Folha de S. Paulo
Entre os candidatos, o distributivismo
oportunista gera uma espécie de corrida armamentista para ver quem dá mais
Será que a contraofensiva midiática do governo, centrada na questão da justiça tributária, teve impacto na reversão da queda de popularidade do presidente? A questão é muito complexa porque coincidiu, em larga medida, com um choque externo no sistema: o tarifaço de Trump. Mas os dados de pesquisa da Quaest nos ajudam a analisar a questão.
Segundo a pesquisa, 63% dos respondentes
concordam que "os ricos devem pagar mais impostos para diminuir os
impostos dos mais pobres", enquanto 33% discordam. No entanto, 53%
afirmaram que o discurso que coloca "ricos contra pobres, porque chama a
atenção contra os privilégios de alguns" está errado, porque cria mais
briga e polarização no país". Um percentual bem menor — 38%— concorda.
Mais relevante: 56% não tinham ouvido falar da campanha "pobres contra
ricos". Sim, o impacto concentrou-se nas bolhas da esquerda. Mas o grupo
fundamental são os swing voters —os eleitores sem lealdades partidárias e que
são suscetíveis de alterar o voto: concordam em tese mas opõem-se à estratégia.
O conhecimento acumulado na ciência política
sugere que os efeitos eleitorais de políticas tributárias são pequenos
(exceções confirmam a regra, como
mostrei aqui). Embora a questão redistributiva seja em larga medida o eixo
vertebrador de disputa política, a política tributária não o é. As questões
tributárias são marcadas por tecnicalidades que as tornam opacas e pouco
tangíveis para eleitorado. Exemplo bizarro é que a "guerra dos pobres
contra ricos" foi deflagrada pelo aumento de um imposto regressivo,
o IOF!
Ahrens e Bandau (2024), em "The
electoral consequences of taxation in OECD countries", analisam a questão
com dados abrangendo 30 países da OCDE (Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Económico) e 50 anos. Concluem que os efeitos variam dependendo
do imposto, se direto ou indireto. Mudanças no IVA, seja reduzindo ou
aumentando as alíquotas, não tem impacto eleitoral, enquanto as mudanças
no Imposto
de Renda de Pessoas Físicas, sim. Aumento de impostos impactam
negativamente nas eleições subsequentes.
Mas as isenções de impostos têm impacto menor, e estão sujeitas a serem
esquecidas. Há um viés de negatividade: aumentos de impostos geram reações mais
intensas do que isenções ou cortes. Ou seja, perdas de bem-estar têm maior peso
do que ganhos da mesma magnitude.
A guerra dos "pobres contra os
ricos" se inscreve na primeira lição do manual do populista: criar uma
"democracia agonística", centrada no conflito permanente. Como
mostrou Weyland, essa estratégia para governos de esquerda só
funciona em contextos de bonanças fiscais. O populismo de direita, em
contraste, viabiliza-se através do êxito na resolução de crises nacionais
agudas, por exemplo, na segurança pública e na imigração. Na ausência destes
fatores, o populismo agonista se esgota e a democracia se mostra resiliente. O
distributivismo oportunista gera uma corrida armamentista para ver quem dá
mais: como aconteceu com o Auxílio Brasil e Bolsa Família, e agora com a proposta de Arthur Lira de elevar o teto da isenção do
IRPF proposto.
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