- Folha de S. Paulo
Para os apreciadores das ironias da história, a eleição de Donald Trump é um prato cheio. Ao que tudo indica, a rejeição à globalização e à imigração foram decisivas para a vitória do magnata. O curioso aqui é que os EUA são um dos países que mais se beneficiaram da globalização e da imigração.
A internacionalização da economia foi positiva para a maior parte da população americana, já que um de seus principais efeitos, nem sempre apreciado, é a contínua redução dos preços dos produtos consumidos.
É relativamente fácil para um trabalhador do "rust belt" dos EUA constatar que sua renda se estagnou ou até caiu nas últimas décadas. Mais difícil é perceber que, apesar disso, ele tem hoje acesso a muito mais bens, que ainda ganharam em qualidade, do que tinha no passado. A maior parte da prosperidade gerada pelo capitalismo não vem na forma de maiores salários, mas do barateamento dos itens de consumo.
É claro que esse processo é caótico e não afeta a todos da mesma forma. O operário que ficou sem emprego porque a fábrica em que trabalhava transferiu suas atividades para a China ficou objetivamente pior.
A imigração também tem sido no geral mais benéfica do que deletéria aos EUA. Uma longa série de estudos mostra que o fluxo de trabalhadores para os EUA tem ajudado o país a ampliar sua produtividade e a manter-se como uma potência em inovações. A chegada de estrangeiros também vem evitando que a América enfrente a armadilha demográfica da redução populacional em que se enroscou a Europa.
Mas, de novo, a distribuição dos efeitos é bastante desigual. Trabalhadores de baixa qualificação, especialmente os jovens e os imigrantes mais antigos, tendem a ter seus salários comprimidos pela concorrência dos novos imigrantes.
Se Trump efetivamente cumprir as promessas que fez, poderá estar dando um tiro no pé dos EUA.
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