sexta-feira, 7 de fevereiro de 2025

Reforma sem rumo não conserta nada - Vera Magalhães

O Globo

Lula não sinaliza a aliados o que pretende com mudança em ministérios, nem qual será sua extensão

Ninguém sabe mais, ou ainda, qual será o escopo, o tamanho, o rumo e o objetivo da propalada reforma ministerial. De pouco adianta Lula dizer que é mania da imprensa ou dos políticos falar em reforma a cada início de ano. Foi ele que deflagrou a especulação sem saber ao certo o que pretende ao seu término — uma forma bastante errática de proceder, ainda mais com popularidade em baixa.

Pior que a incerteza quanto aos rumos da mexida no governo é a apatia do entorno do presidente — do Palácio aos ministérios mais distantes na Esplanada, do PT aos partidos do Centrão —, que, pela primeira vez neste mandato, demonstra preocupação com o risco de derrota em 2026 e admite que existe fadiga de material.

Não existe uma esperança real de que mudanças nas pastas possam fidelizar os partidos que hoje nominalmente integram a base de Lula. Será a avaliação do petista que contará, lá na reta final, para decidir quem pulará em cada canoa. Ela dependerá da economia, em primeiro lugar, mas também da capacidade de o presidente reconquistar parte do seu borogodó, um patrimônio gasto nos dois primeiros anos, sobretudo no espectro que votou nele com base no discurso da frente ampla.

O diagnóstico, desta vez, não é meu. Foi feito, em maior ou menor grau, por ministros e parlamentares de diversos matizes, mas todos eles aliados de Lula. O tripé descrito por Sidônio Palmeira em sua exposição na reunião ministerial do começo do ano — comunicação, gestão e política — está com as três pernas bambas. Por ora, Lula só mexeu na primeira, e o case do boné, nesta semana, parece ter dado algum ânimo aos aliados para pelo menos tirar uma onda por ter deixado a extrema direita baratinada pela primeira vez em muito tempo

Mas, se a gestão não andar e a política não fizer sua parte, não será com base em sacadas para as redes sociais que Lula recomporá sua imagem, eles mesmos sabem.

A gestão está atada ao titular da Casa Civil, Rui Costa, que encarna o maior paradoxo do mandato Lula 3: goza, aparentemente, de plena confiança do chefe, mas é praticamente unanimidade negativa entre seus colegas, que antes mesmo de servirem água e café aos visitantes se põem a falar mal de quem deveria coordenar o governo e nem sequer responde a suas ligações e os deixa plantados em reuniões de que sai sem se despedir, para não falar das propostas que deixa tomando poeira em sua gaveta.

A política está com seu destino atrelado à novela das emendas parlamentares, e Lula não dispõe de instrumentos para resolvê-lo sem desatar esse nó. Dependerá da capacidade de os três Poderes chegarem a um denominador comum, mas ninguém acredita que o Executivo conseguirá, com o Supremo, com tudo, fazer com que o naco do Orçamento nas mãos do Congresso seja reduzido. Pode, no máximo, conseguir desembaçar um pouco o vidro para dar à destinação dos recursos alguma transparência. E, quiçá, convencer deputados e senadores a aplicar parte do dinheiro nos seus projetos estruturantes.

Para que reforma, então, nesse cenário em que os movimentos são tão limitados? Isso ninguém, por mais próximo de Lula que seja, sabe responder. Porque ele mesmo ainda não deixou claro o que pretende. Trocar a articulação política por alguém do PT ou do Centrão é uma possibilidade, mas sem garantia de sucesso.

A Saúde — em qualquer diagnóstico sério de desempenho do tripé comunicação, gestão e política — teria de ser o primeiro ministério a ser consertado, até porque o fracasso nessa área que mexe literalmente com a vida de todos pode custar a reeleição. Mas ninguém sabe se Lula insistirá, sabe-se lá por quê, em manter Nísia Trindade, que é seriíssima e tem biografia a toda prova, mas não deu certo na função.

Com esse grau de improviso e falta de rumo, a reforma pode resultar apenas na troca de seis por meia dúzia ou, pior, quatro ou cinco.

 

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