domingo, 11 de novembro de 2012

Michel Zaidan: "PT passa, no máximo, por uma transição"

Ana Lúcia Andrade

Coordenador do mestrado de Ciência Política da UFPE, Michel Zaidan monitora um núcleo que estuda o "PT: pensamento e prática". Diante desse sopro de bons ventos que, para alguns, arrastam o partido para uma renovação de lideranças ao ponto de indicar o surgimento de um "outro" PT, Zaidan pede menos: "Há no máximo uma transição. É mais um desejo do que uma realidade. Mas é uma necessidade". Para ele, a vitória em São Paulo por si só não garante a renovação do PT, tampouco "anula o desgaste político da legenda, principalmente em relação à moralidade administrativa". Em entrevista ao JC, Michel Zaidan também avalia o PT pós-eleição em Pernambuco. Acredita que "será muito difícil o PT levantar a cabeça depois da cacetada que levou do PSB".

JC - Está surgindo um novo PT?

MICHEL ZAIDAN - Isso é uma coisa tendenciosa. Não tem nada de novo. Há no máximo uma transição. O PT foi avaliado nas eleições e perdeu em capitais importantes. A avaliação foi da gestão petista. A conquista da Prefeitura de São Paulo não anula o desgaste político do PT e as derrotas que sofreu, sobretudo em razão das fissuras nas alianças que garantem ao PT vitória no Nordeste, por exemplo. O PT tem problemas no Sul e no Norte. Há um ufanismo no sentido de esconder que o PT sai arranhado dessa eleição e não é mais o mesmo de quando Lula se elegeu. Carrega consigo um desgaste político tanto da forma de gestão quanto em relação à moralidade administrativa.

JC - Nem a presidente Dilma Rousseff dá uma nova feição ao PT?

ZAIDAN - Ela está imunizada em relação ao desgaste do PT por causa da economia. Graças ao uso de um fundo público que alavanca a economia numa situação de crise internacional. Mas isso tem limites. Recursos do BNDES subsidiam crédito ao consumidor numa redução unilateral de impostos que prejudica Estados e municípios. É fazer cortesia com o chapéu alheio. Curiosamente, o PT vem se identificando muito com o núcleo duro dessa política. O que estamos assistindo no Brasil é uma bolha, que não se sabe quanto tempo vai durar, não só especulativa mas de consumo, e apoiada em fundos públicos. Se a economia reagir, a reeleição de Dilma está garantida. Mas se começarem o desemprego, a perda de renda, o endividamento, a inadimplência, a inflação, o déficit fiscal, haverá muitos candidatos de oposição.

JC - Só a eleição de Fernando Haddad (SP) não traduz essa renovação no PT?

ZAIDAN - Haddad não é do ramo da política. É um professor de Ciência Política da USP que foi levado às administrações do PT. Mas ele por si só não garante a renovação. A vitória de Haddad se deu pelo apoio do PMDB, de Kassab, de Maluf, dos evangélicos e da alta rejeição a Serra. Quais são os outros nomes para se falar em renovação? Ela é mais um desejo do que uma realidade. Agora é uma necessidade.

JC - A opção de Lula por Dilma e Haddad, que são técnicos, não é um esforço para renovar o PT?

ZAIDAN - A questão é o que fará Haddad na Prefeitura de São Paulo. Porque a aliança que o elegeu é de natureza eminentemente fisiológica e não terá repercussão só na prefeitura, mas no ministério de Dilma. Kassab, o PMDB e outros, todos querem espaço no governo. Será que ela terá capacidade de administrar? E de Haddad nem se fala. A quantidade de partidos da base de seu governo é muito grande, é de velhas raposas que vão cobrar a fatura. Ou ele pensa que os partidos o apoiaram em troco de nada? De tornar o PT uma força hegemônica em São Paulo, que nunca foi, diga-se de passagem? Há um preço muito alto por essa eleição e Haddad.

JC - E em Pernambuco, qual o destino do PT?

ZAIDAN - Aqui se comprovou a tese que todos sabiam: não há terceira via. Ou é um lado ou outro. O PT tentou ser essa nova força e levou uma cacetada do PSB. Vai ser muito difícil levantar a cabeça. O PSB montou um cenário de longa data, de uma política oligárquica, daquela política ‘ou é comigo ou é contra mim’. Ser oposição aqui é muito difícil e o PT deve se compor com o PSB e esperar pelas alianças de 2014. Uma aliança com Armando Monteiro é uma possibilidade. Dificilmente Eduardo cede a cabeça de chapa ao PT, ao PTB... Ele está mandando no jogo.

JC - Quem pode conduzir o partido daqui pra frente?

ZAIDAN - Quem poderia capitanear seria João da Costa, que está a cavaleiro para mostrar que tinha razão. Ele está com condições de responsabilizar Humberto e João Paulo pela derrota do PT. E não ter saído do partido foi muito importante porque ele não rompe, não dá uma de herege, de que porque não foi candidato deixou o PT pra lá, e pode dizer: ‘Está vendo? Fizeram o que fizeram e conduziram o PT à derrota’. E uma derrota muito feia. Abaixo de Daniel Coelho, que nunca havia disputado um cargo majoritário.

JC - Se Lula tivesse interferido, se dedicado mais, o resultado teria sido outro?

ZAIDAN - Lula deu prioridade a São Paulo e Belo Horizonte (aqui perdeu). Viu a posição de seu importante aliado, Eduardo Campos, e fez um acordo: Eduardo apoiar Haddad em São Paulo e ele não se envolver com Recife. Humberto foi abandonado à própria sorte. Estimulado a ser candidato, mesmo rachando o PT. Teve um desempenho pífio que o forçará a pensar muito sobre o futuro. Junto com João Paulo. Aliás, muita gente dentro do PT reprovou essa chapa de adversários históricos. Não convencia. Soou eleitoreiro. Se João Paulo queria disputar por que não saiu candidato? O grande erro do PT foi o de não ter marchado unido com qualquer candidato. Foi para uma disputa desigual, com o partido quebrado e as pessoas se atirando entre si. A derrota do PT antes de ser externa foi interna. Quem se saiu bem foi Daniel Coelho. Mas se não souber administrar bem os votos que recebeu vai virar uma Marina Silva: perder tudo. Porque esses votos não são dele. São dos que não queriam votam em Humberto, em Mendonça e em Geraldo. São votos voláteis. Não estão de jeito nenhum cristalizados.

Fonte: Jornal do Commercio (PE)

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