domingo, 6 de julho de 2025

A política cede lugar ao Supremo – Dora Kramer

Folha de S. Paulo

Fracassam os políticos quando não conseguem resolver suas questões na seara da delegação popular

Situações muito mais complicadas que a agora posta no Supremo Tribunal Federal para decidir sobre a constitucionalidade de ações do Executivo e do Legislativo já foram resolvidas no país pela via da política.

Foi assim na transição democrática, na sucessão de Tancredo Neves após cair doente na véspera da posse, nos embates na Assembleia Constituinte e nos processos de impeachment de dois presidentes. Isso para citar exemplos mais recentes e eloquentes em que os donos de delegação popular souberam vencer obstáculos e resolver seus impasses sem ferir protocolos oficiais.

Esse caminho hoje se mostra interditado e um tanto deformado quando o Judiciário para todos os efeitos se põe como poder moderador sem que a ordem vigente lhe confira tal papel.

Na decisão sobre um decreto presidencial derrubado pelo Congresso, caberia ao STF dizer quem está certo à luz da Carta de 1988 e nada mais. Sairia com a razão aquele que tivesse atuado na conformidade da lei.

Como disse o ministro Flávio Dino, uma demanda jurídica a ser resolvida "em cinco minutos". Talvez um pouco mais, dada a complexidade do tema. A questão, no entanto, é de natureza política, conforme acrescentou o magistrado do alto de sua experiência nas duas searas.

A audiência de conciliação convocada pelo relator do caso, ministro Alexandre de Moraes, parece, em tese, uma boa solução e assim foi recebida pelas partes. Na prática, porém, expõe a incapacidade dos políticos em exercerem sua atividade fim: a de construir consensos em meio ao dissenso.

Essa responsabilidade, uma prerrogativa nobre conferida pelo voto, fica assim transferida para o Supremo no ápice da judicialização da qual tanto reclamam e à qual querem impor limites mediante atalhos improvisados.

Isso não resolve o problema do ruído institucional em que se encontram os três Poderes, cuja tarefa primordial não é se acertarem em arranjos de ocasião, mas rever procedimentos a fim de enquadrarem nas respectivas funções.

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