segunda-feira, 4 de agosto de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Alta de estelionatos evidencia falha de investigação policial

O Globo

Bandidos migraram para o meio digital, enquanto polícia se mantém muito analógica. Isso precisa mudar

Qualquer brasileiro importunado diariamente com irritantes ligações telefônicas como as que alegam compras indevidas em seus cartões e pedem que clique em algum link obscuro para “resolver” o problema tem a sensação de que o país vive uma epidemia de golpes. Não é só sensação. Seguindo tendência mundial, o número de estelionatos no Brasil explodiu nos últimos anos. Os registros no ano passado atingiram 2.166.552, um aumento de 8,3% em relação a 2023 (2.000.960) e de mais de 400% ante 2018, quando foram contabilizados 426.799 casos.

São Paulo e Distrito Federal apresentam as maiores taxas de registros de estelionato (1.744 por 100 mil habitantes e 1.681,3 por 100 mil, respectivamente), enquanto Paraíba e Maranhão ostentam as menores (235,4 e 285,3 por 100 mil). A média nacional é de 1.019,2 por 100 mil, segundo a 19ª edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública.

Esses golpes se materializam de diferentes formas, mas hoje acontecem sobretudo no meio digital. Oficialmente, em torno de 12% apenas foram enquadrados como estelionato por meio eletrônico, mas pesquisadores ponderam que o número pode estar subdimensionado, uma vez que esse tipo penal foi incluído na legislação apenas em 2021, e muitos estados brasileiros (caso de São Paulo, Rio de Janeiro e Ceará) ainda não fazem a diferenciação entre os crimes no meio digital e os outros.

Cada um por si no confronto com Trump - Carlos Alberto Sardenberg

O Globo

Tarifaço desalinha os países, desmonta associações. Não há grupo de nações negociando coletivamente

O tarifaço de Trump não apenas desarruma o comércio mundial — como se isso fosse pouco. Há um outro efeito, geopolítico: desalinha os países, desmonta associações. Não há grupo de nações negociando coletivamente com o governo americano. Trump deixa cada um por si.

Pois a China, a maior economia do Brics, negocia diretamente com os Estados Unidos. Não consta que defenda os interesses de seus pares. Ao contrário, age como potência emergente.

O Brics é um grupo que estabeleceu como objetivo o estreitamento das relações políticas e econômicas, formando o Sul Global, para falar alto no cenário mundial, especialmente com o Ocidente.

A Índia, a segunda economia do grupo, também se virou por conta própria. Ao contrário de Lula, o primeiro-ministro Narendra Modi foi a Washington, apertou as mãos de Trump.

Bandeiras incendiadas - Demétrio Magnoli

O Globo

Na prática, no Brasil de hoje, o governo 'de esquerda' e o coro dos progressistas clamam pela censura nas redes

A ordem inusitada partiu dele, Alexandre de Moraes, na segunda (28/7). Os militares réus no processo da trama golpista foram obrigados a trocar suas fardas por roupas civis para participar dos interrogatórios. O evento, em si, tem importância zero, a não ser como sintoma.

Moraes nutre obsessão censória: na falta de postagens em redes sociais dos réus, resolveu vetar suas indumentárias, o que é uma forma de expressão. O juiz que derruba perfis às dúzias incendiou a bandeira da liberdade de expressão. Uma coisa é repudiar as sanções de Trump, que violam a soberania do Brasil. Outra é aplaudir seus atos de censura, que violam nossa Constituição. Fazendo-o, os “progressistas” (aspas indispensáveis) ajudam a atiçar as chamas de uma fogueira.

Que filhos deixaremos? - Preto Zezé

O Globo

Meninos crescem confundindo amor com controle, carinho com domínio, masculinidade com violência

Todo mundo se pergunta: “Que mundo vamos deixar para nossos filhos?”. É uma inquietação justa diante das guerras, das mudanças climáticas, da desigualdade. Mas talvez a pergunta mais urgente seja:

— Que filhos estamos deixando para o mundo?

Outro dia, fui confrontado por essa dúvida dentro da minha própria casa. Meu filho, de 9 anos, foi chamado para arrumar o quarto. Nada demais. Um gesto simples, uma responsabilidade formativa. Mas ele resistiu. Disse que não precisava, porque “tem uma menina que vem aqui fazer isso”.

Respirei fundo. Expliquei que a moça não é sua empregada pessoal, que está ali para ajudar, não para servir. Ele respondeu, sem perceber o peso da fala:

— Mas é o trabalho dela, né?

Ficou mais difícil negociar com o Congresso - Bruno Carazza

Valor Econômico

Fundão eleitoral e emendas parlamentares tornaram deputados mais relutantes a ceder seu apoio

Na minha coluna de 7/07/2025 demonstrei que, do ponto de vista de suas características, o nível do Congresso atual não é pior do que o de legislaturas anteriores.

Em outras palavras, a profecia de Ulysses Guimarães (“Está achando ruim este Congresso? Então espera o próximo”) não se verifica quando se levam em consideração as variáveis comumente utilizadas pela Ciência Política para avaliar os parlamentares: maturidade, experiência legislativa prévia, escolaridade, presença feminina e quantidade de proposições apresentadas.

Apesar de a qualidade do Legislativo atual não deixar a desejar em relação à média histórica, o governo Lula vem tendo problemas para implementar a sua agenda.

Cortes mais acentuados da Selic vão depender de cautela fiscal - Sergio Lamucci

Valor Econômico

Juros reais de 10% são danosos para a economia, e excessos de estímulos fiscais podem limitar a queda da taxa

 

Trump usa Brasil para testar ferramentas de manutenção de hegemonia global - Diogo Schelp

O Estado de S. Paulo

Presidente americano não tem incentivos para reduzir tensões com o Brasil enquanto Lula for presidente, pois tem pouco a perder e muito a ganhar

A redução das tensões comerciais e políticas entre Estados Unidos e Brasil dependem basicamente da vontade do presidente americano Donald Trump — que em questão de dias, com o tarifaço de 50% (ainda que cheio de exceções) e as sanções contra o ministro

Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), colocou as relações entre os dois países no patamar mais baixo dentre todos aqueles que não são inimigos declarados da superpotência. Do lado brasileiro, vontade não falta para resolver o impasse.

Lula pode até ser criticado por ter elevado o tom acima do necessário para surfar na onda patriótica despertada pelas ameaças de Trump à soberania brasileira, mas até aqui o governo brasileiro tem se mostrado disposto a negociar com Washington o que é possível de ser negociado. Isso significa deixar claro que não será aceita qualquer ingerência de Trump na política ou nas instituições brasileiras.

Trump adota nova forma de interferência - Carlos Pereira

O Estado de S. Paulo

Trump adota nova forma de interferência antidemocrática: erosão com chantagem econômica e diplomática

A maioria dos estudos sobre democracias no século 21 tem se concentrado nos riscos de sua erosão por meio de processos mais sofisticados e insidiosos do que os tradicionais golpes militares do século passado – fenômeno que ficou conhecido como democratic backsliding.

O temor recorrente é que líderes extremistas, uma vez eleitos, passem a concentrar poder e a enfraquecer as instituições encarregadas de impor limites ao Executivo e de proteger os direitos e valores liberais da democracia. Esse processo, que costuma ocorrer de dentro para fora, tem pautado os debates acadêmicos e políticos sobre os perigos contemporâneos à democracia.

Uma trupe de hipócritas - Lygia Maria

Folha de S. Paulo

Trump finge que se importa com democracia, bolsonaristas fingem que não admiram ditadura e petistas fingem que defendem liberdade de expressão

A acepção moderna da palavra "hipócrita" é pejorativa: a pessoa finge possuir virtudes e crenças que não tem ou exige que os outros façam aquilo que ela não faz.

Sua origem é "hupokrités", usada na Antiguidade grega para designar quem trabalha com interpretação (ator). O termo não era adequado para se referir a oradores e autoridades, já que a arte do disfarce não combina com a honestidade exigida na esfera pública.

O noticiário político na última semana, porém, foi dominado por hipócritas. Virou teatro político.
A começar por Donald Trump, que vestiu a fantasia de cavaleiro da liberdade em defesa da democracia. Dos 69 países sobretaxados na sua cruzada comercial, o Brasil foi o mais impactado porque, segundo o americano, o julgamento de Jair Bolsonaro no Supremo é perseguição ideológica.

Bolsonarismo vive sua pior crise - Camila Rocha

Folha de S. Paulo

'Sonho' de ex-presidente virou pesadelo, e prisão é questão de tempo

Em abril de 2015, Jair Bolsonaro se desfiliou do Partido Progressista (PP) com o "sonho" de se candidatar à Presidência. Dez anos depois, o movimento político que o levou ao poder vive sua pior crise.

A crise possui três frentes. A primeira é institucional. Além de estar inelegível, Bolsonaro aguarda o resultado do julgamento por tentativa de golpe com uma tornozeleira eletrônica. Sua prisão é questão de tempo.

Carla Zambelli, uma de suas apoiadoras mais fiéis, foi abandonada à própria sorte. Presa pela Justiça italiana, aguarda a decisão sobre sua extradição para o Brasil. Caso regresse, deve enfrentar uma pena de dez anos por crimes relacionados à invasão do sistema do Conselho Nacional de Justiça.

Um historiador contra a maré - Bernardo Mello Franco

O Globo

Historiador judeu agitou Flip ao acusar governo israelense de promover limpeza étnica em Gaza: "Palestinos moram numa grande prisão"

Ilan Pappe é filho de judeus alemães que escaparam da perseguição do nazismo. Nasceu em Haifa em 1954, seis anos após a criação do Estado de Israel. “Tive a infância típica de uma criança israelense”, contou na sexta-feira, na Festa Literária de Paraty. Ao escolher o ofício de historiador, ele começou a ter contato com fatos que não eram ensinados na escola. “Tudo o que encontrava nas minhas pesquisas contradizia o que havia ouvido dos meus pais e dos professores. Fui exposto a uma história bem diferente de Israel e da Palestina”, disse.

Depois de uma temporada de estudos no exterior, Pappe voltou a Israel para mostrar o que havia garimpado em livros e arquivos oficiais. Sua visão crítica do sionismo desagradou amigos, parentes e colegas de academia. “Fui ingênuo. Achei que seria recebido de braços abertos”, comentou. “Não me dei conta de que desafiar a narrativa histórica do meu próprio país seria considerado uma traição. Isso foi um choque para mim”, admitiu.

Trump e Milei: O inesperado sucesso da nova direita radical - Marcus André Melo

Folha de S. Paulo

O americano, mesmo enfrentando resistência, implementa partes relevantes de sua agenda, e o argentino caminha na mesma trilha

A ascensão de lideranças da direita radical tem gerado um paradoxo que desafia explicações tradicionais. Uma de suas características é a propensão a erros por serem outsiders, incapazes de construir coalizões, e pelo amadorismo de suas assessorias e projetos estapafúrdios. Trump, no entanto, mesmo enfrentando resistência, conseguiu implementar partes relevantes de sua agenda. Milei caminha na mesma trilha, embora enfrente obstáculos ainda mais profundos: detém apenas 15% da Câmara dos Deputados.

Trump promoveu desregulação, caça aos imigrantes, reformas fiscais, guerra com as universidades e cortes radicais no orçamento. Na guerra das tarifas, os resultados alcançados até agora seguem –inclusive para o Brasil– um script claro: blefes e ameaças estapafúrdias seguidas de reestruturação radical vantajosa.

Poesia | Catar feijão, de João Cabral de Melo Neto

 

Música | Carlos Lyra - Minha Namorada