O Globo
Promover a geração de renda e contribuir
para o engajamento nas escolas são caminhos para avançar nesse desafio
A situação dos jovens que não estudam nem
trabalham não é nova, mas nem por isso podemos deixar de nos indignar com
estatísticas como as divulgadas neste mês pelo IBGE: em 2021, 13 milhões de brasileiros entre 15 e 29 anos (26% do
total) estavam nesta situação. É preciso ir além da indignação e agir na
construção de uma política coesa, integrada e atrativa para as juventudes,
focada nos mais vulneráveis, e que seja multissetorial e multinível, com os
próprios jovens engajados em seu desenho.
Uma estratégia assim possui como principal eixo – não o único – a educação. Espera-se que a escola atenda crianças e jovens, de forma universal, durante 14 anos. Ela é o espaço de articulação entre os territórios físico e virtual com maior capilaridade para acolher as ofertas estatais que interagem com esse público. É preciso renovar esse espaço e torná-lo mais atrativo, produzindo sentido ao ato de estudar e aumentando o desejo de se concluir o ensino médio, num ambiente amigável e seguro para desenvolver todas as dimensões que o jovem desejar.
A reforma do Ensino Médio caminha nessa
direção, mas, além de necessitar de ajustes em sua implementação, não será
suficiente. São imprescindíveis ações que incentivem a progressão e conclusão,
a transição entre escola e o trabalho, ou para a continuidade dos estudos, no
ensino técnico ou superior.
Dentre ações para aumentar a conclusão do
médio, uma proposta em debate neste momento de transição de governos é o
pagamento de incentivos financeiros aos jovens. Uma síntese de evidências dessas políticas, divulgada há 10
dias pelo Dados para um Debate Democrático na Educação, mostra que programas
com desenho adequado a cada contexto social, metas claras e focados nos que
mais precisam podem gerar resultados positivos. No entanto, coerente com o
mantra de que não há bala de prata, não devem ser vistos como única ou grande
solução.
Também não devemos ignorar nossa oceânica
desigualdade social. Mesmo que um jovem em situação de vulnerabilidade se forme
numa escola de qualidade, não terá igual apoio, redes de contato, condições de
se manter estudando, oportunidades de empregabilidade, perspectivas de
mobilidade social ou mesmo se permitirá sonhar de forma tão ambiciosa em
comparação com quem teve a sorte de nascer numa família de maior renda e
escolaridade.
Nesse sentido, há dois eixos que devem
complementar o educacional: geração de renda e engajamento com participação. O
primeiro exige oportunidades de renda e trabalho específicos para os jovens ao
fim do Ensino Médio, técnico ou da graduação. Aqui, há possibilidade de
construção de novos padrões de articulação de políticas públicas nos
territórios – desde micro ou mesorregiões até arranjos nas periferias. Temos,
por exemplo, oportunidade de maior integração entre escolas estaduais, Institutos
Federais de Educação, escolas técnicas estaduais e universidades, além do
Sistema S – todos em diálogo com os setores econômicos locais. É fundamental
que Estado e setor privado se articulem para alinhar competências esperadas,
que formações e cursos estejam vinculados a essas necessidades, e que ambos
foquem em ampliar as ofertas de vagas para esse público.
O segundo eixo, de participação e
engajamento, é crucial para permitir a expressão da subjetividade de cada
indivíduo e potencializar a construção conjunta da política entre governo e
juventude. De igual modo, devem ser desenvolvidas atividades relacionadas à
arte, música, dança, religião, esporte, cidadania, comunicação, tecnologia,
política e lazer. Aqui, novamente, o contraste entre as possibilidades
associadas ao CEP, raça e outras características são punitivas dos mais
vulneráveis e, por isso, solicitam a atuação intencional do Estado.
As políticas públicas no Brasil focaram
historicamente em ofertar cada um desses eixos de forma fragmentada. Mas há
bons exemplos recentes de políticas integradas, como é o caso de Alagoas. Ainda
é cedo para tirar conclusões, mas indicadores como o aumento de 23% nos
matriculados na rede estadual de 2021 para 2022 e a reativação de um Conselho
Estadual das Juventudes ativo e bem articulado sugerem um caminho virtuoso.
No estudo “Consequências da violação do direito à educação”, Ricardo
Paes de Barros e coautores estimam em 3,3% do PIB a perda gerada pelo fato de
meio milhão de jovens chegar à vida adulta sem concluir o ensino médio, sem
falar nos impactos sociais, emocionais e existenciais. Sabemos quanto nos custa
o descaso. É hora de mudar a chave para potencializar os sonhos de nossas
juventudes. Ganharemos todos.
*Ricardo Henriques, economista, é
superintendente-executivo do Instituto Unibanco e professor associado da
Fundação Dom Cabral
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