domingo, 17 de agosto de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Profusão de facções reforça urgência de PEC da Segurança

O Globo

Brasil se tornou refém de pelo menos 64 grupos do crime organizado espalhados pelo país

Não há como falar de violência sem falar nas facções do crime organizado. Nascidas dentro de presídios, elas hoje estão por toda parte. Donas de potentes arsenais, controlam rotas do tráfico, contrabandeiam armas, inflamam penitenciárias, dominam comunidades sob a mira de fuzis, simulam “tribunais” para executar oponentes, demarcam territórios com barricadas e achacam moradores. Em locais onde até a polícia resiste a entrar, impera a lei do crime.

A dimensão da tragédia é medida pela quantidade alarmante de grupos criminosos no país. Pelo menos 64 facções se espalham pelas 27 unidades da Federação, mostrou levantamento do GLOBO. As duas maiores — a paulista Primeiro Comando da Capital (PCC) e a fluminense Comando Vermelho (CV) — estão presentes em quase todos os estados (a primeira em 25, a segunda em 26). Pelo menos 12 atuam em mais de um. E, às nacionais, se juntam ainda estrangeiras, como a venezuelana Tren de Aragua, em Roraima.

A esquerda deve elaborar sua própria visão policêntrica do futuro, por Marcello Mustè*

Política Democrática online (FAP)

Na raiz de toda estratégia política, pelo menos na era moderna (ou seja, no contexto de um mundo substancialmente unificado), deve estar presente o nexo nacional-internacional. Isso significa que cada força política tem a tarefa preliminar de elaborar uma “leitura” da ordem mundial, de “traduzi-la” na linguagem própria da sua nação e contribuir ativamente para a formação de uma ordem internacional de qualidade superior.

Se nos desviarmos, mesmo que ligeiramente, dessa regra, ou mesmo se esquecermos dela, caímos no erro do “nacionalismo” (uma política que se funda unicamente na especificidade de uma situação nacional) ou, por outro lado, no equívoco de um cosmopolitismo abstrato, que Antonio Labriola certa vez definiu apropriadamente como “amorfismo”. Em seus Cadernos do Cárcere, Gramsci escreveu essas palavras, que ainda hoje merecem reflexão cuidadosa:

“O desenvolvimento é em direção ao internacionalismo, mas o ponto de partida é ‘nacional’, e é a partir desse ponto de partida que se deve começar. Mas a perspectiva é internacional e não pode ser outra coisa senão isso.”

Ele defendeu, portanto, a necessidade de conceber a política como “hegemonia”, como uma “combinação” dos dois aspectos, ou seja, desenvolvida por um sujeito (o partido político) no nível intelectual (o intelectual “orgânico” ou, como se dirá mais tarde, “coletivo”). Togliatti reiterou a mesma compreensão na sua intervenção junto à Comissão Cultural do PCI, em 3 de abril de 1952, quando afirmou que uma “cultura socialista é assim em seu conteúdo, mas nacional em sua forma”.

Paradoxos autoritários, por Merval Pereira

O Globo

Em tese, Kissinger defendia os direitos humanos, mas na prática, e nas conversas com os ditadores, como Ernesto Geisel do Brasil e Augusto Pinochet do Chile, o secretário americano se solidarizava com eles

A luta a favor dos direitos humanos sempre foi um ponto relevante dos governos dos Estados Unidos, mas ao longo da história abarcou conceitos dúbios, pois aquele país coloca interesses geopolíticos e econômicos à frente dos direitos.

Mesmo equilibrando-se entre esses dois posicionamentos, os Estados Unidos conseguiram manter a aura de um regime democrático empenhado em defender os direitos humanos, apesar dos muitos excessos. Suas guerras sempre foram contra o comunismo, como no Vietnã, ou contra ditadores, como no caso do Iraque de Saddam Hussein. Os desvios de conduta, porém, levaram a que a população em muitos casos se voltasse contra os governos da ocasião, quase sempre por ataques aos direitos humanos dos inimigos, ou no tratamento com torturas nas prisões espalhadas pelo mundo, especialmente em Guantánamo, em Cuba.

Escalada de tensões, por Míriam Leitão

O Globo

Sanções de Trump tendem a escalar com o julgamento de Bolsonaro. Ele acusa o Brasil de ser uma ditadura enquanto o país julga quem atentou contra a democracia

A tensão entre Estados Unidos e Brasil vai aumentar nas próximas semanas. O início do julgamento de Jair Bolsonaro está marcado para 2 de setembro, e o presidente Donald Trump continua defendendo o ex-presidente brasileiro. Na quinta-feira, ele disse que o Brasil é um parceiro comercial horrível e que está fazendo a execução política de Bolsonaro. Trump, criativo inventor de realidades paralelas, dirá que o processo andou para provocá-lo e pode editar novos atos hostis contra o Brasil.

A licença do deputado Eduardo Bolsonaro terminou e ele diz que não volta. É natural que perca o mandato. Vai usar o fato para alimentar a ficção de que há uma ditadura no Brasil. Na sexta-feira, o deputado publicou foto com o secretário do Tesouro, Scott Bessent. Disse que o encontro ocorreu no mesmo dia em que seria realizada a reunião de Bessent com o ministro Fernando Haddad, cancelada de última hora. Continua trabalhando por medidas contra a economia brasileira.

O passado enquadrado, por Bernardo Mello Franco

O Globo

Em cruzada contra "ideologia imprópria", republicano busca reescrever história dos EUA

Deu no Wall Street Journal: a Casa Branca quer obrigar os museus americanos a se alinharem às ideias de Donald Trump.

A ofensiva começou pela Smithsonian Institution. A entidade recebeu ordens para exaltar os “ideais americanos” e eliminar o que o governo classifica como “narrativas divisivas ou partidárias”. A diretriz vale para exposições, materiais educativos e publicações na internet.

Em março, Trump já havia editado decreto para enquadrar os museus de Washington. Determinou a remoção do que chamou de “ideologia imprópria”, além do cancelamento de mostras que, na visão dele, “degradem os valores” do país. O republicano manifestou o desejo de banir qualquer referência que “deprecie inapropriadamente os americanos do passado” — especialmente os fazendeiros escravocratas. Quer reescrever a história do país omitindo conflitos de classe e questões de raça e de gênero.

Justiça tributária sem vingança, por Guilherme Cezar Coelho

O Globo

A arrecadação hoje recai com mais força sobre trabalhadores com carteira assinada, cujo imposto é retido na fonte

Se você acha que paga imposto demais, tem 99% de chance de estar certo. No Brasil, o 1% mais rico da população paga menos imposto, proporcionalmente. Isso se chama regressividade e não é bom para a economia — além de ser sujeira com quase todo mundo.

No topo da distribuição de renda, o Brasil é o segundo país mais desigual do mundo. Em 2019, só perdíamos para o Catar. De lá para cá, nossa desigualdade no topo só aumentou. Baixo-astral total.

Até o fim do ano será votada no Congresso a isenção do Imposto de Renda para parte da classe média. Com ela, a proposta cria um Imposto Mínimo para os “super-ricos” — 140 mil pessoas, ou 0,1% da população adulta brasileira. Infelizmente, a discussão ganhou um quê de vingança, com a narrativa de ricos contra pobres. O lado bom é que esse imposto pode ficar melhor.

Calado, Vargas ganhou a guerra, por Elio Gaspari

O Globo

Silêncio do presidente foi sua arma em conflito que tinha EUA de um dos lados e Alemanha nazista do outro

Valeria a pena mandar um pesquisador aos arquivos do Itamaraty para consultar a conduta de Getulio Vargas durante os primeiros anos da Segunda Guerra Mundial. Ele tinha um enorme abacaxi no colo.

Depois da entrada dos Estados Unidos na guerra, em 1941, o Brasil corria o risco de uma invasão para assegurar o controle de pistas de pouso no Saliente Nordestino. Voando de Natal, os aviões americanos poderiam chegar à África.

Os personagens dessa época nada tinham em comum com os da crise de hoje. O presidente americano Franklin Roosevelt era um simpático profissional, enquanto Donald Trump faz da antipatia um estilo de vida. Vargas cultivava seus silêncios, já Lula fala o que lhe vem à cabeça.

Com a entrada do Brasil na guerra e a criação da Força Expedicionária Brasileira, Getulio fez do limão (o risco da invasão) uma limonada. O silêncio foi sua arma.

Ditadura do Judiciário coisa nenhuma, por Oscar Vilhena e Sergio Fausto*

O Estado de S. Paulo

Usar as mesmas palavras, ainda que com ressalvas, para aproximar os ‘anos de chumbo’ da ditadura militar à imperfeita democracia do presente é muito grave

Este artigo é a réplica ao artigo Precisamos dar nome aos bois (Estadão, 9/8, A4), que defende que o Brasil vive sob um “estado de exceção informal”.

Encorajado pela chantagem de Trump, o bolsonarismo aumenta o tom da ladainha: o Brasil “vive sob a ditadura do Poder Judiciário”, personificada na figura de Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). A acusação é parte da estratégia voltada a promover a impunidade daqueles que atentaram contra o Estado Democrático de Direito.

O Brasil vive a mais longa experiência democrática de sua acidentada história constitucional. Uma experiência imperfeita, é verdade. O fato, no entanto, é que ao longo dos últimos 40 anos, fomos capazes de solucionar os conflitos políticos de forma pacífica, por meio de eleições e de acordo com a Constituição, regra de ouro da democracia, que o ex-presidente Bolsonaro e seus acólitos buscaram subverter.

Não se confunda a crítica legítima a decisões eventualmente equivocadas do STF com a tentativa de solapar as instituições democráticas. Quanto mais agora, quando o chefe da maior potência militar e econômica do planeta mobiliza instrumentos punitivos contra a soberania nacional na tentativa de coagir o Supremo Tribunal Federal a abdicar da responsabilidade de guardar a Constituição.

‘Censura’ ou mutilação, por Eliane Cantanhêde

O Estado de S. Paulo

Em vez de adultizar as crianças, que tal adultizar suas Excelências no Congresso?

O influenciador Felca fez um enorme bem ao País ao unir a sociedade, o Congresso, o Planalto, esquerda e direita, governo e oposição em torno de um tema de importância transcendental: o futuro. Falo aqui da segurança das crianças e adolescentes de hoje e amanhã, num mundo dominado por big techs e redes sociais sem regulamentação e responsabilidades.

O real teste da união em torno da proteção dos pequenos e pequenas, porém, começa nesta semana, quando o presidente da Câmara, Hugo Motta, reúne os líderes partidários para discutir a pauta de votação e a inclusão de projetos que tratam da sensualização e adultização precoce. É aí que a porca torce o rabo.

Os interesses na crise EUA-Brasil, por Lourival Sant’Anna

O Estado de S. Paulo

No embate com o Brasil, Trump quer se projetar sobre a esquerda americana e mundial

A última semana marcou escalada na disputa entre Trump e a oposição bolsonarista, de um lado, e o governo brasileiro, de outro. Lula procurou arregimentar apoio dos principais países do Brics contra os EUA. O governo americano impôs novas sanções de vistos, estendendo sua campanha contra o programa Mais Médicos, e o deputado Eduardo Bolsonaro vinculou suas gestões em Washington à tarifa de 50% e a uma anistia para seu pai.

Ao cancelar os vistos de dois funcionários do Ministério da Saúde, da mulher e da filha do ministro Alexandre Padilha, o Departamento de Estado abriu nova linha de ataque ao Brasil. O objetivo é caracterizá-lo como um país que explora trabalhadores estrangeiros para apoiar uma ditadura.

Trump quer o mundo com a cara dele, por Celso Ming

O Estado de S. Paulo

A partir do encontro no Alasca com o presidente da Rússia, Vladimir Putin, o presidente dos Est a dos Unidos, Donald Trump, não pretendeu apenas um resultado que lhe dê o Nobel da Paz. Quis dar mais um passo em direção à mudança da nova ordem mundial, para que tudo fique com sua cara.

Antes, uma carga de perplexidade: as instituições que construíram o sucesso político e econômico do império americano, de repente, não valem mais. São apontadas como razões do enfraquecimento dos Estados Unidos e do fortalecimento de outras potências emergentes, a ponto de exigir a virada que traga de volta a grandeza anterior.

O efeito político da esquecida economia, por Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

Inflação resistente da comida e gasto público mais contido no primeiro semestre fazem efeito

O processo de Jair Bolsonaro e seus desdobramentos, como o tarifaço, abafaram a conversa política da primeira metade do ano. Também se presta ainda menos atenção à economia e seu efeito sobre o prestígio presidencial e o Congresso. Inflação, gasto público (com emendas inclusive) e um início de desaquecimento do PIB merecem atenção.

O primeiro semestre foi de vazio de decisões no Congresso, travado também por negociação de emendas. Terminou com a querela do IOF, outra revolta contra impostos, que encurralava o governo e será tema eleitoral de 2026.

No primeiro trimestre, atormentado pela baixa na popularidade e pela inflação de alimentos, que passara de 8% ao ano em 2024, o governo prometia providências. Em março, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva dizia procurar o "pilantra" da carestia do ovo. Não achou.

Tarifaço e a atividade econômica, por Samuel Pessôa

Folha de S. Paulo

Tarifaço deve gerar uma perda de 0,15% do PIB em 2025 e de uns 0,3% em 2026

Os cálculos sugerem que o tarifaço de Trump deverá reduzir nossas exportações em aproximadamente R$ 5 bilhões em 2025 e outros R$ 10 bilhões em 2026.

Em geral, nossas exportações têm um conteúdo de 16% de insumos importados. Isso deve gerar uma perda de 0,15% do PIB em 2025 e de uns 0,3% em 2026. Já supusemos que parte da queda das exportações seria absorvida pelo mercado doméstico. O choque representa uma redução da demanda por nossos produtos. É, portanto, desinflacionário.

O governo anunciou o Plano Brasil Soberano. Ele terá três pilares principais.

A culpa que Lula não tem, por Dora Kramer

Folha de S. Paulo

A China foi ofendida por Bolsonaro, mas nem por isso investiu contra os brasileiros como faz Trump

Governadores que pretendem representar a direita na disputa presidencial de 2026 insistem em responsabilizar o presidente Luiz Inácio da Silva (PT) pela crise com os Estados Unidos.

É a maneira confortável que acharam para se distanciar das ações bolsonaristas. A desonestidade mental na construção de versões não deixa de ser um direito inalienável de seus autores, embora o truque encontre na realidade um poderoso obstáculo.

Os gringos ladrões do Eduardo, por Celso Rocha de Barros

Folha de S. Paulo

Turma com quem deputado conversa é a ala mais extrema do fascismo internacional contemporâneo

Na semana passada, o secretário de Tesouro dos Estados Unidos, Scott Bessent, cancelou uma reunião com Fernando Haddad que poderia ter economizado bilhões de dólares para o Brasil. Nosso país perdeu esse dinheiro por culpa de Eduardo Bolsonaro.

Bessent cancelou a reunião porque não queria arrumar confusão com a ala mais radical do governo Trump. Certamente compraria a briga se o Brasil tivesse o peso de uma China ou de uma União Europeia; mas o Brasil não tem.

É essa ala mais alucinada do governo Trump que ouve os nepobabies do golpe, Eduardo Bolsonaro e Paulo Figueiredo. Mas quem é essa gente?

Um deles é Darren Beattie, subsecretário de Trump que foi ao falecido Twitter em 6 de agosto aconselhando "os aliados de Moraes dentro e fora do tribunal a não auxiliar ou encorajar o comportamento sancionado de Moraes".

O aleitamento do caos, por Muniz Sodré

Folha de S. Paulo

A realidade paralela que existe nas redes bolsonaristas equivale à desintegração socioemocional nos agentes do caos

Da triste arruaça no Congresso, permanece nas retinas a imagem de uma deputada tumultuária com um bebê de quatro meses no colo, sequestrando a cadeira do presidente da Câmara. Essa persistência ótica é o que Roland Barthes, a propósito da fotografia, chama de "punctum", um ponto de convergência do olhar que centraliza o sentido da imagem (em "Câmara Clara"). A parlamentar admitiu, depois, que pretendia usar a criança como escudo durante a balbúrdia.

O surpreendente mundo da ciência, por Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Livro usa histórias relacionadas à química para fazer divulgação científica, algo de que o mundo está precisando

O mundo precisa desesperadamente de alfabetismo científico. Basta lembrar que, em 2020, Donald Trump, em sua primeira passagem pela Casa Branca, sugeriu que cientistas investigassem se injetar desinfetantes no corpo de pacientes não seria a solução para a pandemia de Covid.

Tudo bem que Trump é um cara fora da curva e só estava pensando alto. Mas respeitados membros da comunidade médica insistiram no uso de cloroquina contra a moléstia mesmo quando já havia muitos ensaios clínicos mostrando que essa droga antimalárica não era efetiva contra o Sars-CoV-2.

O time favorito dos sambistas, por Ruy Castro

Folha de S. Paulo

Grandes nomes do samba torcem pelo Vasco. Mas outros, em muito maior número, são Flamengo

É conversa de botequim, mesmo. Um dos esportes favoritos do carioca é fazer de qualquer pé sujo uma assembleia permanente em defesa da cidade e de sua cultura —no caso, samba e futebol. O historiador Marcelo Dunlop, uma autoridade em Flamengo, lembrou-me o mito, sempre brandido pelos vascaínos, de que o Vasco, e não o Flamengo, é o clube favorito dos sambistas. Com o que desfilam seu respeitável plantel: Jamelão, Zé Kéti, Nelson Cavaquinho, Aracy de Almeida, Paulinho da ViolaClementina de Jesus, Nei Lopes, Martinho da Vila, Aldir Blanc. Todos, Vasco.

Dunlop contestou esse mito e escalou o seu Flamengo do samba. É um timaço: Ary BarrosoDorival Caymmi, Ataulpho Alves, Carmen Miranda e Almir Guineto; Silas de Oliveira, Bezerra da Silva e Candeia; Wilson Baptista, Geraldo Pereira e, com o 10 às costas, Noel Rosa —para ele, o Galinho da Vila.

Poesia | Pátria Minha, por Vinicius de Moraes

 

Música | Beth Carvalho - O mundo é um moinho / As rosas não falam (Cartola)