- Valor Econômico
Lula quer colocar Ciro Gomes no colo da direita
Apesar da vantagem relativamente confortável de Ciro Gomes, a disputa pelo apoio do PSB na eleição presidencial não está definida e responde por uma das mais encarniçadas batalhas dos bastidores da sucessão. Teoricamente, Geraldo Alckmin (PSDB) e Marina Silva (Rede Sustentabilidade) também estão no páreo, mas as chances de ambos, a esta altura, é igual a zero. O jogo é entre PT e PDT, e as apostas podem dobrar nos próximos dias.
Passa nas cogitações do PT um lance ousado: apoiar a candidatura à reeleição do governador de São Paulo, Márcio França, do PSB. A proposta ainda não foi feita a França, circula num meio muito restrito do petismo e somente será formalizada se houver uma indicação concreta do PSB de que pode aceitá-la. Difícil para França, diante do desgaste do PT em São Paulo. Difícil até para o PT, que tem um candidato próprio ao governo. Mostra, porém, a disposição com que o PT entrou na queda de braço pelo apoio nacional do PSB ao candidato do partido.
O PT e Lula disputam em diversas frentes ao mesmo tempo. Algumas estão praticamente perdidas, como o registro da candidatura do próprio Lula da Silva a presidente. Sem ele na cabeça de chapa, a hegemonia do PT na esquerda está seriamente ameaçado. Os nomes mencionados para substituí-lo mal passam dos 2% nas pesquisas e não empolgam os petistas e seus candidatos aos governos e Legislativo. No momento (segundo turno é outra história), embora Marina tenha a liderança da centro-esquerda, nas pesquisas, a ameaça à hegemonia do PT atende pelo nome de Ciro.
Nas escaramuças dos bastidores, o PT tem jogado para matar, isolar ou pelo menos jogar Ciro no colo da direita. Ao mesmo tempo que negocia apoios com o PSB e o PCdoB, o candidato do PDT mantém abertos os canais com o bloco de partidos que giram na órbita do presidente da Câmara, Rodrigo Maia - DEM, PP, PRB e SD. A tendência é que esses partidos se juntem ao PSD, PTB e PPS em torno de Geraldo Alckmin (PSDB), mas Ciro Gomes é uma alternativa concreta que não deve ser desconsiderada. E é onde o PT quer o ex-ministro da Integração Nacional de Lula.
O apoio do PT a Ciro já esteve na cogitação do próprio Lula, mas o ex-presidente nunca mais demonstrou o entusiasmo que já teve com o seu ex-ministro antes de ele começar a proferir diatribes contra os hábitos petistas - e de Lula - no mensalão e no petrolão. Para o PT, que sempre quis eliminar a concorrência à esquerda, o desânimo de Lula com Ciro foi um alívio. A disputa agora é interna e também renhida. Embora os candidatos indicados por Lula larguem com algo em torno de 2% nas pesquisas, o apoio do ex-presidente pode catapultar um deles para o segundo turno.
Os candidatos a governador do PSB estão divididos. O governador Paulo Câmara, de Pernambuco, a seção mais influente do partido, quer o acordo com o PT, a fim de retirar do jogo sucessório local a vereadora Marília Arraes, neta do lendário Miguel Arraes, que está em seus calcanhares nas pesquisas. Marília pode não ganhar a eleição, mas divide a esquerda. Nunca o PSB de Pernambuco esteve tão fragilizado em nível nacional e pode perder, mas ainda não dá para bancar que vá perder.
Outro nome mais ligado ao PT, Ricardo Coutinho, disputa o Senado, tem uma eleição tranquila e hoje não chega a ser obstáculo à celebração de um acordo PDT-PSB. O PT gostaria também de fazer uma aliança em Minas Gerais para a retirada da candidatura de Marcio Lacerda (PSB) ao governo estadual, a fim de pavimentar a reeleição de Fernando Pimentel. Uma costura também difícil, mas no tabuleiro. No restante do país as posições dos candidatos tendem mais por uma aliança com Ciro Gomes, a exemplo do manifesto regional.
O governador de Brasília, Rodrigo Rollemberg, por exemplo, acredita que o acordo com o PSB está bem encaminhado para um consenso, pois feita a opção, os vencidos têm o compromisso de acompanhá-la. Chega a ser cartesiano: com a desistência do ex-presidente do STF Joaquim Barbosa, o PSB decidiu que apoiará um dos nomes do cardápio. Entre as opções, a de quase consenso é Ciro Gomes - o PT ou qualquer outra opção rachariam o partido.
Para seus partidários, a aliança com Ciro traz mais vantagens que desvantagens, inclusive para candidatos que hoje supostamente seriam prejudicados. Este seria o caso, para citar um exemplo, de Márcio França, em São Paulo. O argumento: o fortalecimento de Geraldo Alckmin significará também o fortalecimento de João Doria, seu desafiante ao Palácio dos Bandeirantes. Ciro também agregaria mais apoios regionais, nas contas do PSB.
Existe um outro argumento em favor do PDT na discussão: com o PSB apoiando Ciro, ampliam-se as possibilidades de o SD e o PCdoB também entrarem no acordo, dando densidade de esquerda à aliança. É tudo o que o PT procura evitar. Há também uma certa dose de ingenuidade nessa expectativa, pois nas escaramuças dos bastidores o PCdoB tem demonstrado que ainda é um apêndice do PT.
Estudo da empresa de consultoria Arko Advice revela que a preocupação do PT não é despropositada. Desde 2006 a polarização PT-PSDB vem perdendo força no país - em 2006, os votos fora da polarização somavam 9,75% do total, foram a 20,44% em 2010 e chegaram a 24,87% na eleição seguinte. "De 2006 a 2014, esse percentual de votos válidos subiu mais de 15%", registrou a Arko Advice.
Os votos do PT no segundo turno presidencial também estão em queda desde 2006, ano da reeleição de Lula - o presidente teve 60,83% dos votos válidos contra Geraldo Alckmin; quatro anos depois Dilma venceu com 56,05% dos votos do segundo turno e, em 2014, se reelegeu com 51,64%. Os números não significam que PT e PSDB estejam um ou outro fora do segundo turno de 2018. O PT, mesmo com encolhimento nas eleições municipais de 2016 em número de prefeitos e vereadores, é o terceiro partido com o maior número de governadores e senadores, além de contar com a maior bancada federal e a segunda maior de deputados estaduais. E tem força no Nordeste. Mas 2018 virou questão de sobrevivência.
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