Por Juliano Basile e Maíra Magro - Valor Econômico
BRASÍLIA - É bastante desfavorável o ambiente no Supremo Tribunal Federal (STF) para o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), fato que, indiretamente, beneficia a presidente Dilma Rousseff na luta contra um processo de impeachment.
Integrantes da Corte relataram a interlocutores que se sentiram desconfortáveis com tentativas de Cunha de ameaçar a Casa para tentar obter decisões favoráveis a suas teses. Em evento da Marinha, o deputado teria advertido o presidente do Supremo, Ricardo Lewandowski, de que o Judiciário poderia ser alvo de uma "pauta bomba" caso a ministra Rosa Weber suspendesse a votação que aprovou o financiamento privado de campanhas eleitorais.
O presidente da Câmara também teria agendado audiências de última hora com ministros do STF, uma prática pouco comum no Tribunal, e utilizado o cargo para fazer sua defesa pessoal contra as investigações da Operação Lava-Jato e questionar o procurador-geral da República, Rodrigo Janot.
Ministros do STF, segundo apurou o Valor, entendem que Cunha não tem "estatura moral" para dar andamento ao impeachment, já que sofreu denúncia formal por cobrança de propina em contratos da Petrobras, além de ter sido citado como titular de contas na Suíça, o que deve levar a nova investigação.
A tendência do Supremo é manter as liminares, concedidas na terça-feira, que derrubaram o procedimento definido por Cunha para a tramitação dos processos de impeachment na Câmara. Mais do que um entendimento dos ministros Teori Zavascki e Rosa Weber, responsáveis pelas liminares, as decisões representam uma visão coesa do Supremo. Desta forma, qualquer recurso de Cunha dificilmente será acolhido pelo plenário.
A maioria dos ministros do STF entende que o impeachment é uma questão de impacto muito forte para ser definida por um único parlamentar ou mesmo pelo Regimento Interno da Câmara. O caminho legalmente mais correto seria a aprovação de uma lei específica sobre o tema.
STF deve derrubar rito de Cunha para impeachment
A tendência do Supremo Tribunal Federal (STF) é de manter as liminares emitidas na terça-feira pelos ministros Teori Zavascki e Rosa Weber, derrubando o manual definido pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), para tramitação dos processos de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff.
Em conversas reservadas, Rosa e Zavascki compartilharam opinião sobre o assunto antes de dar as liminares, publicadas rapidamente e com as mesmas conclusões. As decisões representam, mais que um entendimento provisório dos dois ministros, uma visão coesa do próprio Supremo. Assim, qualquer recurso do presidente da Câmara será dificilmente aceito pelo plenário.
A maioria dos integrantes do STF entende que o impeachment é uma questão de impacto grande demais para ser definida individualmente por um parlamentar, ou mesmo pelo Regimento Interno da Câmara. A via correta seria uma lei especial sobre o tema, aprovada pelo Congresso.
Essa norma já existe: a Lei 1.079, de 1950, define os crimes de responsabilidade do presidente da República e sua forma de julgamento. Como a lei é vaga em diversos pontos, o Regimento Interno da Câmara supriu algumas lacunas. Foi o regimento que definiu, por exemplo, que cabe ao presidente da Câmara receber ou não a denúncia contra o presidente da República, verificando a existência dos requisitos definidos em lei.
Também está no regimento a possibilidade de recurso, ao plenário da Câmara, contra decisão do presidente da Casa de negar o recebimento de um pedido de impeachment. A Lei 1.079 não menciona a possibilidade de recorrer a plenário contra a decisão do presidente da Câmara.
Diante da possibilidade de novos pedidos de impeachment, o PT tentará barrar não só o rito definido por Cunha, mas também as regras do Regimento Interno da Câmara. Advogados do partido apontam que, na liminar em resposta à reclamação dos deputados petistas Paulo Teixeira (SP) e Paulo Pimenta (RS), a ministra Rosa Weber concordou com a aplicação da Súmula 46 do Supremo, segundo a qual "a definição dos crimes de responsabilidade e o estabelecimento das respectivas normas de processo e julgamento são da competência legislativa privativa da União" - ou seja, não poderiam ser tratados pelo Regimento Interno.
O advogado Flávio Caetano, que atua na defesa da presidente Dilma Rousseff, defende que Cunha está impedido de dar continuidade ao processo de impeachment até que o plenário do STF analise a questão. "As decisões deram um freio de arrumação [na tramitação do impeachment] e impõem um dever de não fazer a Eduardo Cunha, tanto para processos que estejam em fase originária quanto para os processos em fase recursal", afirmou Caetano, referindo-se aos pedidos de impeachment que não foram apreciados e aos que ele já negou andamento. "Não se pode construir o impeachment com base em regimento interno", sustentou. "O regimento não pode criar recurso."
O advogado também contestou o fato de Cunha definir que a votação desses recursos será por maioria simples, quando, segundo ele, a Constituição exige dois terços dos votos. Caetano avaliou ainda que o presidente da Câmara errou ao não prever a possibilidade de a presidente da República apresentar informações dentro dos requerimentos de impeachment, além de estipular prazos curtos para a defesa. Segundo ele, essa prática fere o direito de defesa "num processo de extrema gravidade". "Nós estamos falando de tirar do poder da chefia do Executivo", frisou.
Para alguns especialistas, porém, as liminares não impedem Cunha de dar seguimento a processos de impeachment seguindo a Lei 1.079. "As lacunas da lei podem ser supridas por decisões anteriores do Supremo, como no caso [do ex-presidente] Collor", diz o professor de Direito Constitucional da UERJ Carlos Roberto Siqueira Castro. O plenário do STF deve analisar em novembro as liminares de Zavascki e Rosa contra a tramitação do impeachment.
Nenhum comentário:
Postar um comentário