sábado, 22 de fevereiro de 2025

Justiça histórica - André Gustavo Stumpf

Correio Braziliense

É o momento de pegar a possibilidade de produzir petróleo no extremo norte como forma de levar progresso àqueles brasileiros que viveram isolados e esquecidos pelos brasileiros do sul nos últimos séculos

Quando o Brasil alcançou sua independência de Portugal, a colônia lusitana na América do Sul era dividida em duas partes. No norte, o Grão Pará e Maranhão era separado da colônia do Brasil e mantinha relacionamento diplomático e comercial direto com Lisboa. Não dependia do Rio de Janeiro para nada. No entanto, o imperador Pedro I fez questão de colocar toda a Amazônia dentro de seu país que estava nascendo em 1822. Mandou o almirante Cochrane resolver o assunto. Ele enviou seus navios, ameaçou bombardear e arrasar Belém. Assim foi feito. A Independência do Brasil, no Pará, ocorreu em agosto de 1823.

Antes disso, o Brasil era uma colônia que produzia ouro nas províncias de Mato Grosso, Minas Gerais e Goiás, depois de dois séculos de produção de açúcar no Nordeste. O novo país cresceu a oeste da linha de Tordesilhas, numa fronteira aberta em que os espanhóis não exerciam qualquer tipo de fiscalização. Os bandeirantes e pioneiros foram até os pontos mais extremos da Amazônia. Pedro Teixeira subiu o Rio Amazonas (1637) e chegou a Quito, no Equador, de onde foi, educadamente, convidado a se retirar. Na volta, depois de descer dos Andes, tomou posse daquela vastidão verde, em nome de El Rey de Portugal. O Tratado de Madri, negociado por Alexandre de Gusmão em 1750, concedeu ao país toda a área a oeste da linha de Tordesilhas. 

A Amazônia brasileira nasce dessas ações individuais e dos desejos de poder do imperador. Desde a Independência do Brasil até a inauguração de Brasília, em 1960, Belém era uma cidade isolada no norte do país, só alcançável por avião ou navio. Manaus desfrutou de grande prestígio na época da borracha, mas os ingleses, que frequentavam a região há muito tempo, levaram mudas de seringueiras para a Ásia, onde as plantas cresceram e enriqueceram os produtores de borracha para a indústria automobilística recém-criada nos Estados Unidos.

Afirmar que a Amazônia está hoje invadida por traficantes de drogas e outras mercadorias letais não constitui novidade. Os missionários portugueses e italianos, alguns alemães, andaram pelos rios da região, em nome de catequizar índios e coletar minérios valiosos. Henry Ford recebeu do governo do Pará, nos anos 20, gleba de um milhão de hectares no Rio Tapajós, onde ele criou a Fordlândia. O empreendimento não deu certo, e os norte-americanos foram indenizados pelo governo do estado pelas benfeitorias que remanesceram no local. Está tudo lá, até hoje, para quem quiser ver. Há outros empreendimentos de capital estrangeiro na Amazônia. Na Serra do Navio, no Amapá, por exemplo, houve grande extração de minério de manganês. O minério acabou, e os empreendedores foram embora.

Nos anos 60, século passado, era interessante conhecer Belém, uma típica cidade do interior, com suas manias, seu dialeto e uma enorme quantidade de automóveis norte-americanos de última geração. Quem tinha algum dinheiro, na época, tomava o melhor uísque, tinha acesso às roupas dos americanos (calças blue jeans, que não eram fabricadas no Brasil) e a automóveis "rabos de peixe". Eram chamados de cotias porque saiam de dentro do mato. Quem podia enfrentar a viagem de avião até Belém retornava carregado de produtos estrangeiros. O contrabando corria solto na cidade.

Vale a pena lembrar a história da Amazônia quando reaparece o debate sobre a exploração do petróleo na chamada Margem Equatorial. A Petrobras quer examinar as possibilidades de um poço a mais de 500 quilômetros da foz do Rio Amazonas, no meio do oceano, distante mais de 100 quilômetros da costa do Amapá. Os preservacionistas estão eriçados. Preocupados com a possibilidade de algum dano ambiental à região, que tem sido vandalizada por nacionais e estrangeiros há séculos. Ninguém, nunca, protegeu a Amazônia, nem seus habitantes. Além disso, a Petrobras encontrou petróleo em Urucu, município de Coari, em 1986. Desde então, explora aquele poço por intermédio do gasoduto que abastece Manaus com o produto. Nunca houve problema algum. Exceto, naturalmente, denúncias de corrupção.

O governo Lula anda balançando nos últimos dias por conta de ações mal pensadas e atitudes irrefletidas de alguns de seus expoentes. Gente despreparada para cargo público. O PT, como lembramos aqui várias vezes, não possui plano B. É Lula ou Lula. Sem ele, a eleição de 2026 toma caminho completamente diferente. Este governo não tem bandeira, propósito nem programa. É o momento de pegar a possibilidade de produzir petróleo no extremo norte como forma de planejar o desenvolvimento da Amazônia, reprimir o crime organizado e levar progresso àqueles brasileiros que viveram isolados e esquecidos pelos brasileiros do sul nos últimos séculos. Trata-se de fazer justiça histórica.

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