Thais
Carrança / BBC News Brasil em São Paulo
De
olho nas eleições de 2026, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem
incentivos para não retaliar as tarifas impostas por Donald Trump ao Brasil e colher os frutos
de uma inflação mais baixa no país, avalia o
economista Samuel Pessôa, pesquisador do banco BTG Pactual e do Instituto
Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre).
"Do
ponto de vista puramente do cálculo eleitoral, Lula tem um incentivo a não
retaliar, porque, se ele não retaliar, tem aí uma desinflaçãozinha a médio prazo",
diz Pessôa, em entrevista à BBC News Brasil.
"A
retaliação pode, eventualmente, ser um instrumento de barganha. Mas, se a gente
se enxerga com pouco poder de barganha, do ponto de vista do interesse do bem
estar brasileiro, é melhor não retaliar", defende.
Para
Pessôa, a perspectiva de desinflação no Brasil pouco muda com a possibilidade
aventada pelo secretário de Comércio americano, Howard Lutnick, na terça-feira
(29/07), de que alguns produtos não cultivados nos EUA, como café e manga,
possam ter a tarifa de importação zerada.
Em
junho e antes do anúncio do tarifaço de Trump, o economista da FGV havia
escrito em sua coluna semanal na Folha de S.Paulo que Lula deve chegar às
eleições de 2026 com a economia em boa forma. Agora, mesmo com as tarifas, Pessôa
avalia que a economia deve jogar a favor do petista na corrida eleitoral.
"Continuo
com o meu cenário, que é um cenário de 'pouso suave'. A economia vai
desacelerar — esse ano deve crescer uns 2%, ano que vem deve crescer 1,5%, uma
desaceleração com relação aos 3% de crescimento no biênio anterior",
calcula.
"Mas
essa é uma desaceleração que não chega a machucar muito o mercado de trabalho.
E, com as boas safras, a inflação de alimentos está cedendo. Eu acredito que as
tarifas de Trump não mudam esse cenário."
Para
Pessôa, faz sentido o governo socorrer os setores mais afetados pelas tarifas
através de um crédito extraordinário para além dos limites do arcabouço fiscal, ainda que isso piore a situação
das contas públicas do país.
Mas,
segundo o economista, é fundamental que essa política traga limites claros para
seu término, evitando se tornar um "direito adquirido".
"Tivemos
recentemente o caso do Perse, programa desenhado para atender as empresas do
setor de eventos, muito atingidas pela pandemia. Mas três anos depois do fim da
pandemia, a gente estava discutindo no Congresso, até o ano passado, a
manutenção do Perse. É uma coisa maluca", afirma.
"No
Brasil, a gente transforma tudo em direito adquirido rapidamente. Então, dada
essa especificidade nossa, o cuidado maior no desenho desse programa é que a
previsão do fim dele tem que estar muito clara."
À
BBC News Brasil, Pessôa comentou ainda o acordo entre Trump e União Europeia — ele
considera que os europeus "ajoelharam no milho" frente ao americano.
E
explicou por que o presidente chinês, Xi Jinping, pode ser mais
duro nas negociações com Trump do que seus pares de países democráticos; além
de discordar respeitosamente do Nobel de Economia Paul Krugman, que em
entrevista recente à BBC News Brasil, defendeu que o Brasil tem pouco a perder retaliando Trump.
Confira
abaixo os principais trechos da entrevista.