quinta-feira, 7 de agosto de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Encenação no Congresso agride a democracia

O Globo

Parlamentares de oposição prestam desserviço ao país paralisando as sessões em meio à tensão do tarifaço

Na véspera da entrada em vigor do tarifaço de Donald Trump — penalizando o Brasil mais que quase todos os países —, era esperado que o Congresso estivesse empenhado em buscar saídas para atenuar os efeitos negativos. Em vez disso, parlamentares de oposição, revoltados com a prisão domiciliar do ex-presidente Jair Bolsonaro, armaram uma pantomima insólita. Ocuparam as mesas da Câmara e do Senado e, com esparadrapos colados na boca, impediram o início de sessões no plenário.

A obstrução é um dispositivo que faz parte do regimento do Parlamento, mas ocupação e tumulto não. A chantagem da bancada oposicionista não poderia ser mais clara: ou o Parlamento anistia Bolsonaro, réu acusado de tentativa de golpe de Estado no Supremo Tribunal Federal (STF), ou a pauta do Congresso ficará travada. A meta é ajudá-lo a escapar da Justiça de qualquer maneira. Na atual conjuntura, a resposta daqueles que ocupam cargos de comando na República precisa ser serena. O clima do “quanto pior, melhor”, cevado pela investida para livrar Bolsonaro, nada de bom trará ao Brasil.

O modus operandi da família Bolsonaro é conhecido. Os alvos mudam, mas a estratégia é a mesma: fazer todo tipo de pressão para tentar salvá-lo de uma condenação praticamente inevitável diante das provas acumuladas. Nos Estados Unidos, o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) tentou convencer a Casa Branca a impor sanções contra o ministro do Supremo Alexandre de Moraes, visto como nêmesis pelo bolsonarismo. Colheu como resultado não apenas isso, mas um tarifaço que traz prejuízo a todo o Brasil. “Dou graças a Deus que ele [Trump] voltou suas atenções para o Brasil”, disse ao GLOBO. “Acho que tem valido a pena.”

Não foi sua única declaração estapafúrdia. Eduardo confirmou querer provocar nova reação do governo Trump diante da prisão domiciliar do pai e ameaçou abertamente as lideranças do Congresso: “Uma vez que não é pautado o impeachment do ministro Alexandre de Moraes no Senado, uma vez que o presidente da Câmara não pauta anistia, eles estão entrando no radar das autoridades americanas. As pessoas que estão em posição de poder têm responsabilidades e estão sendo observadas pelas autoridades americanas”.

É evidente que as decisões de Moraes não estão imunes a críticas — e têm sido defendidas e criticadas por juristas respeitáveis. Mas seus eventuais desvios precisam ser corrigidos dentro dos ritos jurídicos apropriados, não com ameaças ou encenações no Congresso. Vale lembrar: Bolsonaro ainda não foi condenado. Tem — e terá — toda oportunidade de se defender no processo.

As lideranças parlamentares têm respondido com a devida calma ao furor da bancada bolsonarista. Pautas descabidas, como anistia a golpistas, seguem na gaveta. Em nota oportuna, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), fez um chamado à serenidade, pedindo civilidade e diálogo. Marcou para hoje a retomada das sessões, de forma remota. O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), lembrou que não cabe a ele avaliar decisões judiciais. Sem ceder à chantagem, ameaçou suspender o mandato dos rebeldes e, depois de muita negociação, conseguiu abrir a sessão no plenário ontem à noite. Ambos estão certos. Regras e caminhos institucionais são claros e precisam ser respeitados. A balbúrdia só interessa a quem despreza a democracia.

Sobre o conceito de partido político – Antonio Gramsci*

Quando se quer escrever a história de um partido político, deve-se enfrentar na realidade toda uma série de problemas muito menos simples do que aqueles imaginados, por exemplo, por Robert Michels, considerado um especialista no assunto O que é a história de um partido? Será a mera narração da vida interna de uma organização política, de como ela nasce, dos primeiros grupos que a constituem, das polêmicas ideológicas através das quais se forma seu programa e sua concepção do mundo e da vida? Tratar-se ia, neste caso, da história de grupos intelectuais restritos e, em alguns casos, da biografia política de uma individualidade singular. Portanto, a moldura do quadro deverá ser mais ampla e abrangente. Será preciso escrever a história de uma determinada massa de homens que seguiu os iniciadores, sustentou-os com sua confiança, com sua lealdade, com sua disciplina, ou que os criticou "realisticamente", dispersando-se ou permanecendo passiva diante de algumas iniciativas. Mas será que esta massa é constituída apenas pelos adeptos do partido? Será suficiente acompanhar os congressos, as votações, etc., isto é, todo o conjunto de atividades e de modos de existência através dos quais uma massa de partido manifesta sua vontade? Evidentemente, será necessário levar em conta o grupo social do qual o partido é expressão e a parte mais avançada: ou seja, a história de um partido não poderá deixar de ser a história de um determinado grupo social. Mas este grupo não é isolado; tem amigos, afins, adversários, inimigos. Somente do quadro global de todo o conjunto social e estatal (e, frequentemente, também com interferências internacionais) é que resultará a história de um determinado partido; por isso, pode-se dizer que escrever a história de um partido significa nada mais do que escrever a história geral de um país a partir de um ponto de vista monográfico, pondo em destaque um seu aspecto característico. Um partido terá maior ou menor significado e peso precisamente na medida em que sua atividade particular tiver maior ou menor peso na determinação da história de um país. Desse modo, é a partir do modo de escrever a história de um partido que resulta o conceito que se tem sobre o que é um partido ou sobre o que ele deva ser. O sectário se exaltará com os pequenos fatos internos, que terão para ele um significado esotérico e o encherão de entusiasmo místico; o historiador, mesmo dando a cada coisa a importância que tem no quadro geral, acentuará sobretudo a eficiência real do partido, sua força determinante, positiva e negativa, sua capacidade de contribuir para a criação de um acontecimento e também para impedir que outros acontecimentos se verificassem.

*Antonio Gramsci (1891-1937), Cadernos do Cárcere. V.3 P.87. Civilização Brasileira, 207

Faça o que eu faço - Merval Pereira

O Globo

A negociação terá de ser entre ministros e secretários, porque Trump não abandonará a parte política

O que o ex-presidente Jair Bolsonaro sonhava fazer, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, está fazendo, sem contestação relevante. Impressionante como são parecidos na ânsia de destruir as bases institucionais estabelecidas nos anos pós-Segunda Guerra como linha mestra da maneira ocidental de ver o mundo. A paranoia de que o comunismo espreita o Ocidente, se infiltra nos meios estudantis, intelectuais, artísticos e científicos é a mesma. Daí a necessidade de desmontar a estrutura estabelecida e recomeçar do zero, ou até não recomeçar.

Nos Estados Unidos, os setores de pesquisa e tecnologia sofrem grande abalos e cortes de gastos, assim como a educação, destruindo fatores importantes para o avanço da produtividade da economia americana. A imprensa, como sempre acontece em governos autoritários, tem de enfrentar os arreganhos dos presidentes — como foi Bolsonaro durante seu “reinado”, e como hoje é Trump.

Escolhas - Malu Gaspar

O Globo

A prisão domiciliar de Jair Bolsonaro desencadeou um debate intenso no meio jurídico, incendiou o Congresso Nacional e botou o Supremo Tribunal Federal (STF) em alerta, à espera de mais represálias vindas dos Estados Unidos. Em paralelo, deu-se um curioso consenso em torno da inevitabilidade da prisão. Por esse raciocínio, Alexandre de Moraes não tinha outra escolha, uma vez que o ex-presidente foi além do limite na afronta às instituições. Prender Bolsonaro era a única alternativa disponível para proteger a soberania nacional dos ataques da extrema direita.

De que Bolsonaro testou os limites do Supremo, não há dúvida. É, aliás, o que ele vem fazendo desde o início de seu mandato, especialmente depois de perder as eleições e mais ainda durante as investigações da trama golpista. Tão certo quanto isso, porém, é que Alexandre de Moraes tinha, sim, escolha. Sempre teve, mas nem sempre fez as melhores.

A armadilha do STF- Julia Duailibi

O Globo

Quem ajuda Bolsonaro a se vitimizar é o próprio Supremo, ao ignorar a contenção e escorregar nas cascas de banana

O próximo presidente do STF, Edson Fachin, disse nesta semana que o “Supremo Tribunal Federal não é o árbitro exclusivo do jogo democrático” e que “a vitalidade democrática brasileira exige que todos os atores — Executivo, Legislativo, partidos, imprensa e sociedade civil — atuem com contenção e dentro das regras do jogo”.

Não fosse o atual contexto político-criminal, a reflexão, feita numa palestra, poderia soar como uma obviedade sobre freios e contrapesos de democracias funcionais e independência dos Poderes, herança do Iluminismo francês prevista em nossa Constituição. Ela nos leva, porém, a uma incontornável discussão sobre a contenção dos Poderes. No caso, do próprio STF.

Muito além da economia - Míriam Leitão

O Globo

A bomba tarifária dos Estados Unidos, com estímulo da extrema direita, vai além da economia: é chantagem política contra a nossa democracia

Tudo o que temos vivido nos últimos dias é tão absurdo que, às vezes, parece irreal. O Brasil está sendo atacado pelos Estados Unidos com a maior tarifa que aquele país impôs aos seus parceiros, exigindo em troca não uma abertura da economia brasileira, mas a interrupção de uma ação penal contra quem tentou um golpe de Estado no Brasil. O governo brasileiro com seu plano de contingência quer mitigar os danos de setores e empresas, e é isso mesmo que ele deve fazer. Mas a economia vai sentir o impacto, algumas empresas podem não sobreviver, empregos serão perdidos. Segundo a CNI, as tarifas adicionais dos EUA afetam 77,8% das exportações brasileiras ao país.

Lula precisa encontrar um ponto de equilíbrio entre os EUA e a China - Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

Havia um certo consenso nacional e continuidade em torno da política externa brasileira pós-redemocratização, a partir do governo de Sarney, que restabeleceu as relações com Cuba e a China. Bolsonaro rompeu essa tradição

Se imaginarmos um triangulo ligando o Brasil aos Estados Unidos e à China, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva precisa traçar uma bissetriz entre os dois países que possibilite achar um ponto de equilíbrio e sair do impasse em que se encontra, a partir de relações bilaterais com o presidente Donald Trump, que hoje não existem, e com o presidente Xi Jinping, cada vez mais próximas. O multilateralismo, no curto prazo, não dá conta de evitar a escalada da crise.

Na geometria, um triângulo possui dois tipos de bissetrizes: internas e externas. Para não complicar a analogia, o que nos interessa aqui é o ponto de encontro das bissetrizes internas do triangulo. Imagine uma circunferência dentro do triângulo — seu centro é equidistante de todos os lados. Por isso, é chamado de “incentro”. Bissetrizes são traçadas com régua e compasso; na política, é muito mais difícil achar esse ponto de equilíbrio e equidistância.

Reação de presidentes da Câmara e Senado demorou muito - César Felício

Valor Econômico

Câmara abriu sessão com uma pauta cheia de assuntos irrelevantes

A potestade do cargo é o principal ativo que os presidentes da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), têm para negociar com os parlamentares que bloqueiam desde terça-feira as duas Casas do Congresso, exigindo a votação do tal “pacote da paz”. Demoraram muito, mais de 24 horas, para exercerem o peso de suas cadeiras.

Esse poder só começou a ser exercido na noite de quarta. Somente às 22 horas Hugo Motta conseguiu retomar, de forma precária, o controle da Casa que preside. O motim bolsonarista teve início na terça. As notas de Alcolumbre e Motta divulgadas na ocasião, em vez de esvaziarem a crise, insuflaram-na. Na sua nota oficial de terça, Alcolumbre disse logo na segunda linha que “a ocupação das mesas diretoras das Casas, que inviabilize (sic) o seu funcionamento, constitui exercício arbitrário das próprias razões”. Alcolumbre criticou os bolsonaristas, mas admitiu que a manobra extremista atingia um de seus objetivos, inviabilizar o andamento do Congresso Nacional.

O 8 de janeiro dos paletós devolve a bola para Lula - Maria Cristina Fernandes

Valor Econômico

Ameaça bolsonarista contra Centrão devolve protagonismo ao presidente

O 8 de janeiro dos paletós que ocupou o Congresso Nacional sepultou de uma vez por todas o dueto entre bolsonaristas e o Centrão que, até aqui, capitaneou os maiores emparedamentos do governo.

É a MP de isenção do IR que pode perder a validade, mas o episódio, por paradoxal que possa parecer, marca a possibilidade de o Executivo retomar a posse da bola. O bolsonarismo havia até respirado com a prisão domiciliar do ex-presidente que fez com que um réu por tentativa de golpe de Estado fosse exibido como paladino da liberdade de expressão. Ao afrontar o comando das Casas, porém, os aliados do ex-presidente voltaram a unir os três Poderes.

Com um Supremo Tribunal Federal ainda agastado pelas divisões em torno das decisões do ministro Alexandre de Moraes no caso e com os presidentes das Casas desafiados pelos próprios pares, é o presidente Luiz Inácio Lula da Silva quem recobra, em pleno embate com o chefe de Estado mais poderoso do mundo, a posse da bola.

Procuram-se engenheiros para fazer política - Nelson Niero

Valor Econômico

Mensagens de Donald Trump em rede social, entrevistas e a carta enviada a Luiz Inácio Lula da Silva já haviam deixado escancarado que o cerne da questão é político

A crise das tarifas está obrigando a classe empresarial a recuperar o lugar de destaque que já teve em outros momentos cruciais da história brasileira. A taxação do governo americano ao Brasil, que entrou em vigor ontem, desenha consequências drásticas para a economia, o que clama por um protagonista que nas últimas décadas parece ter se contentado com o segundo plano.

Diante da inépcia do governo, num momento de desarranjo institucional, com um Judiciário hipertrofiado e um Legislativo alheio, o poder econômico foi chamado a assumir a posição de negociador. Os líderes do setor privado não têm mais como fugir dessa concertação. Eles terão, no entanto, que arrumar estômago para enfrentar uma questão política, mais do que comercial, apesar do desconforto visível com o tema.

Sem saída visível para a crise - William Waack

O Estado de S. Paulo

Não há saída visível para a crise que apanhou o Brasil, pois o que cada um entende por “pacificação” ou “acomodação” significa a rendição do outro. Isso vale também para o precaríssimo estado das relações entre Brasil e Estados Unidos.

Um fato inédito é o componente internacional na crise doméstica brasileira, pois uma corrente política interna está contando com a ajuda de uma potência estrangeira para atingir seus objetivos – e os da potência. Eles equivalem na prática a um “regime change” no Brasil.

Trump está comandando o show em torno da sua visão de que o Brasil não vive um regime democrático. Mas, sim, uma ditadura de toga que persegue adversários políticos e prejudica interesses econômicos das big techs – além de se alinhar ao grande adversário geopolítico dos EUA, a China.

Não há como o Estado brasileiro ceder a esse tipo de demanda, salvo render-se. A crise expôs um Brasil vulnerável, despreparado para situações de emergência e com um governo incapaz de enxergar a natureza e a gravidade do contexto, preocupado sobretudo com obtenção de vantagens político-eleitorais. E seus cacoetes ideológicos de sempre.

Cabo de guerra no Supremo - Carolina Brígido

O Estado de S. Paulo

Críticas a Moraes no Supremo não tiram dele maioria nas votações sobre trama golpista

Não foi boa a reação de ministros do Supremo Tribunal Federal à decisão de Alexandre de Moraes de prender Jair Bolsonaro. Nos bastidores, a medida foi considerada desnecessária neste momento, com potencial para escalar duas crises: a do tribunal com o Congresso e a do Brasil com os Estados Unidos.

A expectativa no STF é de que os EUA apliquem sanções com base na Lei Magnitsky a outros ministros e também a autoridades brasileiras. A partir da prisão de Bolsonaro, ministros aguardam punições que atinjam o bolso deles, com restrições financeiras ainda maiores que as impostas a Moraes.

Outro impacto da prisão de Bolsonaro é o aumento da pressão política sobre a Corte às vésperas do julgamento do ex-presidente. Na visão de alguns ministros, o ideal teria sido Moraes ignorar a isca jogada pelo réu e deixá-lo em liberdade até o veredicto, previsto para setembro.

Protecionismo não só para o comércio - Celso Ming

O Estado de S. Paulo

É pouco dizer que o presidente Donald Trump abandonou a defesa e a prática do livre comércio, um dos fundamentos da doutrina neoliberal capitalista. Ele passou a usar o até recentemente inominável protecionismo do sistema produtivo e do comércio global para outras finalidades, como base de seu jogo político e geopolítico.

Ao contrário do que vinham afirmando alguns analistas, que previram um tiro no pé com o tarifaço, o presidente Trump tem obtido inegável sucesso, pelo menos até agora. Países e blocos de países poderosos têm engolido, com certo conformismo, a imposição de tarifas alfandegárias predatórias sobre sua economia. E, se o bumerangue se voltar contra a economia dos Estados Unidos, isso pode levar algum tempo.

Moraes simboliza o pavor da direita diante do pênalti - Marcos Augusto Gonçalves

Folha de S. Paulo

Apesar de erros, ministro não cede à cultura política acomodatícia do país no processo de Bolsonaro e militares golpistas

O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes causou grande alvoroço e afetação entre setores da opinião pública, da direita e do bolsonarismo ao determinar a prisão domiciliar de Jair Bolsonaro por descumprimento de medidas cautelares aprovadas pelo tribunal.

Chamado de censor e tirano, e alvo de uma tremenda palhaçada de trumpistas no Congresso, o ministro pareceu de uma hora para outra ser o inimigo público número um da livre expressão e da democracia no Brasil.

O magistrado é muitas vezes tratado enviesadamente como se tomasse medidas apenas monocráticas, sem respaldo de colegiado da corte, ao sabor de seus humores. É certo que há reparos a fazer ao STF e particularmente a Moraes, cujo temperamento justiceiro, como já se comentou aqui, poderia e deveria ser domado. São muito escassas, além disso, para dizer o mínimo, as habilidades políticas por ele demonstradas.

O freio conservador do eleitor brasileiro – Maria Hermínia Tavares

Folha de S. Paulo

Conservadorismo do eleitor limita o que se pode dizer em campanhas e fazer no governo

Não é de hoje a ideia de que no Brasil predomina uma cultura política conservadora. Os políticos tradicionais dela sempre tiraram inspiração para seus programas e discursos. Mas o assunto ganhou fôlego quando a direita radical, em ascensão, alçou a segurança pública, assim como os valores e comportamentos privados, para o primeiro plano da disputa com os progressistas.

Baseado em pesquisas dos últimos 15 anos, o Instituto Ipsos-Ipec vem medindo, desde 2010, a força da disposição conservadora na população brasileira —um traço cuja existência poucos contestam.

Elite econômica é conivente com a agressão de Trump e dos Bolsonaro – Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

No curto ou no longo prazo, não se vê ação para conter destruição institucional

Vamos supor que Donald Trump decida agredir o Brasil um tanto mais, como acaba de fazer com a Índia e como o faz com o Canadá: por política imperial. Suponha-se que impostos de importação aumentassem para níveis de embargo caso o Brasil continuasse a comprar diesel ou fertilizante russos.

O que fazer? Dar o comércio com os Estados Unidos como perdido (o que também afetaria investimentos aqui) e manter as compras russas? O que diriam empresas que exportam para os EUA? Aceitariam o custo de o Brasil manter as importações críticas de fertilizantes? Essas são as ameaças de hoje. Mas o mundo de Trump e suas sequelas vão durar.

A ameaça para a economia da Lei Magnitsky contra Moraes – Adriana Fernandes

Folha de S. Paulo

Não se descarta a possibilidade de uma complementação da ordem disparada pelo governo Trump contra o ministro do Supremo

Não é exagero dizer que parte dos participantes do mercado financeiro no Brasil está hoje mais preocupada com o impacto de uma aplicação rígida da Lei Magnitsky contra o ministro Alexandre de Moraes para as empresas brasileiras do que com o tarifaço em si.

A punição a Moraes não é um problema só para os bancos e muito menos restrito às dúvidas se o ministro do STF pode ou não fazer compras usando cartão de crédito internacional de bandeiras americanas.

Bolsonaro não é réu qualquer - Conrado Hübner Mendes

Folha de S. Paulo

Restrição à liberdade de expressão não é ilegal, leniência à sua libertinagem é

A obra intelectual de Jair Bolsonaro se encerra em mais ou menos cinco linhas:

"Devia ter matado uns 30 mil. O erro foi torturar e não matar. Não estupro porque não merece. Vou legalizar milícias. Não sou coveiro. A minoria tem que se curvar à maioria. O afrodescendente mais leve pesava sete arrobas. Rolou um clima. Dirás a verdade. Fake news faz parte da vida. Fora, Folha! Sou perseguido. Ficar em casa é para os fracos. A Constituição sou eu. Não vou mais obedecer. Amo a liberdade."

O pensamento oral de Bolsonaro gozou do mais extravagante regime da liberdade de expressão que se tem notícia para um homem público no país. Sempre foi duvidosa sua constitucionalidade.

Violava a lei, mas o STF (Supremo Tribunal Federal) se acostumou a liberá-lo com base na seguinte teoria: "apesar da grosseria e da vulgaridade, não parece ter extrapolado limites". Essa síntese da leniência jurídica foi de Alexandre de Moraes.

Na rendição do Japão, o medo do comunismo foi tão eficaz quanto bombas atômicas – João Pereira Coutinho

Folha de S. Paulo

Obra de Richard Overy lembra que Hiroshima e Nagasaki não foram casos isolados e leva leitor ao centro do poder nipônico

Para efeitos dramáticos, o céu deveria estar cinzento, e uma chuva pequena, triste, deveria molhar a Terra. Não é o caso. Céu azul, iluminado por um Sol generoso —e, aqui embaixo, famílias e crianças e amigos vivendo o dia na cidade.

A cidade é Hiroshima. Estou sentado em frente à Cúpula da Bomba Atômica, um edifício construído pelo arquiteto tcheco Jan Letzel em 1915. É um dos poucos edifícios que ficaram de pé depois da explosão daquele dia 6 de agosto de 1945 —faz hoje 80 anos.

As casas de Hiroshima eram, na maioria, construções frágeis de madeira, facilmente pulverizadas pela explosão. O edifício de Letzel, com sua cúpula de cobre, era feito de concreto e metal. Como a explosão ocorreu diretamente acima, a 600 metros do solo, o edifício absorveu o impacto e resistiu.

Jogando Bolsonaro ao mar – Ruy Castro

Folha de S. Paulo

A fim de um Reich planetário, Trump tem muito a fazer para se preocupar com alguém que ele só viu duas vezes

Já aconteceu antes. Era uma vez um político que, legitimamente eleito, vestiu a farda de ditador e tentou impor ao mundo seu estilo de governar —intimidar, dividir, desestabilizar, perseguir, humilhar, subjugar, expulsar e tocar o terror. Com que fim? O de estabelecer sua bolha, expandir sua dominação, consolidar seu poder. Para isso, valeu-se também de recuar, contradizer-se, abandonar parceiros e parecer imprevisível —como alguém pode se defender se não sabe como será o ataque?

Poesia | Charles Baudelaire - Elevação (de As flores do mal)

 

Música | A Paz - Gilberto Gil