quinta-feira, 10 de julho de 2025

O império ataca o Brasil - Celso Ming

O Estado de S. Paulo

Foi, sim, uma bomba, mas é preciso entender melhor a sua motivação. Essa supertaxação de 50% de todas as exportações do Brasil aos Estados Unidos, a partir de 1º de agosto, anunciada nesta quarta-feira pelo presidente Donald Trump, não tem motivação comercial e, se tiver alguma motivação econômica, não parece relevante.

É uma clara punição, que tem intenção de produzir grave impacto sobre os interesses do Brasil, mas com efeitos práticos pouco claros.

O comunicado do presidente Trump acusa o governo brasileiro de perseguir o ex-presidente Jair Bolsonaro e de impedir sua candidatura a qualquer cargo político. Desde já, fica incompreensível que uma divergência política, ainda que séria, possa ser combatida eficazmente com megaimpostos alfandegários. É a primeira vez que se tem notícia de que um processo em andamento no Supremo deva ser combatido com um tarifaço comercial.

Mas é preciso perguntar se a verdadeira motivação não é bem outra, mais geopolítica do que a suposta política interna inadmissível do Brasil.

O presidente Trump tem feito algumas manifestações de que o Brasil, que há mais de cem anos orbitou a esfera de influência dos Estados Unidos, está produzindo movimentos importantes de escape para a área de influência da China. Os ataques verbais ao Brasil e aos demais membros do Brics mostram que o coração do Império está incomodado. Trump não gostou quando o presidente Lula falou em substituir o dólar no comércio dentro do bloco dos Brics. Mas, outra vez, a pergunta é se a taxação teria condições de reverter esse movimento do Brasil em direção à China e, eventualmente, em direção também à Rússia.

Como o Brasil é deficitário nas suas relações comerciais com os Estados Unidos, a imposição de tarifas aduaneiras de 50% deverá ter pouca relevância econômica – a menos que o governo Trump decida impor represálias a outros países que importam do Brasil. Possivelmente, a empresa brasileira mais vulnerável ao tacão de Trump é a Embraer, cujos negócios incomodam a Boeing. Suas aeronaves poderão se tornar proibitivas no mercado dos Estados Unidos.

Falta saber como reagirá o governo brasileiro, não em comunicados verbais, mas em respostas políticas. Em princípio, a última coisa que o governo Lula deveria fazer seria peitar o governo Trump, como já ameaçou fazer, na base do truco em cima do truco. É também improvável que o Supremo mude o curso de seus processos para livrar Bolsonaro e quem o acompanha das sentenças a que está sujeito.

Há o impacto sobre a política interna. O governo Lula deverá assumir, agora e na campanha eleitoral, o discurso de que se tornou vítima dos agentes do mal. Não está claro como a oposição, particularmente o Centrão e os empresários brasileiros prejudicados, reagirão a esse jogo.

 

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