- O Globo
Embora faça parte de sua estratégia de defesa, e insinue a possibilidade de anulação da delação do executivo da Odebrecht que o denunciou, o presidente Michel Temer fez bem em chamar a atenção da Procuradoria-Geral da República sobre a necessidade de dar celeridade aos processos envolvendo parlamentares na Lava-Jato.
A diferença de ritmo entre as decisões da primeira instância, especialmente da vara do juiz Sérgio Moro, e as do Supremo Tribunal Federal, que depende das investigações do Ministério Público, faz com que a percepção da sociedade seja a de que os políticos com foro privilegiado têm uma vantagem sobre aqueles que perderam essa proteção.
A verdade é que se trata apenas de uma questão de capacidade de atuação, já que o Supremo não está preparado para ser um tribunal penal, e trata de diversos outros temas também relevantes para a sociedade.
Recentemente, enquanto os processos da LavaJato se desenrolam, o Supremo, seja no plenário ou nas turmas, tem decidido questões como o aborto nos primeiros três meses de gravidez; a proibição da chamada “pílula do câncer”; o fim da desaposentação, com recálculo das aposentadorias; a negociação da dívida dos estados.
As varas federais que tratam da Lava-Jato, ao contrário, dedicam-se apenas aos casos da Lava-Jato, que só em Curitiba conta hoje com cerca de cem procuradores dedicados exclusivamente às delações premiadas. As dificuldades logísticas do Supremo para esse tipo de processo penal podem ser constatadas pelo que aconteceu com o mensalão.
O julgamento começou em 2 de agosto de 2012, depois de quase sete anos de tramitação no Supremo, com a solução de questões preliminares e a apresentação das teses de acusação e de defesa. A fase de condenações e absolvições começou em 16 de agosto e terminou só em dezembro. Dos 37 réus, 25 foram condenados, e 12, absolvidos. O julgamento ainda teve uma segunda parte, que só terminou em 2014.
Para conseguir encerrar o processo, o STF teve que se dedicar exclusivamente ao caso por praticamente cinco meses seguidos, e retomá-lo adiante, já com nova formação, para os chamados embargos infringentes, que livraram José Dirceu do crime de quadrilha.
A situação é tão grave, e a lentidão, tão flagrante, que o ministro do STF Luís Roberto Barroso já defendeu a extinção, ou pelo menos a redução, do foro privilegiado e a criação de uma vara especial em Brasília para julgar políticos com foro. Ela teria à frente um juiz escolhido pelo STF para centralizar as ações penais com um mandato de dois anos e auxiliares para ajudá-lo.
Enquanto nada disso acontece, os ministros do Supremo sentem-se na obrigação de dar explicações sobre a demora dos processos, como aconteceu no caso do julgamento do presidente do Senado, Renan Calheiros, que o tornou réu em uma denúncia de sete anos antes.
Vários ministros alegaram, em seus votos, que essa demora deveu-se às investigações do Ministério Público e da Polícia Federal, e outros criticaram o resultado das investigações, depois de tantos anos.
Em outro julgamento, o mais polêmico, quando resolveram que Renan poderia presidir o Senado, mas não faria parte da linha de substituição do presidente da República por ser réu, alguns dos ministros justificaram sua posição contrária à liminar do ministro Marco Aurélio devido à situação econômica do país, que necessitava de uma ação rápida do Congresso.
Avalizavam, assim, a importância de Renan Calheiros para a governabilidade do país. A crise econômica também foi usada pelo presidente Michel Temer ontem, quando enviou uma petição, apoiado pela Advocacia-Geral da União (AGU), para que os procedimentos sejam acelerados:
“Do ponto de vista do ente federal, portanto, o fracionado ou porventura lento desenrolar de referidos procedimentos pré-processuais, a supostamente envolver múltiplos agentes políticos, funciona como elemento perturbador de uma série de áreas de interesse da União. Isto, sobretudo, em um momento do processo legislativo marcado por propostas de reformas estabilizadoras, as quais possuem como objeto temas sensíveis à luz do cenário social e macroeconômico de médio e longo prazos”.
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