Por maioria de 6 votos favoráveis e 3 contrários, o Supremo Tribunal Federal reafirmou a constitucionalidade do fim da contribuição sindical obrigatória herdada da era Vargas, um dos pontos mais importantes da reforma trabalhista, e pôs um ponto final em 19 ações que buscavam reinstituí-la, a maior parte delas movida pelos sindicatos.
A principal luta das entidades sindicais após o início da vigência da reforma, em novembro, foi tentar reaver na Justiça o direito de cobrar de todos os membros de uma categoria o correspondente a um dia de salário. Com a derrota, abrem-se mais capítulos de disputa judicial, desta vez para dar o direito aos sindicatos de estabelecerem em assembleia uma contribuição negocial a ser cobrada não apenas dos associados, mas de todos os beneficiários de acordos salariais. Em princípio, essa contribuição ou outra qualquer, seja com que nome for, não poderá ser imposta ao trabalhador, que tem individualmente de concordar com a cobrança para que ela possa ser feita. A questão já está nos tribunais.
Desde que a reforma entrou em vigor, sindicatos patronais e de trabalhadores viram suas receitas encolher drasticamente com a ausência do imposto sindical. Os sindicatos mais representativos terão condições de sobreviver, embora cortando custos. Boa parte deles está ligado à Central Única dos Trabalhadores. A CUT defendeu o fim do imposto em 2003 e 2012, com base na luta pela independência sindical que esteve em sua origem. Quer, porém, substitui-lo pela contribuição assistencial e faz coro com outros sindicatos menos pujantes nessa tentativa de obter receitas alternativas.
Antes mesmo da aprovação da reforma foi possível ver o expediente que a burocracia dos sindicatos acomodados ou de fachada pretendia lançar mão para ampliar suas fontes de renda. A contribuição negocial esboçada antes é uma porcentagem do salário do trabalhador, e não o correspondente a um dia do trabalho, de modo que a depender da vontade dos sindicalistas a parcela paga por um trabalhador, mesmo não sindicalizado, seria muito provavelmente maior do que a obtida com o imposto sindical. A Força Sindical foi pedir ao presidente Michel Temer que incluísse a cobrança em uma MP que regularia pontos omitidos durante a discussão da reforma, mas sua tramitação não prosperou.
Além de sustentar um número crescente de sindicatos que não fazem jus ao nome, e nutrir sua burocracia inútil, os recursos do imposto, algo como R$ 2 bilhões em 2017, repartido entre centrais nacionais, federações estaduais e sindicatos de trabalhadores e patronais, o imposto sindical abriu um canal de corrupção nos guichês do Ministério do Trabalho, com a troca de favores políticos e monetários para a aprovação da criação de novas entidades. O artificialismo da representação é evidente também no caso das organizações patronais - não era incomum até há pouco que um mesmo endereço fosse sede de vários sindicatos que representavam sub-ramos inexpressivos ou decadentes da indústria e do comércio, que poderiam ser facilmente aglutinados a outros. Obtido o repasse do dinheiro do imposto, a sobrevivência estava assegurada.
A CUT e sindicatos atuantes têm condições de sobreviver sem o imposto sindical, embora, como as demais entidades, estejam tendo de fazer uma drástica dieta de gastos. A CUT do Espírito Santo, que reune 106 sindicatos, têm fatia de 30% das receitas provenientes da contribuição obrigatória. A CUT nacional aglutina 3.400 entidades, algumas delas às voltas com cortes de empregados e programas de demissão voluntária. A central, segundo o Dieese, tem 115 mil funcionários e 185 mil terceirizados e é impossível manter essa burocracia intacta.
Defensor da manutenção da contribuição obrigatória, o ministro Edson Fachin, do STF, disse que o sindicalismo, legalmente, se apoiava em um tripé, onde o imposto sindical convivia com a unicidade territorial e o monopólio da representação. Fachin disse que sem os recursos do imposto esse tripé ruiria. O argumento tem alguma correção, embora a conclusão final devesse ser pelo fim das demais condições e não pela manutenção do imposto.
É sintomático que os sindicatos e centrais sindicais não tenham se mobilizado por isso. A divisão territorial das entidades as enfraquece, assim como a existência de uma única entidade por categoria. A organização legada por Vargas encara sindicatos patronais e de trabalhadores com o espírito de repartições públicas, para controlá-los e fazê-los servir ao Estado. O mundo entrou no século XXI, mas a legislação brasileira demorará um pouco até chegar lá.
Nenhum comentário:
Postar um comentário