Wálter Nunes, Mario Cesar Carvalho – Folha de S. Paulo
SÃO PAULO - Ex-executivo da Odebrecht mais próximo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Alexandrino Alencar mudou a atitude em relação ao acordo de delação que está negociando com a Lava Jato e passou a entregar informações sobre a reforma do sítio em Atibaia (SP) frequentado pelo petista e as viagens que fez com ele para países da África e América Latina.
Alencar prestou dois depoimentos aos procuradores. No primeiro, em Curitiba, sua delação foi rejeitada porque os investigadores consideraram que ele omitira fatos para preservar Lula.
Ele e seus advogados refizeram o roteiro a ser apresentado aos investigadores. Na terça-feira (18) ele voltou a falar com a força-tarefa, desta vez em Brasília.
Com a apresentação de novas versões sobre o sítio e as viagens, os procuradores já sinalizaram que vão aprovar os termos do acordo.
Alencar foi diretor de Relações Institucionais da Odebrecht e é apontado como um dos operadores de propina da empreiteira. Ele ficou quatro meses preso no ano passado, foi condenado a 15 anos de prisão e está em liberdade.
Vai integrar o grupo que deve ter entre 70 e 80 executivos da Odebrecht que estão negociando acordos com procuradores da Lava Jato em Brasília e Curitiba.
AMIGO
Alencar é considerado um personagem-chave nas investigações sobre Lula por causa da amizade que manteve com o ex-presidente.
Ele atuou na reforma do sítio em Atibaia, feita por um consórcio informal composto por Odebrecht, OAS e o pecuarista José Carlos Bumlai, amigo do ex-presidente.
A Odebrecht iniciou a reforma do sítio em outubro de 2010, quando Lula ainda ocupava a Presidência, o que pode complicar a situação do ex-presidente se a Justiça considerar que a reforma foi a retribuição a algum favor que ele fez às empresas que cuidaram da obra.
Dependendo da interpretação judicial, a reforma poderá ser considerada crime de corrupção, já que começou quando Lula ocupava um cargo público.
Na sua proposta de delação, porém, Alencar narra fatos sobre a reforma após a saída de Lula da Presidência.
O começo da obra será narrado por outro delator da Odebrecht, ainda de acordo com apuração da Folha.
A empresa bancou benfeitorias no sítio, como a construção de um anexo com quatro suítes.
O sítio de Atibaia está em nome de Jonas Suassuna e Fernando Bittar, amigos de um filho do ex-presidente, e é alvo da investigação sob suspeita de que pertença, de fato, a Lula, o que ele nega veementemente.
Alencar também acompanhou Lula pela África e América Latina, como Angola, Cuba, Panamá e Peru. No novo depoimento, ele contou sobre pagamentos e os interesses da empresa em receber o apoio do ex-presidente.
Em uma dessas viagens, para a Guiné Equatorial em 2011, o ex-diretor da Odebrecht fez parte de uma comitiva oficial de Lula, conforme a Folharevelou em 2013, antes do início da Lava Jato.
Lula deixara o governo no ano anterior, mas foi designado representante oficial pela então presidente, Dilma Rousseff.
Alencar era o mais frequente companheiro de Lula em viagens que ele fez após deixar a Presidência, sempre em jatinhos da Odebrecht.
Além de avançar em detalhes sobre as obras do sítio de Atibaia, as palestras de Lula –que custavam US$ 200 mil– e as viagens, Alencar apresentou novos fatos envolvendo ex-presidente e a Odebrecht que ocorreram após o fim do mandato do petista.
Lula tornou-se réu no último dia 13 na Justiça do Distrito Federal, sob acusação de ter ajudado a Odebrecht a conquistar obras em Angola com recursos do BNDES.
Herdeiro do grupo, Marcelo Odebrecht também é réu, acusado de ter repassado R$ 30 milhões, em valores atualizados, como retribuição para um sobrinho da primeira mulher de Lula.
A defesa do ex-presidente da República nega que ele tenha tido qualquer interferência nos repasses do BNDES a Angola.
OUTRO LADO
A defesa do ex-presidente Lula refuta que ele tenha recebido recursos ilícitos da Odebrecht e atacou delações.
Em nota, o Instituto Lula diz que "a defesa do ex-presidente já entrou com pedido de investigação na PGR [Procuradoria Geral da República] sobre mudança de versões em duas tratativas de delação –as de Alexandrino Alencar e Léo Pinheiro [da OAS]– pelo risco de coação pelos investigadores para obterem versões contrárias ao ex-presidente, e pela perda do princípio da voluntariedade, o que tornaria tais delações nulas". Ainda segundo a nota, "se delações não são provas, apenas meio de investigação, mais irrelevantes ainda são supostas delações".
O ex-presidente nega que seja dono do sítio em Atibaia e defende a licitude das palestras. "Todas as palestras do ex-presidente para mais de 40 empresas de diferentes setores e países foram realizadas, com nota e recolhimento de impostos. O ex-presidente sempre agiu dentro da lei antes, durante e depois de exercer dois mandatos eleitos como presidente".
Para o instituto, "Lula é vítima de 'lawfare' (guerra jurídica), uma perseguição política usando meio judiciais, que tenta manipular recursos jurídicos para espalhar suspeitas difusas sem base real para destruir a imagem de um líder político e inabilitá-lo a disputar eleições".
O advogado José Roberto Batochio, que atua na defesa de Lula, diz que ele sempre teve uma relação lícita com empresários e ataca delações: "As pessoas acusam inocentes para se livrar da cadeia".
Procurada, a Odebrecht não quis se manifestar.
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