Condenando a mais de 40 anos de prisão, operador do mensalão
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Jailton de Carvalho
BRASÍLIA - O
Programa Federal de Assistência a Vítimas e a Testemunhas Ameaçadas, vinculado
à Secretaria Nacional de Direitos Humanos, está de portas fechadas para Marcos
Valério, mesmo que ele decida colaborar com investigações de casos conexos ao
processo do mensalão. Dirigentes do programa informam que a lei 9.807 impede a
entrada de pessoas condenadas no sistema de proteção.
Valério já foi condenado a 40
anos e seis meses de prisão no julgamento em curso no Supremo Tribunal Federal
(STF). Nas últimas semanas, surgiram rumores de que ele estaria disposto a
colaborar mais com as investigações sobre ex-dirigentes do PT e até mesmo se
submeter às regras do programa de proteção a testemunha.
O advogado Marcelo Leonardo nega
que Valério tenha interesse no programa. Disse que o cliente não cogita essa
possibilidade. Mas nada diz sobre a suposta iniciativa do cliente de fazer
novas denúncias contra ex-dirigentes do PT e contra o ex-presidente Lula. A
Secretaria de Direitos Humanos informou que casos de réus condenados, como de
Valério, estão vedados pela lei 9.807, que originou o programa.
“Estão excluídos da proteção os
indivíduos cuja personalidade ou conduta seja incompatível com as restrições de
comportamento exigidas pelo programa, os condenados que estejam cumprindo pena
e os indiciados ou acusados sob prisão cautelar em qualquer de suas
modalidades. Tal exclusão não trará prejuízo a eventual prestação de medidas de
preservação da integridade física desses indivíduos por parte dos órgãos de
segurança pública”, diz um trecho do artigo 2º da lei. A entrada de Valério
estaria, então, vedada porque ele já foi condenado no mensalão.
Para um ministro do STF, a
inclusão de Valério poderia até ser discutida em relação a outros casos, não o
do mensalão, em fase final de julgamento.
— Há outros processos em que ele
pode vir a colaborar — disse o ministro.
PGR: não há motivos para
proteção
O procurador-geral da República,
Roberto Gurgel, disse não ver motivos para oferecer proteção especial a
Valério. Ele não teria feito nenhuma revelação que tenha colocado sua vida em
risco.
O advogado de Valério disse,
porém, que a expectativa de seu cliente está relacionada à redução da pena pela
colaboração que teria dado no início das investigações do mensalão, em 2005, e
não no programa de proteção a testemunhas.
— São coisas diferentes:
proteção a testemunhas e réu colaborador. Ele nunca cogitou disso (programa de
proteção) — disse Marcelo Leonardo.
O programa de proteção a
testemunhas às vezes parece atraente para testemunhas sob investigação, mas nem
sempre os interessados se ajustam às normas do serviço. Alguns desistem antes
de formalizar a entrada no programa. Um dos casos mais notórios de desistência
é do caseiro Francenildo Santos Costa, que teve o sigilo bancário violado por
ex-auxiliares do então ministro da Fazenda, Antonio Palocci.
Francenildo, após preencher uma
ficha e fornecer cópias de documentos pessoais, mudou de ideia, ao ser
informado sobre algumas normas, como não dar entrevistas ou aparecer em
público. Naquele período, em 2006, o caseiro queria prestar depoimento contra
Palocci na CPI dos Bingos e cancelou o ingresso no programa.
O ex-secretário de Assuntos
Institucionais do Distrito Federal Durval Barbosa, delator do mensalão do DEM,
também rejeitou o programa, porém, pelo alto valor das revelações que fez teve
um tratamento diferenciado. Em 2009, Barbosa causou um terremoto político na
capital federal com denúncias contra o então governador José Roberto Arruda e
boa parte dos deputados da Câmara Legislativa. Arruda foi preso e perdeu o
mandato. O ex-vice-governador Paulo Octávio também deixou o governo por conta
das acusações.
As denúncias resultaram na perda
do mandato de três deputados distritais. Interessado nas informações do
ex-secretário, o Ministério Público Federal encontrou uma fórmula para mantê-lo
em permanente colaboração e protegido da ira dos réus atingidos pelas
investigações: Barbosa tem proteção policial e algumas restrições na vida
social. Mas não precisou trocar de identidade ou mudar de cidade, caso de
algumas testemunhas com elevado risco de morrer.
Fonte: O Globo
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