Valor Econômico
Oposição fica amarrada pela divisão da direita e aposta na resposta da Casa Branca
O enquadramento na Lei Magnitsky não deteve
o ministro Alexandre
de Moraes. Quando o julgamento, com provável condenação do
ex-presidente Jair Bolsonaro, acontecer, o réu já estará preso
em casa. Pela escalada, não se pode descartar que, até lá, haja uma prisão
preventiva.
A progressão deste caso mostra que os descumprimentos não têm se dado
pelos deslocamentos de Bolsonaro, mas pelo uso que o ex-presidente, seus
familiares e apoiadores fazem das redes sociais, que o
ministro havia vedado na decisão anterior.
O cerceamento a essas publicações não tem se mostrado eficaz e nada indica que, com Bolsonaro agora em prisão domiciliar, outras mensagens suas não venham a ser veiculadas. É uma encruzilhada. A escalada empurra Moraes a dobrar a aposta e alimentar, na oposição, inclusive naquela que tem assento na Casa Branca, a acusação de que está a afrontar a liberdade de expressão.
Bolsonaro foi colocado em prisão
domiciliar por descumprir
medidas cautelares relativas ao processo a que responde por tentativa de golpe,
mas, na decisão, o ministro deixa claro que começou a agir no sentido que havia
prenunciado na sexta-feira, o de que Bolsonaro se vale dos mesmos métodos do golpismo
para insuflar Donald Trump contra o Brasil.
Em várias passagens de sua
decisão, Moraes cita os agradecimentos de familiares do ex-presidente,
apoiadores e manifestantes do domingo ao governo americano pelas medidas contra
o Brasil. Trump já recuou nas sanções, mas o inferno é
seu limite e o governo não descarta novas retaliações. Quanto a Moraes,
para ir além da Magnitsky e da
revogação de vistos, Trump terá que apelar ao terrorismo de Estado, o que ainda
parece improvável.
A
reação oposicionista foi limitada em seu alcance pelo próprio bolsonarismo. Ao
atacar governadores ausentes dos atos, os apoiadores do ex-presidente obstruem
ainda mais o caminho já pedregoso da anistia ou do impeachment de ministros do STF porque afastam o
Centrão.
O que não é nada improvável é que
a reação de Trump venha
na investida contra as eleições brasileiras. O empenho do presidente americano
em transformar o Brasil numa comarca eleitoral tem aliados na política, nas
igrejas, nas finanças e até em algumas ruas do país, que passaram a desfraldar
a bandeira americana.
O Tribunal
Superior Eleitoral será presidido, a partir de junho, por
um ministro do Supremo Tribunal Federal, Kassio Nunes Marques, indicado
por Bolsonaro. A atual presidente, ministra Cármen Lúcia, deixará
resoluções para salvaguardar as regras da disputa, mas é Nunes que conduzirá o
julgamento de sua efetividade. E não apenas. Estará na função que, em 2022, sob
a titularidade de Moraes, impediu a manobra da Polícia Rodoviária Federal que
poderia ter anulado a eleição.
Daqui
por diante, o cenário das eleições locais não poderá perder de vista o que
acontece nos EUA. É preciso ver o que Trump anda aprontando para não perder as
eleições do próximo ano. Ele vai querer fazer o mesmo por aqui.
As eleições de meio de mandato
nos EUA são aquelas em que são renovadas todas as cadeiras da Câmara e um terço
do Senado. Trump tem uma maioria estreita em ambas as Casas. No seu primeiro
governo, Trump também comandava o Congresso até 2018, quando perdeu a Câmara,
precipitando sua derrota à reeleição dois anos depois. O tarifaço só tem
prejudicado suas condições para manter essa maioria. Assim, restam-lhe as
alternativas para mitigar a elegibilidade dos eleitores de oposição e a
representatividade dos distritos em que eles votam.
Ele começou cedo. Baixou decretos
obrigando Estados a fazer novas comprovações de cidadania para o registro
eleitoral, requereu listas eleitorais de Estados onde esta maioria está em
disputa, redesenhou os distritos do Texas, projetando um avanço republicano
sobre cinco cadeiras democratas, e requereu acesso às máquinas de votação.
A cama está armada para Trump,
se perder as disputas de meio de mandato, logo após o segundo turno do Brasil,
contestar o resultado. A investida contra o STF e, particularmente, sobre
Moraes é a exportação do que ele tem feito por lá.
Em decisão recente, a Suprema Corte daquele país, de maioria governista,
restringiu o poder de juízes distritais de refrear a agenda presidencial.
Depois de ganhar suas primeiras batalhas na justiça, bastiões da resistência,
como a Universidade de Harvard, por exemplo, já foram obrigados a alguns recuos
sob pena de congelamento de recursos federais. A pressão se estende à imprensa,
ameaçada por processos em temas como a rede de pedofilia de Jeffrey Epstein.
Não se deve esperar que Trump
esqueça o Brasil. Estava brigando com muita gente grande quando se lembrou de
colocar o país no topo de suas maldades. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva alterna-se
entre a moderação e a provocação. No domingo, disse que a briga tem um limite e
que continua a buscar uma alternativa ao dólar.
As batalhas de Lula estão longe
de se encerrar com Trump. Se sua imagem internacional hoje está lustrada com este
embate, poderá ficar seriamente abalada com um fracasso na COP provocado pela
ausência de infraestrutura. Nas manifestações bolsonaristas de domingo, a única
personagem do bolsonarismo que não se meteu nessa confusão, a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro,
representou o marido em Belém, vitrine ou vidraça contratada de Lula.
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