Brasil 247
A mudança de posição do governo é sempre bem-vinda. Antes tarde do que mais tarde, entendemos que em sistemas polarizados ganha quem for mais para os extremos
A mudança de posição do governo é sempre
bem-vinda. Antes tarde do que mais tarde, entendemos que em sistemas
polarizados ganha quem for mais para os extremos. Antagonizar com um parlamento
débil é a certeza de retomar o apoio da esquerda e colocar a bola da dúvida na
quadra do bolsonarismo: vão execrar este Congresso que eles elegeram (ainda que
a contragosto pois são claramente anti-democracia)? Ou os bolsonaristas vão se
postar como defensores de Motta e Alcolumbre e destruírem seu discurso “anti
sistema”?
A comunicação de guerra é o caminho para a
eleição de 2026. A direita faz, o centrão faz e agora a esquerda cansou de ser
“boazinha”.
Porém, há que se discutir outras coisas. A sociedade capitalista somente funciona com “incentivos” para ações se queiram repetir. O tal “presidencialismo de coalizão” (que não existe mais) existia quando o executivo premiava o legislativo por ser confiável. Votou com Fernando Henrique Cardoso, leva a “emenda” estabelecida. Isso não existe mais. Desde Cunha, passado por Lyra e com a anuência do fraco Bolsonaro, o Congresso tomou de assalto o orçamento e se desligou completamente das responsabilidades de governar. Como a mídia aceitou e achou que seria um bom momento para colocar todas as culpas no presidente Lula, era o plano perfeito.
Não é segredo para ninguém que a democracia
brasileira é frágil, para dizer o mínimo. Inicia a República com um golpe
militar contra a família real, depois um golpe dos militares sobre os
cafeicultores, seguido por um golpe dos cafeicultores sobre os militares para
instaurar a República do Café com Leite. Segue-se um golpe de Vargas contra os
cafeicultores e um novo golpe militar contra Vargas. E vamos de golpes em
golpes – com o povo ausente – até os militares cansarem dos golpes e ficarem no
poder golpeado por 21 anos. Sempre houve o acordo conservador do “boi”
(latifundiários), “bala” (forças armadas e detentores de armas) e “bíblia” (a
política baseada na fé) na política brasileira como forma de afastar qualquer
traço de democracia. O atual Congresso é só a expressão mais recente deste
tacanho e histórico modo de fazer política no Brasil.
Lula foi convidado em 2022 a fazer parte
desse acordo. Como um “encantador de massas” que tinha a função de dar
migalhas, o presidente foi convidado a fazer parte deste teatro constitucional
de um semi-presidencialismo de fato. Tivesse concordado e a função do
presidente seria manter juros altos, manter as remessas de dinheiro público
para as elites (via plano safra, benefícios de impostos a empresários e não
mexer na tabela do IR) e controlar os “radicais do PT”, como o presidente
mencionou no discurso dos 100 dias. Uma parte odiosa do próprio partido aceitou
esse trato. Subiu os juros, criminalizou as partes do partido que ousavam
questionar e deram discursos defendo a “guinada ao centro” do PT.
Estava tudo arrumado para a morte
institucional do partido. E isso com ajuda imensa de muita gente dentro do
partido. As lógicas paroquiais de manutenção eterna em cargos, as indicações
para vagas dentro e fora do partido via clientelismo e um afastamento tanto do
partido de suas bases, como do governo do presidente Lula do povo que votou
nele.
Dois anos e meio desta proposta na mesa e
parece que o presidente resolveu rechaçá-la de fato. Agora falta acabar com o
achaque que o agronegócio, historicamente, faz sobre o dinheiro público. O
plano safra funciona até hoje a partir de documentos infralegais como decretos
e portarias. A principal lei que menciona um “plano” de dinheiro público para o
agronegócio é a lei 8171 de 1991. Em 1991, o agronegócio cobrou um resgate para
entregar a democracia de volta ao país e se afastar dos militares. Mas isso desde
que ficasse gravado na legislação brasileira a OBRIGAÇÃO de o povo sustentar um
conjunto de herdeiros de terras com juros subsidiados na ordem de 10% ao ano. É
disso que se trata. Um valor que o povo paga para que “agro” (que se diz
trabalhador e produtivo) possa pegar juro subsidiado para comprar apartamentos,
carros de luxo e pagar campanhas de deputados e senadores. Se o juro da Selic é
15% e o agro pega empréstimos – em bancos públicos – com taxas que variam de
1,4 a 3,5% ao ano, isso significa que é o povo brasileiro que é dono das
pick-ups e os apartamentos de elite que esse grupo sempre ostenta.
O fato é que ao se aliar aos golpistas de Bolsonaro o agro rompeu com esse acordo de pagamento de resgate pela democracia brasileira. Os sequestradores de 64 se uniram novamente e atacaram a democracia. E agora precisam pagar o preço do acordo desfeito. Já era absurdo sermos eternamente chantageados por militares e latifundiários dentro do nosso país. Contudo, ver o acordo ser quebrado, nossa democracia defendia por um fio e ainda manter todo o orçamento direcionado para manter a riqueza desses grupos e o dinheiro para campanhas políticas conservadoras é demais.
O presidente Lula (ou foi a ministra Gleisi?)
disse que chega. Passaram dos limites. E quando as elites viram o filho de
Garanhuns levantar as ruas já convocaram o eterno pelego do judiciário (STF)
para “mediar” as costas do povo com o chicote das elites. Mais uma vez o
tribunal não decide, mas negocia direitos com os abusadores deles para manter
seus espaços de poder. Se é verdade que estamos atacando um pacto de poder
perverso e histórico ao colocar o legislativo no seu lugar, também é verdade
que todas as engrenagens conservadoras que nos esfolam diariamente começam a se
colocar em movimento.
Que o presidente não recue. Que não se deixe prender novamente por essa política mesquinha. Que use as ruas, ávidas por seguir um líder transformador. Que lula pavimente sua eleição de 2026 agora. Nenhum outro brasileiro pode fazer isso. Parece que a hora das ruas voltou. É hora de terminar com as boquinhas do plano safra para latifundiários
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