O Globo
O PIB do primeiro tri virá forte, mas a
desaceleração da economia é inevitável diante da escalada de aumento de juros
O primeiro trimestre vai ter um crescimento
forte, e o país vai ficar com a impressão de que os juros altíssimos não estão
fazendo efeito. O Banco
Central informou ontem que, pelas suas contas, o PIB do
primeiro trimestre ficou em 1,3%. O Monitor da FGV calcula 1,6%. Mas os bancos
projetam que o número a ser divulgado pelo IBGE será muito maior.
O Bradesco estima o PIB no primeiro trimestre será 1,8%, contra o último tri do ano passado. A avaliação do banco é que será um PIB puxado pelo agro que está colhendo uma supersafra, mas também pelo consumo. Isso, contudo, não significa que os juros deixaram de desacelerar a economia. A avaliação que se tem no banco é de que o aumento do setor do agro será todo capturado no dado do primeiro trimestre e que o consumo tende a aparecer em desaceleração nos meses seguintes.
Alguns bancos e consultorias estão revendo
para cima o crescimento do ano, diante dos dados bons do primeiro trimestre. A
MB Associados, por exemplo, elevou a previsão do PIB do ano de 1,8% para 2,2%.
— Foi um trimestre forte e não foi só a
agricultura, está forte no conjunto. O próprio Banco Central mostra que a renda
das famílias está crescendo firme em termos reais, tanto pelo emprego e renda,
quanto pelas transferências governamentais — explica o economista José Roberto
Mendonça de Barros.
Roberto Padovani, economista-chefe do BV,
disse que os dados, como o IBC-Br, estão mostrando que não
se trata apenas do efeito da produção da agropecuária do começo do ano.
— Estamos tendo uma safra recorde, é fato,
mas o resultado mostra também o efeito da renda. O Brasil tem desemprego muito
baixo, programas sociais bastante elevados e isso tudo está atenuando o impacto
da alta dos juros sobre o mercado de crédito. Temos uma economia com renda, com
setor exportador dinâmico, mostrando uma força muito importante nesse início de
ano que acaba contaminando as projeções para o ano.
A economista Juliana Trece, coordenadora do
Monitor do PIB da FGV, disse que o forte crescimento detectado por eles no
primeiro trimestre, de 1,6%, é liderado pela agricultura, sobretudo pela soja.
Mas diz que o resultado foi mais disseminado do que se esperava. O setor de
serviços cresceu 1,3%. Cresceram o consumo das famílias, investimento, consumo
do governo e exportações. Mas, para os próximos trimestres, ela prevê
desaceleração da economia.
Será inevitável. O país enfrentou um choque
de juros. As taxas subiram de 10,5% para 14,75% em seis reuniões, desde
setembro do ano passado. Essa escalada afetará sem dúvida a economia, mas José
Roberto Mendonça de Barros explica que atingirá primeiro as empresas, depois as
famílias.
— Depois, tudo se iguala, mas num primeiro
momento os juros afetam as empresas porque tomaram muito dinheiro emprestado
nesses últimos três anos no mercado de capitais. O passivo das empresas está
carregado de debêntures e papéis semelhantes, que são corrigidos, de uma forma
ou de outra, pela Selic. Quando aumenta a taxa, o impacto é imediato em cima
das empresas.
As consequências só serão sentidas no momento
da rolagem das dívidas, o que faz com que o efeito da política monetária leve
pelo menos três meses para se materializar. O problema é que, ao recorrerem a
esses papéis, muitas companhias acabaram ficando mais alavancadas. Há exemplos
no setor produtivo de negócios sólidos que ampliaram seu endividamento para
viabilizar projetos específicos e, agora, estão sendo forçados a vender ativos.
O balanço do Banco do
Brasil, segundo Mendonça de Barros, mostra um pouco o efeito disso.
— Veio fraquíssimo. O Banco do Brasil tem uma
proporção muito grande de empresas em recuperação judicial na agricultura. Não
é a média do sistema bancário, mas mostra como o número crescente de
recuperações judiciais decorre da alta de juros que já está nocauteando muitas
empresas — explica.
A desaceleração virá e, num segundo momento,
afetará a renda das famílias. Para entender como está sendo esse ano é preciso
ir além dos números brilhantes desse primeiro semestre, que ficarão evidentes
quando o IBGE divulgar o PIB no próximo dia 30. Já está ocorrendo uma
desaceleração. Os bancos estão revendo para cima o crescimento do ano, mas a
política monetária apertada está piorando as condições de crédito das empresas
e das famílias. Não se passa incólume por um aumento de mais de quatro pontos
percentuais na taxa de juros.
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