobretudo dos ministérios da Agricultura e Pecuária, Saúde e Meio Ambiente.

Um plano de contingência está em execução. O serviço veterinário do governo vem sendo treinado e equipado para o enfrentamento dessa doença há mais de 20 anos, com o monitoramento de aves silvestres, a vigilância epidemiológica na avicultura comercial e de subsistência, o treinamento constante de técnicos dos serviços veterinários oficiais e privados, ações de educação sanitária e a implementação de atividades de vigilância nos pontos de fronteira.

Mesmo assim, surgiu um foco no Sul. A notícia é péssima para o agronegócio brasileiro, porque afeta a imagem da carne de frango brasileira e compromete acordos comerciais recentes, num momento de expansão das exportações do produto. É fundamental que o governo atue com rapidez e transparência.

A adoção imediata de protocolos sanitários rigorosos e a comunicação clara com os parceiros internacionais são medidas essenciais para conter impactos econômicos e preservar a confiança no sistema de controle sanitário brasileiro. A demora ou a omissão podem custar caro, não apenas ao setor exportador, mas à economia como um todo.

A Rio Grande do Sul é o terceiro maior produtor de frango do Brasil, atrás apenas do Paraná e de Santa Catarina. Juntos, esses três estados respondem por quase 58% do volume de carne de frango produzida no país. Goiás (9,10%) e São Paulo (8,65%) também são grandes produtores.

As exportações de frango registraram um recorde de 5,294 milhões de toneladas, uma receita de US$ 9,928 bilhões. O que está em risco são nossas exportações para a Ásia, sobretudo China (562,2 mil toneladas), Emirados Árabes Unidos (455,1 mil), Japão (443,2) mil toneladas e Arabia Saudita (270,8 mil), países que recentemente ampliaram acordos comerciais com o Brasil, ), além da União Europeia (231,9 mil toneladas).

Quinta-feira, a China suspendeu as importações de carne de frango brasileira por 60 dias, após a confirmação do primeiro caso de gripe aviária em Montenegro, conforme  protocolo sanitário bilateral; nesta sexta-feira, a Argentina e a União Europeia fizeram a mesma coisa.  Além disso, as exportações de carne de frango e produtos avícolas do Rio Grande do Sul foram suspensas temporariamente para todos os países, por decisão das autoridades sanitárias brasileiras.

Aumentam evidências sobre tentativa de golpe

O Povo(CE)

Os responsáveis por essa aventura antidemocrática têm de pagar, nos termos da lei, pelo mal que causaram

O ex-presidente da República Jair Bolsonaro e seus aliados continuarão insistindo na tese de que não houve tentativa de golpe de Estado. Vão desconsiderar as substanciais provas recolhidas pela Polícia Federal (PF) e o relatório da Procuradoria Geral da República (PGR) fazendo a ligação dos fatos pós eleição de 2022, quando a tentativa de golpe começou a ser urdida, terminando por desaguar no 8 de janeiro de 2023.

O conjunto de provas levou a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) a aceitar, por unanimidade, a denúncia contra Bolsonaro e mais sete aliados, por tentativa de golpe de Estado.

Na sequência, o STF aprovou a denúncia da PGR em relação a três outros grupos, como parte de uma organização criminosa cujo objetivo era impedir a posse de um governo legitimamente eleito.

Mesmo assim, a oposição insiste que esses acontecimentos não caracterizam tentativa de golpe de Estado, pois a operação não teria sido posta em prática.

Mas o fato é que houve ações que caracterizam a tentativa, como expôs a denúncia da PGR. Além do mais, por óbvio, em uma situação dessas, é a tentativa de pôr um plano em prática é que tem de ser criminalizada. Pois, se o planejado obtivesse sucesso, o País estaria hoje sob o comando autoritário dos sublevados.

Agora, um áudio recuperado nas investigações revela que o plano "Punhal Verde e Amarelo" não era apenas uma fantasia que saiu da cabeça de meia dúzia de amalucados.

Seus organizadores estavam falando sério quando planejavam matar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, seu vice Geraldo Alckmin e o ministro do STF Alexandre de Moraes.

O policial federal Wladimir Matos Soares afirmou, por mensagem de áudio, que estava preparado para tomar o poder e "matar meio mundo de gente". Ele afirma que fazia parte da equipe de operações especiais com a tarefa de defender o ex-presidente com armas, aguardando apenas ordens para seguir adiante com o plano de mantê-lo no poder. Mas queixou-se que Bolsonaro "deu para trás", pois teria sido "traído dentro do Exército".

As provas se avolumam de tal maneira que fica difícil até aos mais ferrenhos defensores de Bolsonaro, inclusive ele próprio, contestarem as evidências.

Esta semana, o ex-presidente admitiu ter discutido com militares sobre a decretação de estado de sítio, uma tentativa de impedir a posse de Lula, dentro das "quatro linhas da Constituição".

Ora, mas por que a medida extrema se não havia nenhuma "comoção grave de repercussão nacional" no País?

O que existia era a tentativa de impedir a posse do presidente legitimamente eleito para beneficiar Jair Bolsonaro e seus aliados.

É praticamente impossível negar que estava em curso uma tentativa de golpe de Estado.

Assim, os responsáveis por essa aventura antidemocrática têm de pagar, nos termos da lei, pelo mal que causaram.

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