O Globo
O ministro Alexandre de Moraes atendeu ao
pedido da Advocacia-Geral da União para que se investigue o que aconteceu com o
dólar no dia 9 de julho passado. O caso tramitará sob segredo de Justiça.
Parte do que aconteceu, todo mundo sabe: o
presidente Donald Trump anunciou,
às 16h17, uma sobretaxa de 50% para as exportações brasileiras.
O que nem todo mundo sabia, e o Jornal Nacional mostrou, era que, às 13h30, alguém comprou entre US$ 3 bilhões e US$ 4 bilhões cotados a R$ 5,46. Poucos minutos depois do anúncio das sanções, esse alguém (ou alguéns) vendeu o ervanário comprado três horas antes, com dólar cotado a R$ 5,60. A 14 centavos para cada dólar comprado e vendido (diferença entre as duas cotações), alguém ganhou R$ 140 milhões para cada bilhão operado às 13h30m. Grande tacada, das maiores já vistas. Em tese, quem a armou poderia não ter desembolsado um só real. Pelos mecanismos existentes, um operador pode comprar dólares num dia para pagar só no dia seguinte.
Foi coisa de quem sabia que as sanções seriam
impostas no dia 9. Com o anúncio das sanções, a cotação do dólar no mercado
brasileiro teria uma alta imediata. Ainda não se sabe quem comprou os dólares a
R$ 5,46 e quem os vendeu a R$ 5,60. Também não se sabe a nacionalidade dos
felizardos. Sabe-se apenas que há gato nessa tuba.
É possível que haja mais de um operador
nessas transações, e não se sabe se eles são os mesmos. O primeiro movimento
seria razoável; o segundo, inesperado. Pelo cheiro da brilhantina, existe a
possibilidade de ter sido feita uma operação de amadores ambiciosos. Tomara,
porque nesse caso será mais fácil rastreá-los.
Esse tipo de coisa acontece. Em janeiro de
1999, Fernando Henrique, reeleito, tinha acabado de tomar posse. Com fuga de
capitais, o valor do real e dos papéis da dívida brasileira caindo, instalou-se
um clima de barata-voa no governo e no mercado. Gustavo Franco, presidente do
Banco Central, estava frito.
O presidente da Argentina, Carlos Menem, e um
burocrata do FMI sugeriram
que o Brasil adotasse um plano de conversibilidade da moeda. No dia 20, numa
newsletter do banco Chase, um de seus analistas propôs que se fizesse uma
renegociação da dívida interna (leia-se calote). Os papéis da dívida externa,
que no dia 20 valiam 58,75% do seu valor de face, caíram para 50,25%.
Apesar da turbulência, Fernando
Henrique Cardoso segurou o leme. Seis dias depois, os papéis voltaram
a valer 58%. Quem os comprou na baixa, ganhou 15% em uma semana. Poucos
espertalhões ganharam tanto dinheiro em tão pouco tempo.
Havia gato naquela tuba, mas o caso nunca foi
sequer investigado.
Os espertalhões de 1999 foram superados pelos
operadores do dólar de 9 de julho, mas desta vez há investigação.
Em 1999, Alexandre de Moraes tinha 30 anos e
era apenas um promissor promotor de Justiça em São Paulo. Se o caso dos papéis
da dívida caísse na sua mesa, talvez o resultado tivesse sido outro.
Felizmente, passados 26 anos, a solução do mistério do dólar de 9 de julho
ficou com ele.
Nenhum comentário:
Postar um comentário