sexta-feira, 7 de fevereiro de 2025

Soberania - Laura Karpuska

O Estado de S. Paulo

O que Trump propõe é um mundo onde as instituições são descartáveis

Nesta semana, colegas economistas calcularam o impacto das tarifas impostas pelo governo Trump a alguns parceiros comerciais dos Estados Unidos. Os números são, claro, alarmantes. Trump voltou atrás, e muitos comemoraram. Mas a conta ignora o mais importante. O discurso de Trump vai além de um mundo menos livre e interconectado. Não se trata apenas de um retrocesso ao liberalismo econômico. É uma ameaça à soberania das nações.

Trump tem adotado uma postura expansionista em relação a outros territórios. Já sugeriu anexar o Canadá, comprara Groenlândia e agora fala abertamente sobre os Estados Unidos “assumirem o controle” da Faixa de Gaza. São declarações que desafiam não apenas normas diplomáticas, mas a própria lógica da soberania como princípio organizador da política internacional.

A soberania, nesse caso, não é só sobre fronteiras. É sobre a capacidade de um país manter as regras do jogo político e econômico. O que está em risco não é apenas a autonomia territorial, mas uma credibilidade institucional.

Momentos de crise como o que vivemos em 2008 e com a pandemia deixam sociedades mais vulneráveis. Quando as instituições falham em estabilizar um país, os efeitos não se limitam a alguns pontos a menos no PIB. Criam um ambiente de incerteza que não passa quando a crise fiscal ou comercial é resolvida. Trump sabe disso e usa a instabilidade como método.

O uso do governo como arma política, a corrosão das regras democráticas e a disposição de desafiar limites antes considerados inquebráveis fazem parte de um projeto maior: um país onde o poder se impõe pela força, não pelas instituições. Martin Wolf fez uma análise interessante. Os Estados Unidos, sob Trump, podem caminhar para um modelo em que a soberania deixa de ser um pacto entre governo e sociedade e se torna um exercício de dominação.

Larry Summers, ex-secretário do Tesouro, faz um alerta semelhante: a agenda econômica de Trump não apenas ameaça o crescimento no curto prazo, mas pode reverter décadas de credibilidade dos EUA no cenário global. Ele sugere que o desmonte institucional promovido por Trump tornaria os EUA não apenas um país economicamente mais frágil, mas politicamente menos confiável – um golpe na soberania entendida como estabilidade e previsibilidade.

O impacto econômico das tarifas é mensurável. Já as consequências de relativizar a soberania alheia são menos visíveis, mas potencialmente mais profundas e ameaçam o próprio posicionamento americano no mundo. O que Trump propõe é um mundo onde as instituições são descartáveis, onde o caos é um recurso e onde a soberania, como conceito, perde significado.

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