domingo, 30 de dezembro de 2018

José Roberto Mendonça de Barros: Voltaremos a crescer?

- O Estado de S. Paulo

É imperioso que o Brasil abrace uma ambiciosa agenda de crescimento da produtividade

O Brasil precisa, e muito, voltar a crescer. Mas crescer de forma sustentável.

Nesses últimos tempos, aprendemos de forma muito doída que não adiantam alguns anos de bonança seguidos por queda forte da atividade, como em 2015 e 2016.

Na verdade, a história moderna do País teve duas fases bem distintas. A partir de 1930, o Brasil cresceu muito, aproveitando-se de choques externos e da transferência em escala crescente de trabalhadores do setor primário para as cidades, nas quais a produtividade média das atividades era maior.

Em consequência, entre 1950 e 1980 o PIB cresceu em média 7,4% ao ano, um desempenho muito melhor do que a média internacional (esses dados são do saudoso Régis Bonelli).

Mas não foi só isso: a qualidade do crescimento foi significativa pois, além da incorporação de mais mão de obra ao processo produtivo e do incremento do estoque de capital, a eficiência com que eram combinados na produção se elevou sistematicamente ao longo do tempo. Esse parâmetro de eficiência é conhecido na literatura como Produtividade Total dos Fatores (PTF), que cresceu 2% ao ano neste período.

Esses resultados geraram um otimismo significativo: o País era visto como uma região que estava condenada a crescer. Entretanto, a lição de uma geração foi que isso não era verdade. Ao longo dos anos 80, o Brasil meio que parou, o que permanece até hoje.

De 1980 até 2016, o crescimento médio do PIB foi de apenas 2,2%. Em 2017 e 2018, nem isso. Além disso, alternaram-se períodos de estagnação ou mesmo de queda e alguns anos de bom crescimento. A produtividade (PTF) despencou para próximo de zero, o que significa que o padrão de vida da população passou a crescer muito lentamente.

Curiosamente, o setor agropecuário passou a crescer com base na elevação de produtividade, muito superior à do setor urbano, num movimento oposto àquele dos anos 50.

Aprendemos que o crescimento não é automático, mas um processo tenso, no qual a solução de uma questão abre pelo menos dois desafios. Daí o processo é uma construção, que tem elementos gerais (como estabilidade macro e investimentos) e soluções historicamente datadas (transição demográfica e energética, por exemplo), pois o mundo está sempre em mutação.

Na verdade, é até mais exigente, pois o que funciona num determinado período como estímulo pode não funcionar mais à medida que o mundo evolui. Por exemplo, no final dos anos 50 e depois, pressões inflacionárias começaram a corroer as perspectivas de crescimento, o que levou à necessidade de um programa de ajuste no início dos anos 60.

Da mesma forma, a alta dos preços reapareceu após 1973, gerando novos desequilíbrios, agora agravados pela utilização generalizada dos mecanismos de correção monetária. Choques externos derivados da criação da Opep acabaram por implodir a fase do crescimento acelerado, resultando no período que permanece até hoje, no qual não conseguimos sustentar o desenvolvimento. Em particular, ao longo dos anos 80, o processo de inflação se tornou recorrente e disfuncional.

Então veio a segunda lição: da mesma forma que nosso País não está condenado a crescer, desequilíbrios macroeconômicos recorrentes terminam em crise, cujos mecanismos sempre ocorrem através da inflação, do estrangulamento externo e/ou de crise fiscal, como hoje.

Finalmente, a terceira lição: o desenvolvimento econômico só ocorre e se sustenta através do crescimento persistente da produtividade. Aqui, sim, temos uma encrenca das grandes, na medida em que não só a TPF cresceu muito pouco de 1980 em diante, como caiu pesadamente no período recente.

Esse fenômeno não decorre apenas de condições macroeconômicas adversas, e de outras políticas. A verdade é que boa parte dos agentes não busca ativamente novas formas de aprimorar a produção. Ao contrário, muitas empresas e seus representantes dão maior atenção a viagens à Brasília do que ao aprendizado de novas tecnologias.

Falo isso a partir do que leio, vi e vejo em 40 anos intensos de consultoria. Também com base nessa experiência, posso afirmar que, no agronegócio, a realidade é oposta: desde pequenos agricultores até as maiores empresas, passando por universidades, cooperativas e entidades de pesquisa, todos são obcecados por novas técnicas e elevação da produtividade.

Por isso, não é de se surpreender que a PTF do setor agrícola tenha crescido 2% ao ano, de 1970 a 2006 (cálculo de Giovanna Mendes e outros). No Estado de São Paulo, a PTF cresceu mais: 2,6%, de 1970 a 2014, tendo acelerado no período mais recente, 1994 a 2014, para 3,2% (cálculos de Paulo F. Cidade de Araújo e outros).

É imperioso que o Brasil abrace uma ambiciosa agenda de crescimento da produtividade. Essa agenda deve conter, pelo menos, os seguintes elementos:

– Enfrentar, definitivamente, a questão da qualidade da educação formal;

– A qualidade do capital disponível tem de se elevar através do aumento de investimento na infraestrutura, especialmente de logística, que tem um impacto absolutamente generalizado na produção de todos os setores;

– Uma reforma tributária que tenha lógica econômica e reduza pesadamente os custos das empresas devotadas ao entendimento e atendimento da legislação;

– Políticas de melhora do ambiente de negócios;

– Finalmente, políticas de suporte para que nossa indústria avance na direção das novas tecnologias digitais denominadas genericamente de Indústria 4.0.

Não teremos crescimento sustentável sem um avanço significativo na qualidade dos fatores de produção, na ampliação do conhecimento e na elevação da eficiência com que combinamos capital e trabalho na produção.

Esta é uma agenda de todos, e não apenas do governo. É, simplesmente, o que irá garantir o nosso futuro.
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Economista e sócio da MB Associados

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