domingo, 6 de julho de 2025

O fantasma de Trump sobre os Brics - Eliane Cantanhêde

O Estado de S. Paulo

O que se espera de Lula nos Brics: pragmatismo, equilíbrio e discurso lido, sem improvisos

Segundo o presidente Lula, ao lado do trumpista Javier Milei, na Cúpula do Mercosul, “a Ásia (não os EUA...) é o centro dinâmico da economia mundial”. Foi uma senha para o que está em jogo numa cúpula muito mais poderosa, a dos Brics, que começa hoje no Rio de Janeiro e reúne oito países asiáticos, a começar da China e da Rússia e, para piorar, o Irã, o que empurra o foco da reunião para o “outro lado”, Estados Unidos e Israel. Com o presidente de Cuba, Miguel Diaz Canel, presente...

As questões temáticas são razoavelmente consensuais: valor monetário dos dados da IA, “saúde dos pobres” (problema comum a todos) e responsabilidade dos países ricos sobre a sustentabilidade ambiental dos não tanto. Até nelas, porém, o alvo continua sendo Donald Trump que, por exemplo, suspendeu recursos para a saúde dos próprios americanos, asfixiou a USAID, braço dos EUA para ajuda humanitária, e rompeu com o Acordo de Paris. De quebra, reativou todas as sanções contra Cuba.

A ausência de Xi Jinping e Vladimir Putin (que entrará por vídeo) tem dois lados. Se esvazia o peso da Cúpula – e da foto -, alivia a tensão no grupo e a pressão sobre Brasil e Lula. O Brics, que criticou a invasão de Israel e dos EUA no Irã, agora quer mais: uma condenação contundente, com citação explícita aos dois países, o que não convém nem aos interesses do bloco, nem aos de cada país. Um documento final assim teria, ou terá, consequências graves e duradouras

O chanceler iraniano, Abbas Araghchi, chegou ao Rio trazendo na mala a velha negação do

Estado de Israel, renovada com os ataques de Netanyahu e depois de Trump a suas usinas de enriquecimento de urânio. Mas, do outro lado, Índia, Egito, Etiópia, Emirados Árabes Unidos e Arábia Saudita não querem confusão com os EUA. O Brasil está no grupo que atua para equilibrar – e amenizar – uma posição final.

Lula também receberá em Brasília, em visitas separadas, Narendra Modi, da Índia, e Prabowo Subianto, da Indonésia. A Índia passou a China como maior população mundial, quase 2,5 bilhões de habitantes, e a Indonésia tem 280 milhões.

A Índia é top em tecnologia, na área farmacêutica e em medicamentos genéricos e a Indonésia, com poderosas florestas tropicais e o foco nas energias renováveis, deve ter destaque na COP 30.

Além de driblar as pressões do Irã e calibrar o tom contra EUA e Israel, o desafio de Lula será deixar de lado os improvisos e ler os textos dos profissionais. Quem banca a política externa é o presidente, mas quem entende do recado é a diplomacia. Ainda mais num momento delicado – e explosivo – dentro e fora do Brasil.

 

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