segunda-feira, 11 de agosto de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Trump abala confiança nos EUA ao pressionar Fed

O Globo

Por ora, ele parece ter desistido de demitir Powell. Mas seus atos revelam desprezo pelo equilíbrio institucional

A pressão de Donald Trump sobre o Federal Reserve (Fed), o banco central americano, tem ganhado contornos preocupantes. Trump não esconde sua intenção de se livrar do presidente do Fed, Jerome Powell, que ele próprio indicou ao cargo em 2017, mas que hoje considera “tardio” demais para reduzir os juros. Por lei, ele não pode demitir Powell, cujo mandato só termina em maio de 2026. Mas alguém com os instintos autoritários de Trump não se deixaria intimidar por esse tipo de detalhe.

Ganhou corpo nas hostes trumpistas a ideia de usar como pretexto para a demissão o custo exorbitante da nova sede do Fed, orçada inicialmente em US$ 1,9 bilhão, mas que não sairá por menos de US$ 2,5 bilhões. Depois de uma visita de Trump ao canteiro de obras, parlamentares republicanos decidiram denunciar à Justiça irregularidades atribuídas ao projeto, afirmando que Powell mentiu sobre ele em seu último pronunciamento ao Congresso. Uma demissão antes do fim do mandato seria fato inédito, que por certo despertaria um processo judicial e teria consequência imediata nos mercados.

Trump contra a globalização - Carlos Alberto Sardenberg

O Globo

Todos os países fazem um jogo de perdedor: protecionismo contra protecionismo. Fica tudo mais caro

No dia em que entraram em vigor as tarifas globais, Donald Trump escreveu em sua rede social:

— Bilhões de dólares estão agora fluindo para os Estados Unidos.

Ele acredita que o país exportador de algum modo paga as tarifas. Repete essa tese, digamos, toda vez que anuncia uma nova taxa. Por exemplo:

— A Suíça vai ter de nos pagar 39%.

É bem o contrário. O nome da coisa é tarifa de importação, logo, e caminhando pelo óbvio, quem paga é o importador americano, que passará esse custo adicional ao consumidor local. O hambúrguer e o suco de laranja ficam mais caros.

Digamos que o importador absorva todo esse custo, tirando de sua margem de lucro. Mesmo assim, quem paga é o próprio importador americano. O fluxo de bilhões de dólares vai do bolso americano para os cofres do Tesouro americano, do setor privado para o governo. Tanto é assim que Trump não perde oportunidade de comemorar os dados sobre o aumento de receita das importações. É contraditório, mas quem diz que Trump se importa com isso? Na verdade, ele nem percebe a contradição — como têm dito os analistas com um mínimo de noção.

A volta da censura - Miguel de Almeida

O Globo

No rastro do esdrúxulo conceito de Escola Sem Partido, pais conservadores buscam interferir no conteúdo didático

Nos últimos meses, escrevo um livro sobre a censura na época do regime militar: um show de horrores, felizmente dinamitado pela volta da democracia. Além de centenas de canções, cerca de 500 títulos foram proibidos de chegar ao público — como o romance “Zero”, de Ignácio de Loyola Brandão, e os contos de “Feliz ano novo”, de Rubem Fonseca. Em geral, o argumento, quando havia, era ferir “a moral e os bons costumes”.

Na São Paulo de 2025, 40 anos depois do final da ditadura, a Prefeitura da cidade reinstituiu a censura ao arrepio da lei. São vários os casos. Cinco dias antes de seu início, a 7ª Flipei (Feira Literária Pirata das Editoras Independentes) recebeu comunicado da Fundação Theatro Municipal de que o evento fora cancelado. O diretor Abraão Mafra não dourou a pílula: a proibição ocorria “em razão do uso político por parte dos organizadores”.

Lei Magnitsky é soberana? - Irapuã Santana

O Globo

Problema é político, com reflexos no mundo do Direito, e não o contrário, porque, juridicamente falando, não há para onde correr

Muito tem se falado sobre os efeitos da Lei Magnitsky nas últimas semanas. Sua essência reside na imposição de sanções a indivíduos e entidades estrangeiros considerados responsáveis por violações graves de direitos humanos ou atos de corrupção significativos.

Um ponto central é a natureza da decisão de aplicar as sanções. A inclusão do nome de qualquer pessoa na lista da Lei Magnitsky é um ato privativo do presidente dos Estados Unidos, com base no interesse nacional. Portanto, sua legitimidade está ligada somente à ordem jurídica americana.

A soneca dos governadores - Bernardo Mello Franco

O Globo

Presidenciáveis, Tarcísio e Caiado tentam culpar Lula por tarifaço articulado pelo filho do capitão

Na tarde em que extremistas de direita invadiram e depredaram as sedes dos Três Poderes, o governador do Distrito Federal estava fora do ar. Ibaneis Rocha não atendeu o telefone enquanto a multidão de verde e amarelo destruía os palácios e urrava por golpe e ditadura. Mais tarde, escreveu a um amigo que estava tirando uma soneca.

Responsável pela segurança pública em Brasília, Ibaneis ignorou alertas de que os bolsonaristas preparavam atos violentos. Também rejeitou ajuda da Força Nacional de Segurança, oferecida na véspera pelo Ministério da Justiça. O emedebista foi afastado pelo Supremo por “omissão dolosa”, mas conseguiu voltar ao cargo dois meses depois. Nesta quinta, reapareceu no noticiário como anfitrião de um encontro de governadores.

O perfil dos amotinados no Congresso e seus riscos - Bruno Carazza

Valor Econômico

Dados revelam que líderes bolsonaristas na insurreição da semana passada preocupam-se mais em tumultuar do que em propor soluções

"Sinceramente, Bruno, as métricas que você utiliza para avaliar o quão ruim é o Congresso atual comparado com os anteriores, para dizer que não é tão mau assim, depois de ontem foram para o vinagre!”

Recebi a mensagem acima na quinta, vinda do meu amigo Leandro Novais, professor de direito econômico da Faculdade de Direito da UFMG. Obviamente, ele se referia à tomada do controle do Congresso Nacional à força pelos bolsonaristas em reação à decretação da prisão domiciliar de Jair Bolsonaro pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal.

A agitação durou trinta horas e ligou o sinal de alerta sobre o grau de ameaça que paira sobre a democracia brasileira no momento em que um Poder se mobiliza para colocar outro contra a parede.

Boas e más ideias para o crédito imobiliário - Alex Ribeiro

Valor Econômico

Governo prepara medidas para revitalizar o sistema de crédito habitacional


 O dinheiro barato da caderneta de poupança para o financiamento imobiliário está acabando, e o governo prepara medidas para revitalizar o sistema de crédito habitacional. Há uma má ideia circulando: fazer a liberação dos depósitos compulsórios para turbinar os empréstimos no curto prazo, às custas de riscos à estabilidade.

Clientes que, ultimamente, buscaram crédito conseguiram financiar apenas metade do valor do imóvel. É um racionamento. Os bancos captam dinheiro para emprestar na poupança, mas o depositante está sumindo.

A caderneta paga cerca de 8,5% ao ano, apesar da isenção de impostos. É um mau negócio e, graças à maior educação financeira, as pessoas estão percebendo. Com a Selic a 15% ao ano, outras aplicações rendem pelo menos 11,5% ao ano, depois de pagar o imposto.

Provocar para romper - Diogo Schelp

O Estado de S. Paulo

Fica claro que a missão de Gabriel Escobar é provocar o Brasil e obter a própria expulsão

Em plena era digital, ainda se utiliza a expressão “telegramas” (cables, em inglês) para se referir às comunicações oficiais entre o governo de um país e suas embaixadas e consulados ao redor do mundo. No mundo pré-internet, era exclusivamente por meio desses comunicados, geralmente confidenciais, que os diplomatas informavam aos seus chefes no ministério de relações exteriores o que estava acontecendo nos países onde atuavam e recebiam as ordens sobre como se posicionar publicamente sobre questões referentes à relação bilateral.

O Brics em tempos de Trump - Oliver Stuenkel

O Estado de S. Paulo

Em um cenário global fragmentado e volátil, a aposta mais segura é o alinhamento múltiplo

A volta de Donald Trump teve um efeito inesperado: dar novo fôlego ao Brics. Com sua retórica errática, tarifas punitivas, ameaças contra o grupo e disposição de interferir na política interna de países do bloco, ele reforçou a necessidade de diversificar parcerias e reduzir a dependência de Washington.

Enquanto os antecessores de Trump ignoraram o grupo, os ataques do atual presidente representam, paradoxalmente, um elemento unificador. Até na Índia, que vinha estreitando laços com os EUA, as tarifas reforçaram a percepção de que é arriscado depender demais de um aliado volátil, levando Nova Délhi a valorizar a estratégia de alinhamentos múltiplos como um seguro geopolítico.

Os defensores da democracia - Denis Lerrer Rosenfield

O Estado de S. Paulo

Limites devem ser estabelecidos, sob pena de a defesa da democracia tornar-se uma arma que pode miná-la

O Brasil precisa se defender dos defensores da democracia! Cuidado! O terreno está minado! O número de falsos personagens que se arvoram em defensores das liberdades é propriamente assustador. O País está rumando para uma crise institucional de proporções importantes, com as instituições se desagregando internamente, para além dos conflitos cada vez mais visíveis entre elas, enquanto os responsáveis políticos nada mais fazem do que defender seus interesses eleitorais, corporativos, de privilégios e outros, como se o bem coletivo pudesse ficar à deriva.

Bolsonaro e seu filho Eduardo só se preocupam com uma anistia generalizada que os beneficiaria, usando para isso, sem quaisquer limites, todo e qualquer meio, inclusive as tarifas impostas, que contrariam os interesses nacionais. Fazem o jogo dos EUA em prejuízo de seu próprio país, algo inaceitável para um ex-presidente. Agir contra a própria nação é propriamente um crime. Do ponto de vista eleitoral, tanto mais inexplicável é, uma vez que sua própria base foi prejudicada, em particular o agronegócio, seu pilar de sustentação. Se o deputado tinha alguma pretensão presidencial, ela simplesmente esvaiu-se. Entre o Brasil e os EUA, optaram por esse último, sob o pretexto de estarem defendendo as nossas liberdades! Ora, o País sofreu um imenso tarifaço e eles defenderam que o presidente americano tenha ingerência no Judiciário brasileiro. Pasmem, declaram defender as liberdades.

O STF e o foro - Marcus André Melo

Folha de S. Paulo

Proposta restaura o statu quo pelo qual a Câmara controlará a licença e estenderá no tempo os processos

Antes do início do julgamento da denúncia do PGR sobre Bolsonaro, escrevi aqui neste espaço que o saldo líquido para a corte seria negativo em qualquer cenário. "O julgamento será fatalmente percebido como hiperpolitizado —seu custo proibitivo— em um momento crítico para a democracia brasileira". O pior cenário materializou-se. E a intervenção de Trump no processo representa um choque no sistema. Ela altera o equilíbrio perverso entre parlamentares e juízes no qual há interdependência: a ameaça de impeachment é a contrapartida de ameaças de condenação em ações penais.

Congresso corre para aprovar Código Eleitoral - Lara Mesquita

Folha de S. Paulo

Novas regras vão impactar na composição das Casas Legislativas

Apesar das tentativas de deputados e senadores ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro de barrar o retorno dos trabalhos legislativos na última semana, o segundo semestre promete ser agitado no Congresso Nacional.

A urgência em pautar temas relevantes para os próprios congressistas, especialmente as regras para as eleições de 4 de outubro de 2026, que são regidas pelo princípio da anualidade, deve dar o tom nas próximas semanas.

São dois os principais projetos nessa temática que vão dominar a agenda: o novo Código Eleitoral e a decisão sobre a manutenção ou derrubada do veto presidencial ao projeto de lei que prevê aumento de 513 para 531 cadeiras na Câmara, além de regras para garantir a proporcionalidade entre a população dos estados e o número de representantes.

O projeto de lei complementar (PLP) 112/2021, que atualiza o Código Eleitoral, tramita no Senado desde setembro de 2021.

A catedral orgânica – Ruy Castro

Folha de S. Paulo

Como o brasileiro pode amar a floresta e protegê-la se não é educado para entendê-la como central para o mundo?

"O Brazil não conhece o Brasil/ O Brasil nunca foi ao Brazil// O Brazil não merece o Brasil/ O Brazil tá matando o Brasil// Do Brasil, SOS ao Brazil/ Do Brasil, SOS ao Brazil". São versos de Mauricio Tapajós e Aldir Blanc em "Querelas do Brasil", que Elis Regina lançou em 1978 e, hoje, quase 50 anos depois, às vésperas da COP30, soam com assombrosa atualidade.

Reencontrei esse alerta na entrevista do cineasta João Moreira Salles e da ativista indígena e colunista da Folha Txai Suruí a Rosiska Darcy de Oliveira no último número da indispensável Revista Brasileira, publicada pela Academia Brasileira de Letras e dirigida por Rosiska.

Para Bolsonaro, salvar a pele equivale a desmontar instituições - Bernardo Carvalho

Folha de S. Paulo

Extrema direita precisa inverter o sentido de coisas e palavras para se manter no poder

Outro dia ouvi que o único erro de Eduardo Bolsonaro foi não ter pedido a Trump para deixar de fora o nome de sua família na punição ao Brasil. Tudo bem que taxista não conta, mas é mau sinal que a esta altura chamar os Bolsonaro de câncer, neoplasia social, soe pueril e inócuo, como me dei conta ao responder. Segundo pesquisa do Datafolha, 46% dos brasileiros são contra a condenação do ex-presidente.

Contra a Justiça brasileira, Bolsonaro diz que só obedece à lei de Deus —o seu, é claro, como sempre. Vale-se da versatilidade da escusa que lhe permitiu cometer atos gravíssimos aos olhos de qualquer deus, incluindo o que ele costuma chamar de seu, para seguir bravateando como se não fosse réu.

Música | Moacyr Luz - Atravessado