- O Estado de S. Paulo
Acusa-se Eduardo Cunha (PMDB) de muita coisa, menos de ingenuidade ou estupidez. O presidente da Câmara costuma estar vários lances à frente de adversários e de aliados no xadrez político. Mesmo que por xadrez entenda-se o jogo de tabuleiro.
Não foi o anfitrião que ficou com cara de tacho na reunião do clube do impeachment, terça-feira pela manhã, na casa de Cunha. O encontro ocorreu imediatamente depois de o Supremo Tribunal Federal interditar os atalhos planejados pelos presentes para abreviar a temporada de Dilma Rousseff no Palácio do Planalto.
“Se eu derrubo Dilma agora, no dia seguinte vocês me derrubam”, foi a frase atribuída a Cunha durante o encontro, segundo apuração do repórter Daniel Carvalho. A oposição, como também o governo, se acha mais esperta do que o resto. Queria que Cunha aceitasse logo o pedido de impeachment da presidente - já que a manobra de recusá-lo para que uma maioria simples de deputados reformasse sua decisão e deslanchasse o processo havia sido inviabilizada por três liminares contrárias do STF.
Querer queria, só que esperto coca-cola não é páreo para o produto original. Como todos acham que o presidente da Câmara não sobreviverá politicamente às denúncias, tentam extrair o máximo de vantagem do que imaginam ser seus estertores. Mas o peemedebista anteviu o que rivais e amigos da onça fariam antes de eles vislumbrarem o próximo movimento de suas próprias peças.
Resta uma bala de prata para Cunha: o poder de iniciar o processo de impeachment de Dilma na Câmara. Porém, assim que ele deflagrá-lo, se tornará um incômodo inútil para a oposição e um inimigo declarado para o governo. Fragilizado pelas acusações que se multiplicam da Suíça ao Brasil, o deputado feriria Dilma e, ao mesmo tempo, cometeria suicídio político. Não caiu na conversa dos sócios do clube e preservou seu cartucho.
Do mesmo modo, o governo quer fazer crer que dará sustentação a Cunha caso ele desista de fazer par com a oposição. O faz de conta ficou menos verossímil na terça depois de a maioria dos deputados petistas assinar pedido de cassação do colega. Cunha só se segura no cargo e no mandato enquanto ambos os lados acharem que precisam dele para ganhar a guerra do impeachment. Daí ele não precipitar seus movimentos se tiver alternativas.
A prioridade do presidente da Câmara - como ele mesmo declarou - é recarregar sua bala de prata, temporariamente neutralizada pelos ministros Teori Zavascki e Rosa Weber. Vai brigar no Supremo para ter de volta o poder sobre o futuro de Dilma. Mostrar que sua arma está engatilhada é mais importante do que dispará-la. Enquanto o STF não arma nem desarma, o impeachment emperra e o governo espera o recesso parlamentar.
O problema é que o suspense não se limita ao destino do mandato presidencial. Provar que tem força política para se manter no cargo não basta. Dilma também tem que mostrar que é capaz de voltar a governar. Sustentar seus vetos à pauta-bomba do Congresso e aprovar as medidas do ajuste fiscal seriam as melhores maneiras de sair do estado de suspensão. Está difícil.
Tudo o que Cunha e o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB), têm dito ultimamente é que as votações desses temas foram adiadas. Para a semana que vem, para o mês que vem, para o ano que vem - só faltam dizer “para o governo que vem”. Não tiram os tubos da presidente, mas injetam apenas o oxigênio necessário para não asfixiar a paciente de vez. Criar perspectiva, traçar um horizonte, superar o impasse é a única maneira de o governo voltar a respirar sem ajuda de aparelhos alugados pelo PMDB - e de a economia sair do limbo.
Aos caciques peemedebistas, porém, não convém tirar do coma um aliado do qual planejam se separar assim que a ocasião permitir. Nesse empate de espertos, ninguém ganha, mas todos perdem.
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