terça-feira, 13 de dezembro de 2016

Delações da Odebrecht acuam o governo Temer – Editorial/Valor Econômico

A primeira delação de um ex-executivo da Odebrecht, Cláudio Melo Filho, caiu como uma bomba no círculo do presidente Michel Temer e seus auxiliares mais íntimos - e ainda faltam outros 76 relatos. Temer, Eliseu Padilha, o ministro-chefe da Casa Civil, e Moreira Franco, secretário executivo do Programa de Parcerias e Investimentos, teriam pedido e recebido milhões de reais da empresa, que esperava deles "contrapartidas". Melo Filho apresentou um roteiro de como funcionava a distribuição de recursos entre políticos da Câmara e do Senado para os quais o dinheiro era repassado - boa parte proveniente de caixa 2 do departamento de propinas do grupo. Será preciso ao delator apresentar provas e ao Supremo Tribunal Federal homologar sua delação, mas de imediato elas ampliam o desgaste do governo Temer.

Nenhum dos políticos de maior convivência com o presidente se sai bem do depoimento, a começar pelo "resolvedor da República", o senador Romero Jucá, o primeiro a cair fora do ministério depois que uma gravação vazada mostrava-o como articulador de movimento para "estancar a sangria", isto é, pôr fim à Operação Lava-Jato. Geddel Vieira Lima, ex-ministro da Secretaria de Governo, e ex-membro da trinca de homens fortes do Planalto, é apresentado como um ativo garimpeiro de oportunidades de prestação de serviços, ávido por pagamentos.

O que Cláudio relatou era o que se presumia ser a prática comum dos lobistas e dos políticos que o atendiam, mas que raras vezes foi provado. A "doação" aos políticos, legais ou ilegais, era compra direta de fidelidades no Congresso para a aprovação de medidas que beneficiassem o pagador. Segundo o relato, se constata que pelo menos R$ 17 milhões foram distribuídos para que fossem aprovadas 5 Medidas Provisórias de interesse do grupo baiano - e o montante pode ser bem maior.

O depoimento é didático também em relação à melhor forma de o lobista da Odebrecht atingir seus objetivos - concentrou-se nos parlamentares mais influentes, nos "formadores de opinião" do Congresso que tinham poder de convencimento provado para arrastar seus pares a votar consigo. O mestre nessa arte no Senado teria sido Jucá, aquinhoado, segundo Cláudio, com recursos de R$ 22 milhões. No que diz respeito à Câmara e ao núcleo restante do Planalto, o depoimento deixa claro que o organizador da coleta era Eliseu Padilha, segundo o depoimento de um preposto de Temer. Padilha se encarregou de distribuir R$ 10 milhões que Michel Temer, então vice-presidente, pediu à Odebrecht em reunião com Marcelo Odebrecht no Palácio do Jaburu para a campanha de 2014. Parte do dinheiro foi entregue no escritório do amigo advogado e conselheiro do presidente, José Yunes. Outra parte foi distribuída por Padilha para deputados como o "Caranguejo", o ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha, que, como se sabe, tinha também uma variedade de outras fontes de recursos ilícitos. Moreira Franco, segundo o delator, era coadjuvante na tarefa de arrecadação.

Como um dos maiores grupos empresariais do país e um papel central nos esquemas de corrupção, a Odebrecht se relacionava com quase todo o mundo político para favorecer seus negócios. A amostra fornecida por Cláudio é abrangente: envolve muitos partidos, os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), em uma relação de 48 políticos, a maioria deles em exercício.

Já chamuscado por 6 demissões de ministros em 6 meses, o governo Temer está encurralado pelos depoimentos que estão brotando da Lava-Jato. Eles tem o condão de desmoralizar uma administração cuja popularidade declina com rapidez. A mais recente pesquisa do Datafolha, encerrada antes de vir à tona a delação de Cláudio, revela que, entre julho e dezembro, disparou a parcela dos que julgam péssimo o governo Temer (de 31% para 51%) e caiu a dos que o classificavam regular (de 42% para 34%). Pelo menos 40% o consideram pior que o governo Dilma e 34%, igual a ele. Com políticos veteranos no núcleo decisório do Planalto, o governo partilha também da perda de prestígio advinda da completa derrocada moral do Congresso.

O sistema político apodreceu e no meio dele está um governo acuado por suspeitas e cuja impopularidade aumenta. O governo aposta no ativismo econômico para sair da defensiva, com medidas que atenuem efeitos de uma crise que, como a política, ainda vai longe.

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