Problema alimenta retórica xenófoba, preconceitos étnicos e religiosos e cria as condições que geraram, no século passado, duas guerras mundiais
Após a medida do governo de Donald Trump, separando pais e filhos de estrangeiros sem documentos, e a atualização dos dados de naufrágios no Mar Mediterrâneo, que registram 1.422 mortos e desaparecimentos este ano (gráfico abaixo), o problema do fluxo de pessoas deslocadas voltou a ter destaque internacional. De fato, trata-se de um cenário preocupante, não apenas pelo drama de refugiados e emigrantes, mas também por ser reflexo de isolacionismo, xenofobia e intolerância, mazelas que pareciam ter sido superadas.
Em pleno século XXI, inúmeras diásporas deslocam fluxos intensos de pessoas pelo mundo, expulsas de suas cidades natais por guerras, miséria, perseguição religiosa, conflitos étnicos, entre outras tragédias. E o êxodo atual é comparável às movimentações de refugiados da Segunda Guerra Mundial, como é o caso dos rohingyas, de Mianmar para Bangladesh; sírios, iraquianos e afegãos, para a Europa; e venezuelanos que fogem do desvario bolivariano de Nicolás Maduro para países vizinhos — Brasil, Colômbia, Peru e Chile.
A chegada de um fluxo migratório tão volumoso apresenta desafios para os países de acolhimento, muitas vezes gerando temores de impactos negativos nos serviços públicos, nos de saúde em especial, e nos mercados de trabalho, especialmente numa era de novas tecnologias e automação que reduzem a demanda por mão de obra. Isso fortalece a retórica de políticos populistas, defensores do fechamento de fronteiras, do protecionismo comercial, além de estimularem conflitos étnicos, como se vê na Europa e nos EUA de Trump.
Acordos internacionais, por exemplo o feito entre a União Europeia e a Líbia, permitiram um melhor controle do fluxo de migrantes, embora o volume de pessoas realizando travessias perigosas ainda seja alto. Dados da Organização Internacional para Migração (OIM), da ONU, revelam que o número de refugiados que chegaram à Europa este ano pelo Mar Mediterrâneo, até 8 de julho, foi de 47.637, frente a 101.392, no mesmo período do ano passado, e 239.492, em 2016.
No caso venezuelano, segundo a ONU, cerca de cinco mil pessoas deixam o país diariamente. Se este ritmo for mantido, o número de refugiados do regime bolivariano poderá chegar a 1,8 milhão de pessoas. Este êxodo é a prova, em carne e osso, da crise humanitária que Maduro nega existir. O impacto nos países de acolhimento se desdobra em vários desafios, como desemprego, marginalidade e a volta de doenças erradicadas.
O quadro é complexo. Agências humanitárias não têm condições de enfrentar tal desafio sem apoio governamental, e os governos, isoladamente, pouco podem fazer. Por outro lado, fechar fronteiras, vedando-se para o resto do mundo, como pregam alguns líderes populistas, não fará o problema desaparecer. É preciso uma ação multilateral não apenas por questão de solidariedade, mas sobretudo para evitar que esta crise, sinal de fracasso do Humanismo, volte a criar as condições que já geraram duas guerras mundiais.
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