A Constituição Brasileira de 1988 e a Lei
de Diretrizes e Base da Educação de 1996 (LDB) apontaram os caminhos. Ensino
Básico, direito de todos e dever do Estado, obrigatório e gratuito nas escolas
públicas.
Através de muitos estudos já realizados podemos observar que são longos os prazos para se cumprir as leis e implantar programas ou planos determinados. Os dirigentes políticos não se empenharam o suficiente pela educação brasileira, nem a sociedade se sente capaz para reivindicar o direito de todos, quando se refere à educação que é o ensino básico com qualidade em escolas públicas, gratuitas e com boa qualidade.
O Ensino Básico no Brasil, após a
Constituição e a LDB, é responsabilidade dos estados e municípios, sendo
estruturado em regime de colaboração entre União, estados e municípios, segundo
o artigo 18 da Constituição, resguardando a autonomia de cada instância de
governo.
Com o passar do tempo, mais de 30 anos, a
organização do sistema de ensino de modo geral não vem sendo feito com a exigência
que requer o seu objetivo, que é “o pleno desenvolvimento da pessoa, seu
preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.
(Constituição-art.205)
Através das avaliações de desempenho
promovidas pelo Ministério da Educação e executadas em colaboração com estados
e municípios, podemos observar que os resultados da aprendizagem são simplórios
e muito baixos se comparados aos outros países. Segundo o MEC, em relação ao
PISA, exame feito com alunos do ensino médio para medir conhecimentos de
português, matemática e ciências “apesar do resultado ter melhorado no ano
2018, o Brasil ainda ocupa o 59º lugar do ranking geral do Pisa, que foi
aplicado em 79 países”.
As avaliações realizadas pelo
IDEB/PISA/INEP/OCDE nos mostram constantemente a lentidão que move o sistema
educacional brasileiro, sobretudo no ensino básico, cuja denominação indica a
importância do processo de aprendizagem nesta fase para que o aluno possa
traçar o seu caminho para chegar à vida adulta.
Em seu artigo bastante instigante sobre “Os
novos desafios da Educação básica”, Cesar Benjamin, ex secretário municipal de
Educação do Rio de Janeiro escreve o seguinte: “No século XIX, o Brasil foi um
dos últimos países do mundo a abolir a escravidão. No século XXI, será um dos
últimos a abolir o analfabetismo. Ambas as condições são a negação absoluta da
democracia e da civilização… não temos soluções claras para este desafio, mas
já avançamos em várias frentes, como a expansão da rede, os sistemas de
avaliação e as formas de financiamento da educação. Estamos diante de um
paradoxo: todos defendem a educação, mas há décadas ela fracassa, sem que isso
impulsione um debate sério e um conjunto de ações abrangentes e eficazes. A
educação básica nunca foi prioridade na agenda brasileira. Em geral,
governantes não são recompensados quando investem na boa pedagogia nem são
punidos quando a deixam de lado, pois o esforço educacional é silencioso e
prolongado no tempo. Não produz resultados imediatos e espetaculares”.
Todos nós brasileiros, letrados ou não,
sabemos que isso é verdade e sabemos também que não priorizar uma política de
ensino básico interfere na desestruturação de outras políticas públicas
fundamentais ao exercício da cidadania e ao desenvolvimento do país.
A pandemia por si só não é a responsável
pelo aprofundamento da crise na educação, especialmente no ensino básico.
A pandemia chegou de forma brusca, mas
encontrou as escolas em sua maioria desaparelhadas, estruturas físicas sem
manutenção, escolas sem banheiros, sem água para higiene e até mesmo sem água
potável, classes superlotadas de alunos, inexistência ou espaço reduzido para
atividades esportivas e recreação.
Muitas escolas não conseguem repor
materiais didáticos, esportivos e mobiliário necessário ao bem-estar do aluno e
à manutenção do ensino. Quando dispõem de computadores não estão conectadas à
internet e muitas delas não dispõem de computadores ou estão conectadas a
sistemas de controle.
A UNESCO apresentou um trabalho sobre a
“Qualidade da Infraestrutura das Escolas Públicas do Ensino Fundamental no
Brasil” com base nos dados do Censo Escolar/MEC de 2013 a 2017, em sua análise
considerando as disparidades regionais e outros aspectos relacionados às
escolas estaduais e particulares.
O estudo aponta que houve evolução dos
indicadores em todas as redes, sobretudo nas escolas municipais, exatamente as
que mais precisam melhorar. As escolas nas áreas urbanas geralmente apresentam
melhor desempenho que as rurais, e quando se trata de escolas que têm apenas o
ensino fundamental, têm também a pior infraestrutura.
Segundo o estudo da UNESCO, nas regiões sul
e sudeste estão as escolas com médias mais altas para todos os indicadores em
comparação às escolas do norte e nordeste. Mas, o nordeste avançou mais que as
outras regiões, com destaque para os resultados do Ceará.
O Estudo da UNESCO é muito amplo, porque
analisa a infraestrutura escolar do sistema de ensino em várias dimensões,
tendo produzido indicadores diversos, a partir dos indicadores de complexidade
definidos pelo Instituto Anísio Teixeira-INEP.
A complexidade escolar que produz o
conhecimento necessário à aprendizagem dos alunos que se encontram no ensino
básico é muito mais difícil de ser compreendida quando abordados os
instrumentos indispensáveis à absorção e produção de conhecimentos, de modo
geral, como a formação dos professores, os materiais didáticos utilizados, o
conteúdo dos livros didáticos e uma série de questões que compõem o que eu
chamo de situação de subjetividades, presentes na relação entre professor e
aluno e que também impulsionam o processo de aprendizagem. Como exemplo disso,
a capacidade de liderança do professor, o interesse dos alunos, a empatia
gerada na sala de aula, a situação social do aluno, entre outros.
As nossas escolas por esse país afora
apresentam muitas diferenças no seu ofício de ensinar, ao mesmo tempo em que
desconhecem fatores que são essenciais ao desenvolvimento do trabalho do
professor.
Como diz o César Benjamin no início do seu
texto, os políticos não são punidos ou recompensados se a educação vai bem ou
não, se os alunos aprendem ou não, se o país é prejudicado no seu
desenvolvimento, se a educação contribui ou não para uma sociedade mais justa.
A pandemia não é responsável pela crise que
se prolongava há décadas, apenas acentuou o problema de forma drástica,
apontando a sua profundidade com os números apresentados pelo Movimento Todos
pela Educação: “aumenta em um milhão o número de crianças de 6 e 7 anos, não
alfabetizadas, na percepção dos responsáveis. Entre 2019 e 2021, houve um
aumento de 66,3% no número de crianças de 6 e 7 anos de idade que, segundo seus
responsáveis, não sabiam ler e escrever. O número passou de 1,4 milhão em 2019
para 2,4 milhões em 2021” (Nota técnica- Todos Pela Educação).
Se até hoje não conseguimos ter todas as
crianças na escola, desde a creche até chegar ao ensino médio; se há o abandono
da escola na figura da evasão escolar e as avaliações indicam que o aprendizado
da maioria dos alunos não é compatível com suas necessidades de aprendizagem, não
é possível prosseguir neste caminho.
A sociedade, em nome da cidadania, deve
tomar de conta!
*Mirtes Cordeiro é pedagoga.
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