Valor Econômico
Empurrado para uma reação efetiva, governo alinhava apoio de Motta e Alcolumbre com pauta no Congresso e Tarcísio, ante dissenso entre Centrão e bolsonarismo, avança sobre 2026
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva ainda
não tinha começado a falar na cerimônia das medidas para conter o impacto do
tarifaço sobre exportadores quando uma instituição financeira recebeu o monitoramento
do dia sobre sua popularidade que, neste mercado, é batizado, em inglês, de
“tracking”.
O resultado confirmava a tendência que começou a ser registrada há uma semana: depois de registrar a melhor taxa do ano com a reação ao tarifaço, seguindo a curva ascendente iniciada pela taxação BBB (bancos, bets e bilionários) e empatando com reprovação, a aprovação de Lula voltou a puxar a boca do jacaré para baixo.
Este monitoramento não autoriza conclusões
sobre um eventual esgotamento do tema da soberania, mas pesquisas mais aprofundadas
já vinham apontando que a aprovação de pautas como a taxação BBB, por exemplo,
não se estendiam à maneira como governo lida com esses temas. A MP é um caminho
para colocar o governo no rumo da reação - interna pelo menos.
Há outros instrumentos à mão para reagir a
esta boca de jacaré que novamente se abre. O recuo no câmbio e nos preços,
principalmente de alimentos, com perspectiva de deflação em agosto, coloca a
queda de juros no radar. A perda de tração do mote da soberania, porém, deu
urgência ao pacote que vinha sendo adiado pelas divergências internas sobre seu
alcance fiscal.
O bolsonarismo comete erros em série. Depois
de provocar o tarifaço, permitiu, com a humilhação imposta pelo “8/1 do
paletó”, que o presidente da Câmara, para salvar sua reputação, resgatasse para
a pauta a criminalização do conteúdo das redes sociais que erotiza crianças.
A jogada, que tirou o deputado Hugo Motta
(Republicanos-PB) do escanteio, não apenas mobiliza a opinião pública como
permite que o governo pegue carona na pauta da regulação longamente adiada pelo
Congresso. O sucesso na tramitação desse projeto ainda é duvidoso, mas já
emparedou o bolsonarismo que não consegue sobrepor a anistia e o foro
privilegiado sobre um tema de muito mais interesse da sociedade que é a
erotização de crianças. Além disso, ainda tem que lidar com a regulação das
redes, tema que, até aqui, vinha obstruindo com sucesso.
A MP que amortiza o tarifaço terá tramitação
mais fácil do que a regulação das redes, mas a pauta aproxima governo e Centrão
no que, de fato, mobiliza a opinião pública. A medida abre espaço para o
governo recobrar apoio do Centrão no Nordeste, por exemplo, cujas exportações
foram mais atingidas.
Como Lula não tem muitos aliados como o
governador petista do Piauí, este Centrão vinha se deixando atrair pelo
crescimento do bolsonarismo na região. O senador Ciro Nogueira (PI), presidente
do PP, ficou sem espaço no Estado pelo favoritisimo da chapa ao Senado montada
pelo governador, forte candidato à reeleição. A chapa terá MDB e PSD, cujo
presidente, Gilberto Kassab, deixou nos palacianos do Planalto depois do almoço
com Lula na semana passada, a certeza de que o partido vai liberar os Estados
na eleição presidencial de 2026.
Na ronda para resgatar as lideranças do
Centrão, Lula incluiu quem já lhe tem dado mostras de lealdade, como o
presidente do Senado. Ao mesmo tempo em que impôs 63 vetos ao projeto que
flexibiliza o licenciamento ambiental, o governo enviou uma medida provisória
que incorpora uma emenda apresentada pelo senador Davi Alcolumbre (União-AP). A
licença especial contemplada por esta MP viabiliza a exploração mais ágil do
petróleo da chamada Margem Equatorial, faixa litorânea que abrange o Amapá.
A perspectiva de cancelamento dos vistos
americanos de Motta e Alcolumbre ainda não se confirmou. O governo dos EUA
anunciou nesta quarta a medida para os servidores que idealizaram o Mais
Médicos numa retaliação pessoal do secretário do Departamento de Estado, Marco
Rubio, que é de origem cubana e se manifestou, no X, contra a “cumplicidade com
o programa de exploração da mão de obra cubana”.
Só a cogitação, porém, de que os presidentes
da Câmara e do Senado possam vir a ser alvo demonstra o grau de animosidade que
hoje impera entre o bolsonarismo e lideranças do Centrão.
Não é só com o Centrão que o bolsonarismo tem
provocado curto-circuito. O relatório do Departamento de Estado dos EUA sobre a
situação dos direitos humanos no Brasil incluiu as mortes provocadas por
policiais militares de São Paulo como foco de suas críticas. Alveja não apenas
o governador Tarcísio de Freitas como também Guilherme Derrite, um dos quadros
paulistas mais alinhados ao bolsonarismo e pré-candidato do PP à sucessão
estadual.
Com o avanço de Lula sobre o Centrão e o
dissenso crescente numa direita sobre a qual não demonstra controle, Tarcísio
assumiu uma postura mais ofensiva em relação a 2026 para uma plateia amigável.
Num evento do BTG nesta quarta-feira, o governador cruzou a fronteira da
dubiedade: “O Brasil não aguenta mais o PT, o Brasil não aguenta mais o Lula
(...) o mundo está de porta aberta para o Brasil, é só trocar o piloto que o
carro é bom pra caramba”.
No mesmo evento, o dono da casa, André
Esteves, desenhou pra quem ainda não tinha entendido: “Apesar de parecer que a
história do enfrentamento possa render dividendo político, eu não concordo com
essa visão. É voo de galinha. A sociedade vai cobrar solucionadores, e não
criadores de confusão.”
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