O modesto corte de juros anunciado na semana passada pelo Banco Central (BC) pode ser defensável tecnicamente, mas foi um desvio dos critérios indicados pela instituição. Para suavizar a política monetária, o primeiro passo foi afrouxar os padrões proclamados e reiterados durante mais de dois meses. Isso foi comprovado com muita clareza na ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), divulgada ontem. Cabe ao comitê, formado por diretores do BC, modular o custo e as demais condições do crédito, na busca da meta de inflação, fixada em 4,5% para 2017. A redução da Selic, a taxa básica, de 14,25% para 14% ao ano foi saudada como sinal positivo tanto no mercado financeiro como em outros setores, mesmo sendo classificada como tímida por alguns economistas e empresários. Mas política monetária vai muito além de uma decisão pontual. Quais serão os critérios válidos para os próximos lances?
A nota divulgada logo depois da reunião do Copom, no dia 19, foi surpreendente. Apareceram no texto muito mais argumentos favoráveis à manutenção do que ao corte de juros. As condições indicadas anteriormente em documentos do BC e em pronunciamentos de seus diretores foram reiteradas no fim do comunicado, mas como critérios para as próximas decisões. O Copom, segundo o prometido, continuará levando em conta o recuo da inflação, o ritmo de avanço na direção da meta, a evolução dos preços mais sensíveis à conjuntura e à política monetária (os de serviços, especialmente) e a redução das incertezas quanto às medidas de ajuste. Detalhe: ao citar essas medidas, os membros do comitê referem-se aos “ajustes necessários na economia”, algo mais amplo que a aprovação do Orçamento de 2017 e da proposta de teto para o aumento do gasto federal.
Com espaço muito mais amplo, a ata, divulgada seis dias depois, apresentou argumentos mais detalhados a favor da redução da taxa básica. Mas só um ponto é apresentado sem restrições importantes. A passagem refere-se às estimativas da inflação para os próximos dois anos: “O Copom concluiu que a evolução das projeções no cenário de referência, no horizonte relevante, que abrange os anos-calendário de 2017 e 2018, indica haver espaço para flexibilização gradual e moderada da política monetária. Por outro lado, as projeções no cenário de mercado sugerem haver limites para a magnitude dessa flexibilização nesse mesmo horizonte”. Então, é isso, e estamos conversados.
Todos os demais argumentos favoráveis ao afrouxamento da política são sujeitos a restrições importantes. “Todos os membros do Comitê reconheceram os avanços e os esforços para aprovação e implementação dos ajustes na economia (...).” Além disso, “há consenso no Comitê de que a velocidade desses esforços tem excedido as expectativas”. Muito bem. Mas “a natureza longa e incerta do processo sugere que há, ao mesmo tempo, risco e oportunidade”. Será preciso considerar, entre outros pontos, “a percepção da melhora da dinâmica das contas públicas no médio e no longo prazos”. E então?
Então, a decisão é iniciar a redução dos juros, com a renovação da promessa de cautela: a dimensão e o ritmo do afrouxamento dependerão da evolução dos fatores “que permitam maior confiança no alcance das metas”, etc. Esses fatores são aqueles indicados há mais tempo e – para retomar a palavra mágica – flexibilizados na decisão da semana passada.
Embora mais longa e mais detalhada, a ata pouco acrescentou de relevante à nota divulgada imediatamente depois da reunião do Copom. Eliminado todo o palavrório excedente, sobrou uma declaração resumível nos seguintes termos: nem todas as condições estão dadas, mas o Copom considerou possível iniciar sem grande risco a redução da Selic. Um corte de 0,25 ponto fará pouca diferença, para o bem ou para o mal, para o conjunto dos negócios, mas será um sinal animador para o mercado. Para o Tesouro, no entanto, qualquer diminuição no custo dos juros será oportuna. Os critérios anteriores continuarão merecendo atenção. Com vento a favor iremos em frente.
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