Cada corporação beneficiada embolsa quieta. Pela liturgia em si, a reunião que juntou chefes dos três Poderes em Brasília para tratar de problemas relacionados à segurança pública teve o mérito de mostrar à sociedade que a degradação dos indicadores de violência é tema comum na agenda do Legislativo, Executivo e Judiciário. O encontro valeu pelo simbolismo, mas, avançando para além da sinalização dada ao país, também foi positivo por ter dele decorrido se não um programa definido, mas o propósito de buscar ações concretas —e, o mais importante, integradas pelas diversas instâncias da administração pública — contra a criminalidade.
É vital que assim seja. Números e fatos não deixam dúvida quanto à necessidade de o país rever, em todos os âmbitos, sua abordagem nas ações contra o banditismo, na legislação e na aplicação das medidas por ela determinadas. A falência do que seria uma política nacional de segurança pública alcança boa parte dos estados — alguns, como o Rio de Janeiro, de forma especialmente dramática. As estatísticas negativas compõem uma curva teimosamente ascendente no que diz respeito ao crescimento da criminalidade, e, por decorrência, um gráfico preocupantemente em queda no que diz respeito a avanços nos procedimentos (policiais, institucionais, penitenciários etc.) contra o banditismo.
A manutenção da taxa média do país em torno de 30 mortes violentas por cem mil habitantes ao longo dos anos talvez seja o principal indicador do colapso dos movimentos do poder público para conter agravos à segurança. Se essa relação corresponde a três vezes a taxa a partir da qual a ONU considera epidêmica a violência em determinada região ou país, assusta ainda mais observar que em alguns estados os indicadores de homicídio doloso são mais altos.
Isso significa que, de acordo com o 10º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, em 2015 um brasileiro foi assassinado a cada nove minutos, 160 mortes violentas por dia. De janeiro de 2011 a dezembro do ano passado, 278,8 mil pessoas foram mortas no país — número que supera o de vítimas fatais na guerra da Síria, no mesmo período. Essa, a do viés meramente policial da questão, é a ponta mais visível da deterioração dos números da violência no país. Outros, menos visíveis, não são menos graves, pois alimentam a fornalha da insegurança pública.
A política penitenciária, por exemplo, um dos esteios entre os instrumentos coercitivos do Estado para enfrentar o problema da criminalidade, falha tanto quanto a abordagem policial. O Brasil tem uma superpopulação carcerária, a terceira maior do mundo, de mais de 600 mil presos. É um universo espremido num déficit de 252,5 mil vagas. A execução penal, ao menos no seu viés correcional, virtualmente não existe, e ainda fica sujeita a critérios obscuros responsáveis por manter nas grades muita gente que ali não não precisaria permanecer e ser indulgente com apenados de grande periculosidade. O controle de armas, a despeito do Estatuto do Desarmamento, empaca principalmente nos buracos nas fronteiras e na leniência na aplicação dos dispositivos da lei.
Tudo isso, e mais, forma um aparelho de segurança ineficiente, em alguma medida roído pela corrupção de maus agentes públicos. Aperfeiçoá-lo passa, imperiosamente, pela adoção de ações que integrem num só corpo órgãos das três instâncias de poder. É passo essencial para o país encarar o desafio de coibir a violência.
Nenhum comentário:
Postar um comentário