quinta-feira, 15 de outubro de 2015

Dilma descarta guinada na economia para agradar esquerdas

Por Leandra Peres e Fernando Exman - Valor Econômico

BRASÍLIA - Enquanto busca reduzir os riscos de enfrentar um processo de impeachment e ao mesmo tempo ajustar a economia, a presidente Dilma Rousseff equilibra o discurso em suas aparições públicas e entrevistas. De um lado, acena para as bases eleitorais históricas do PT. Em contrapartida, esforça-se para manter firme a mensagem ao mercado de que permanece em busca do reequilíbrio fiscal, numa travessia que visa reativar a economia doméstica.

Nos últimos dias, investidores estrangeiros que circularam por Brasília para avaliar o momento político e conversar com autoridades da equipe econômica demonstraram a interlocutores a preocupação com o risco de Dilma radicalizar e dar uma guinada em seu governo à esquerda. O receio aumentou depois do discurso de Dilma anteontem na solenidade de abertura do 12º Congresso Nacional da Central Única dos Trabalhadores (CUT), no qual a presidente da República intensificou as críticas em relação ao que considera "golpismo escancarado". A presidente aumentou o tom ontem, ao falar para trabalhadores rurais.

Dilma, porém, deve manter o discurso de que não haverá nenhuma mudança de rota na condução da política econômica, embora no Ministério da Fazenda a percepção seja de que o governo poderia fazer mais para reequilibrar a economia. Começando pela votação dos vetos presidenciais, por entender que se trata de um sinal importante de apoio do Congresso à política econômica, o que tem poder de reduzir as ambiguidades que têm sido citadas à exaustão pelo ministro Joaquim Levy. A avaliação no Planalto, porém, é que o Executivo faz hoje o possível para recuperar o equilíbrio fiscal e reaproximar-se de sua base eleitoral com o discurso político.

A explicação que prevalece no momento é que os projetos importantes para o ajuste, apesar do discurso contrário do ex-presidente Lula, dependem primeiro de uma reorganização da base de apoio do governo no Congresso para que se possa levar adiante as votações.

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de suspender o rito de tramitação do impeachment deu tempo político ao governo, mas não será suficiente para destravar a pauta econômica. "É um cabo de guerra. Realmente difícil dizer [para que rumo vão as medidas do ajuste fiscal]", diz esta autoridade.

Os recorrentes ataques do ex-presidente Lula à política econômica capitaneada pelo ministro Levy devem ser interpretados, segundo autoridades do governo, como parte do jogo político do impeachment. Um diagnóstico parecido vem de interlocutores próximos ao próprio Levy.

Uma autoridade com trânsito no Palácio do Planalto explica que há um consenso no governo de que é preciso mudar o discurso econômico. Não se trataria, neste momento, de uma guinada ou de desistir do "remédio amargo". Apenas não falar em remédio amargo, ajuste, uma estratégia de falar de crescimento e vender coisas boas, quando o cenário é muito ruim. Lula sabe, segundo esse interlocutor, que as medidas de Levy são necessárias. Há algum reconhecimento no governo de que o ministro tem feito algum esforço para construir um discurso mais positivo, que olha para o futuro e dá menos ênfase à dureza da travessia.

O discurso do ministro da Casa Civil, Jaques Wagner, seria hoje o melhor termômetro do que realmente pensa o ex-presidente Lula. No dia em que tomou posse, Wagner disse que o ajuste fiscal é uma decisão de governo, que trabalhará para que seja aprovado e que, portanto, não há o que discutir. O necessário é falar de crescimento e retomada da economia.

No círculo mais próximo ao ministro da Fazenda a percepção é que os ataques de Lula "fazem parte do script" e que "o PT não pode aceitar ajuste fiscal". Os torpedos do ex-presidente, portanto, seriam tentativas de manter coesa a base política petista e não deixar que o governo seja também abandonado pelos movimentos sindicais e sociais que tradicionalmente apoiam o partido. Ninguém fala, no entanto, que cada vez que Lula critica a política econômica enfraquece Levy e a adesão da base às votações. O plenário vazio que o ministro enfrentou ontem na Câmara é um dos sinais.

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