terça-feira, 21 de dezembro de 2010

A língua e as chuteiras de Lula:: Fernando de Barros e Silva

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

SÃO PAULO - Dilma Rousseff tem se mantido reclusa. Um pouco, talvez, por vocação e mais, certamente, para não dar nenhum sinal de que pretende desviar os holofotes do gran finale do padrinho. "Deixa o homem brilhar" -a ideia é essa.

De Lula não se esperaria nenhum comedimento verbal, sobretudo neste momento. Chama atenção, apesar disso, a maneira desabrida com que ele admite a hipótese de retornar à Presidência, na entrevista que concedeu ao jornalista Kennedy Alencar, da Folha, no programa "É Notícia", da RedeTV!.

"Eu não posso dizer que não porque eu sou vivo, sou presidente de honra de um partido, sou um político nato", diz Lula, alimentando especulações sobre 2014 antes mesmo de transmitir a faixa. Mais adiante, porém, ele afirma: "Quero tirar tudo da Presidência de dentro de mim. Preciso voltar a ser o Lula".

As frases soam francamente contraditórias. E servem, obviamente, menos para iluminar o futuro do que para medir a ambivalência de Lula ao tratar da sua saída de cena. Vai ou não vai desencarnar?

O dilema psicológico de Lula pode ser até muito interessante, mas o que importa ao país é a sinalização política que dele resulta. Lula constrange sua pupila quando afirma: "Vamos trabalhar para a Dilma fazer um bom governo e quando chegar a hora a gente vê o que vai dar".

Mais explícita, ou desafiadora, só a colocação de Gilberto Carvalho, homem da confiança extrema de Lula, já nomeado secretário-geral da Presidência: "A minha opinião é que ele vai ficar olhando a conjuntura. Se houver dificuldades, e ele for a solução para a gente ter uma vitória, ele pode voltar", disse, ao jornal "O Globo".

É quase certo que Lula será invocado, de forma saudosa, por ministros, por governadores, talvez pelo próprio povo, em algum ou em vários momentos do futuro governo. Mau sinal é que esse movimento comece insuflado pelo próprio Lula, de forma tão explícita, antes mesmo de ele pendurar as chuteiras.

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