É tarefa urgente combater aumento de casos da dengue
O Globo
O ano de 2025 começa com previsões alarmantes
sobre proliferação de doença letal e evitável
É preocupante o alerta feito pelo Ministério
da Saúde a estados e municípios sobre o possível aumento de casos
de dengue nos
primeiros meses deste ano. Significa que uma situação que já é dramática pode
se tornar ainda pior se as medidas necessárias não forem tomadas a tempo. Em
2024, diante de ações tíbias das autoridades sanitárias dos três níveis de
governo, a doença se espalhou, batendo todos os recordes. Pelos números
oficiais, foram 6.644.336 casos registrados — quase quatro vezes mais que no
ano anterior — e 6.041 mortes (outras 875 estão sob investigação).
Projeções do Ministério para a temporada 2024-2025 estimam que os estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Tocantins, Mato Grosso do Sul e Paraná poderão apresentar incidência maior do que no ano passado. Outra preocupação é que, apesar de os sorotipos predominantes ainda serem o DENV1 (73,4%) e o DENV2 (25,9%), o DENV3, para o qual a maior parte da população brasileira não tem imunidade, já circula em estados como Amapá, São Paulo, Minas Gerais, Paraná, Roraima e Pará.
O combate à doença tem se mostrado desafiador
ao longo dos anos. Em fins de 2023, o governo federal incorporou ao SUS a
vacina Qdenga, da farmacêutica japonesa Takeda. Foi um avanço, sem dúvida. Ela
protege contra os quatro sorotipos de dengue e é aplicada em duas doses.
Aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em março de
2023, começou a ser oferecida em fevereiro do ano passado. Embora tenha
demonstrado eficácia e segurança na proteção contra a dengue, ainda não pode
ser usada em larga escala, devido à capacidade limitada de produção. É
distribuída apenas aos municípios que têm maior incidência da doença, sendo
destinada prioritariamente ao público de 10 a 14 anos. Ainda não é uma
estratégia que impacte os números da dengue.
É verdade que o Brasil tem boas perspectivas
com uma outra vacina. O imunizante desenvolvido pelo Instituto Butantan, em
parceria com os Institutos Nacionais de Saúde dos Estados Unidos (NIH),
demonstrou 89% de proteção contra dengue grave e, segundo os desenvolvedores,
apresenta eficácia e segurança prolongada por até cinco anos. Um dos aspectos
positivos é que seria aplicado em dose única, facilitando a logística. Mas
ainda está sob análise da Anvisa. Mesmo que seja aprovado rapidamente, como se
espera, é improvável que comece a ser aplicado imediatamente, devido aos
trâmites legais de incorporação ao SUS e às demandas de produção.
A dengue pode levar à morte, como comprovam
os números. Com a escassez de vacinas, o combate à doença exige cada vez mais a
velha e conhecida prática de eliminação dos focos do mosquito transmissor. Por
décadas, o Brasil tem falhado nessa tarefa, como demonstram os números
crescentes. Esse esforço depende das prefeituras, dos estados, do governo
federal e também da população, uma vez que a grande maioria dos focos está
localizada nas residências. O Ministério da Saúde deveria aumentar as campanhas
educativas, fundamentais para esclarecer os cidadãos. Municípios e estados
deveriam criar “batalhões” de agentes para ir de casa em casa inspecionar os
focos. Enquanto não for possível vacinar maciçamente a população, esse trabalho
básico ainda é a forma mais eficaz de combater o mosquito.
Tragédia dos incêndios na Califórnia traz
lições ao Brasil e ao mundo
O Globo
É preciso grande mobilização de recursos e
treinamento para prevenir e combater o fogo
Os incêndios que atingiram a Califórnia e
sitiaram Los
Angeles são um alerta de alcance global. Há características
específicas das áreas atingidas pelas chamas no Oeste americano. As florestas
californianas são naturalmente mais inflamáveis, devido a pinheiros e outras
árvores que contêm grande quantidade de resinas que facilitam a combustão. Os
ventos fortes vindos do Pacífico ajudam a propagar o fogo em velocidade alta. A
partir de 2020, segundo estudo publicado na revista Science, os incêndios
passaram a se espalhar num ritmo quatro vezes maior do que há 20 anos. Tudo
isso é particular daquela região.
O que a Califórnia tem em comum com outras
áreas dentro e fora dos Estados Unidos é
a previsão de condições climáticas cada vez mais propícias a desastres. O ano
de 2024 foi o primeiro a romper a marca de 1,5°C de aumento na temperatura
média do planeta em relação aos níveis pré-industriais, segundo dados
divulgados pela agência europeia do clima. Os incêndios na Califórnia e a
constatação de que a Terra está esquentando numa velocidade acima de previsões
anteriores deveriam servir de alerta para as autoridades brasileiras nas três
esferas de governo. No ano passado, até meados de setembro, o Brasil havia
registrado, pelo sistema BDQueimadas, do Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais (Inpe), 180.137 focos de incêndio, pouco mais que o dobro do
verificado no mesmo período do ano anterior.
Uma das lições da atual catástrofe nos
Estados Unidos é a necessidade de repensar medidas de prevenção e, se o pior
acontecer, mobilizar rapidamente uma grande quantidade de recursos. A
Califórnia é um estado rico. Se fosse um país, seria a quinta maior economia do
mundo. Mesmo assim, não soube se preparar adequadamente para a catástrofe. Uma
das falhas foi falta de água para os bombeiros combaterem o fogo. O positivo
foi a ajuda imediata vinda de todos os cantos do país.
O presidente Joe Biden enviou
cinco aviões e dez helicópteros. Houve, ainda, um grande mutirão entre estados,
além de cidades e condados californianos, para socorrer Los Angeles. Dez
brigadas foram cedidas pelo estado do Novo México, 15 por Utah e outras tantas
mobilizadas pelo Arizona. O estado do Oregon despachou para Los Angeles 240
bombeiros e 60 veículos.
No Brasil, o governo federal e os governos
dos estados da Amazônia e da região do Pantanal deveriam prestar contas sobre o
andamento dos programas de prevenção e de emergência. Não se pode ficar apenas
com campanhas de esclarecimento sobre o manejo da terra. É preciso um alto
investimento na capacitação de brigadas, não só por meio de treinamento, como
também da aquisição de equipamentos — veículos, helicópteros e aviões. Nas
florestas brasileiras e no Cerrado, os incêndios acontecem em regiões remotas.
A experiência do ano passado mostra quanto as ações de combate são falhas. Por
óbvio, o desafio é imenso. Mas o Brasil não pode depender de estações com
grande quantidade de chuva para se ver livre de incêndios.
Estouro da meta de inflação tem as digitais
de Lula
Folha de S. Paulo
Alta do dólar e aquecimento da economia
movido a gasto público contribuíram para que IPCA chegasse a 4,83% no ano
passado
Com alta de 0,52% em dezembro, o IPCA, índice
de preços ao consumidor usado como referência para a política de juros do Banco Central, encerrou
o ano passado em 4,83%, acima do topo do intervalo de 1,5 ponto percentual
ao redor da meta de inflação de
3%.
Desde o advento do regime de metas, em 1999,
é a oitava vez que a variação dos preços supera os limites definidos para a
política monetária —o que deveria desmentir as teses conspiratórias de que o BC
impõe juros desnecessariamente altos ao país.
Embora a inflação de 2024 tenha sido apenas
um pouco maior que a do ano anterior (4,62%), a dinâmica recente é mais
preocupante —com pressões generalizadas, notadamente
no segmento de serviços, que tem característica mais estrutural e de
difícil combate, normalmente exigindo aperto para conter a demanda e desaquecer
a economia.
Em carta aberta ao ministro da Fazenda
divulgada na sexta (10), o presidente do Banco Central, Gabriel
Galípolo, explicou os motivos do estouro e as medidas para trazer o IPCA de
volta à meta.
As razões principais são a inflação importada
(o que inclui a desvalorização do real), o aumento das expectativas para os
preços, a inércia carregada para o ano advinda das pressões que remanesceram de
2023 e a força da atividade econômica além da capacidade produtiva.
Fica claro, pela análise, o peso da alta da
cotação do dólar,
de 24,5% na comparação entre as médias de dezembro de 2024 e de 2023, que
contribuiu com 1,21 ponto percentual do desvio da inflação, mas atenuado pela
queda do petróleo no
exterior.
A carta aponta que há fatores domésticos para
a desvalorização da moeda nacional, notadamente a piora da percepção do risco
fiscal —advinda da irresponsabilidade do governo Luiz Inácio Lula da Silva
(PT), que insiste na expansão contínua e insustentável de gastos públicos.
O impacto para a população em seu dia a dia é
evidente, quando se considera que alimentos no
domicílio ficaram 8,22% mais caros no ano passado, em parte por causa do
aumento de 13,5% nos preços das commodities agrícolas e de 9,7% no da gasolina.
Por certo há efeitos externos que levam à
valorização do dólar, mas não foi por acaso que o real foi a moeda que mais se
desvalorizou entre os principais países no ano passado, como
destacado sem meias palavras pelo BC. Fica desmontada a tese do Planalto de
que tudo não teria passado de um ataque especulativo contra o real em dezembro.
Infelizmente, a esta altura não é fácil
retomar as rédeas da normalidade monetária. A taxa Selic, do BC, já
está em 12,25% anuais e deve subir no mínimo mais 2 pontos percentuais até
março, segundo o Comitê de Política Monetária (Copom).
Parece inevitável um impacto
danoso na atividade e no emprego, o que seria desnecessário se houvesse
maior prudência por parte da administração petista.
Um Judiciário mais custoso nos estados
Folha de S. Paulo
Gastança destoa dos Orçamentos e da situação
fiscal do país; explosão de despesas não é direcionada à melhoria da prestação
jurisdicional
Alheios à desequilibrada realidade fiscal do
país, os sistemas estaduais de justiça abocanham parcelas cada vez maiores dos
Orçamentos das unidades da Federação.
Estudo da Plataforma Justa em
18 estados apontou que as despesas de governos com tribunais, Ministério
Público e Defensoria Pública, de 2022 a 2023, saltaram
até 36%. Este foi o caso de Mato Grosso, cuja alta de gastos gerais no
estado ficou bem aquém (11%).
Deve-se atentar, também, para o abismo entre
os dispêndios e os Orçamentos gerais de cada ente. Na Bahia, os gastos com o
Judiciário aumentaram 18% no período, e o Orçamento cresceu apenas 8%; em Minas
Gerais, a distância é ainda mais assustadora: 30% e 3%, respectivamente.
Tamanha disparidade revela que as carreiras
jurídicas de elite vivem em ilhas de privilégios. Tampouco cabe justificar a
explosão da gastança com
essas instituições sob o argumento de ampliar o acesso à Justiça em um Estado
democrático de Direito.
Isso porque a maior parte das despesas não é
direcionada à melhoria da prestação jurisdicional, mas sim para manter
supersalários e penduricalhos.
Em Pernambuco, por exemplo, 75,8% das verbas judiciais são consumidas pela
folha de pagamento.
É exasperante notar que nem o Judiciário nem
o Congresso estejam sequer remotamente preocupados em reduzir as regalias.
No fim de 2024, o Parlamento, por pressão de
entidades de classe do Judiciário, retirou do pacote de corte de gastos a diretriz
que previa combater os supersalários. A PEC apenas determinava que uma lei
complementar trataria das verbas fora do teto remuneratório, hoje de R$ 44 mil
mensais no âmbito federal.
Se Legislativos e Executivos levassem a sério
o manejo do dinheiro público, estariam mais empenhados em estancar seguidos
rompantes perdulários.
Os sinais vindos do Judiciário também não são
animadores. O presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Luís
Roberto Barroso, defendeu que o Poder não
tem responsabilidade pela crise fiscal —como se os recursos pagos a
magistrados e outras carreiras jurídicas não fossem oriundos do Orçamento
público.
O sistema judicial estadual é indispensável
para que a população possa fazer valer seus direitos; a miríade de ordenados e
mordomias injustificados, por outro lado, nem de longe é essencial e diverge
de países de maior renda.
Cabe aos governos e Legislativos estaduais, e por óbvio ao próprio Judiciário, reconhecerem que a farra com dinheiro público não é justiça, mas obscenidade.
Festa da democracia relativa
O Estado de S. Paulo
Depois de ter roubado a eleição, o ditador
Maduro completa a farsa tomando ‘posse’ na Venezuela, sob o silêncio obsequioso
de Lula, aquele para quem a democracia é um ‘conceito relativo’
O ditador da Venezuela, Nicolás Maduro,
inaugurou anteontem um ilegítimo mandato como presidente da Venezuela após ter
sido fragorosamente derrotado nas urnas pelo oposicionista Edmundo González
Urrutia. No falso juramento perante a Assembleia Nacional, o ditador prometeu
uma era de “paz e prosperidade”, além de anunciar o início de uma “nova
democracia”, eufemismo para uma ditadura tão velha quanto abjeta.
Um processo eleitoral fraudado do início ao
fim para favorecer Maduro e, ademais, marcado pela violenta repressão aos
opositores e à imprensa profissional não podia mesmo resultar em outra coisa a
não ser naquele embuste travestido de cerimônia de posse.
Maduro foi entronizado no poder que usurpou
por um séquito de aduladores, civis e militares, que lhe prestam vassalagem em
troca das polpudas benesses estatais que costumam comprar a associação dos
pusilânimes com regimes de força, como o que ele comanda com mãos de ferro há
quase 12 anos. Caso conclua o atual mandato, Maduro será o mais longevo líder
da Venezuela na história do país, superando seu padrinho político, o coronel
Hugo Chávez (1999-2013), e até Simón Bolívar (1819-1830).
A patacoada foi completamente esvaziada de
líderes de peso, um retrato do absoluto isolamento internacional de Maduro,
tratado como pária. Nem a China nem a Rússia, os dois mais poderosos aliados do
ditador venezuelano, enviaram autoridades de alto escalão para prestigiar o
tirano. Por outro lado, como não poderia deixar de ser, os ditadores de Cuba,
Miguel Diáz-Canel, e da Nicarágua, Daniel Ortega, fizeram questão de assistir
pessoalmente à sagração de Maduro.
O presidente Lula da Silva, como se sabe, não
foi aclamar o companheiro venezuelano, mas nem por isso deixou de envergonhar o
Brasil. Depois de adotar uma atitude ambígua em relação à eleição, dizendo que
reconheceria a vitória de Maduro no instante em que ele apresentasse as atas
eleitorais – o que nunca fez –, o governo enviou a embaixadora Glivânia Maria
de Oliveira para representar o País na “posse”, um gesto que, nas palavras do
chanceler de facto Celso Amorim à CNN Brasil, não passou de mero
cumprimento de “um ritual diplomático entre Estados”.
Ao fazê-lo, o Brasil, na prática, reconheceu
a vitória eleitoral de Maduro e seu novo mandato, conquistado na base da
roubalheira e da violência. Havia alternativa: o Chile, por exemplo, não mandou
ninguém para prestigiar o ditador, porque, nas palavras do presidente Gabriel
Boric, a “posse” era “desprovida de legitimidade democrática”.
Recorde-se que Boric é de esquerda – mas, ao
contrário de outros líderes de esquerda na América Latina, como Lula, considera
inaceitável que um regime se perpetue no poder à base da força, ainda que esse
regime seja esquerdista. Boric entendeu muito bem que enviar um representante à
culminação da farsa eleitoral na Venezuela significaria, na prática, reconhecer
a autoridade de um presidente ilegítimo.
Mesmo que Lula fosse lúcido como Boric e
tivesse deixado vazia a cadeira reservada ao representante brasileiro na
“posse” de Maduro, não mudaria o fato incontestável de que o petista foi um dos
principais avalistas da degeneração da democracia venezuelana. A Venezuela não
se transformou em ditadura agora: há anos se sabe que o país é governado por
uma feroz e corrupta tirania, disfarçada por vitórias eleitorais fabricadas
para comprovar o suposto apoio popular.
Apesar das gritantes evidências, Lula chegou
a dizer que aquele país tinha “excesso de democracia”. Mais recentemente,
justificou o apoio da esquerda à ditadura venezuelana dizendo que “a Venezuela
tem mais eleições que o Brasil” e que “o conceito de democracia é relativo”. O
mesmo Lula, depois de receber Maduro com honras de chefe de Estado em 2023,
quando já se sabia que o tirano preparava sua vitória eleitoral na marra, disse
ao companheiro que ele precisava “construir sua narrativa” para se contrapor à “narrativa
que eles têm contado contra você”.
Maduro seguiu o conselho de Lula e construiu
sua “narrativa”: a de que ganhou a eleição presidencial de maneira limpa. Aqui
é Lula quem tenta construir a “narrativa” de que salvou a democracia
brasileira. Em ambos os casos, só os sabujos e os incautos acreditam.
A contenção do preço dos combustíveis
O Estado de S. Paulo
Manutenção de preço da gasolina, do diesel e
do gás produzidos pela Petrobras, a despeito da alta do dólar e da defasagem em
relação à cotação internacional, cheira a congelamento
Há seis meses a Petrobras mantém inalterado o
preço da gasolina que sai de suas refinarias; o último reajuste, em julho de
2024, foi de 7,04%. Para o diesel, a manutenção é maior: a última mudança foi
em dezembro de 2023 e para baixo, com redução de 7,85%. A defasagem em relação
às cotações internacionais dos derivados de petróleo já está em 10% para a
gasolina e em 16% para o diesel, segundo cálculos da Associação Brasileira dos
Importadores de Combustíveis (Abicom). Como lembrou reportagem do Estadão,
na última vez em que a companhia aumentou o valor da gasolina, a defasagem já
beirava os 20%.
Represamento e longos atrasos no repasse de
preços internacionais ao mercado interno foram uma distorção grave que
caracterizou a gestão da empresa no período de 2011 a 2015, sob o governo Dilma
Rousseff. Usada como instrumento de controle da inflação, a Petrobras sofreu
perdas que chegaram a ser calculadas em R$ 100 bilhões, como revelado na época
por um conselheiro da companhia, durante depoimento à Comissão Parlamentar de
Inquérito (CPI) que investigava os escândalos na empresa. Especialistas estimam
que o prejuízo com o congelamento foi superior ao da corrupção do petrolão.
Ao retornar ao Planalto, em 2023, Lula da
Silva passou a repetir de forma obsessiva que iria “abrasileirar” os preços da
Petrobras, que, depois das perdas do congelamento, passaram a seguir um modelo
que levava em conta, entre outros fatores, o câmbio e o preço internacional do
petróleo. Por via pouco transparente, o Preço de Paridade de Importação foi
substituído por outro modelo sobre o qual pouco se sabe.
Decerto Lula da Silva imagina ter acertado,
de uma tacada só, dois objetivos que lhe são caros: elevar a popularidade com o
barateamento dos preços nos postos de combustíveis e frear a inflação por
intermédio do diesel e da gasolina. Afinal, num País em que as cargas circulam
majoritariamente por rodovias, combustível mais caro significa também elevar os
custos de alimentos e quaisquer outros artigos.
O problema são os efeitos colaterais. Na era
Dilma, as perdas se acumularam e, somadas a um aumento descontrolado do
endividamento, quase custaram a solvência da empresa. Para a economia, o efeito
artificial mascara índices que, mais à frente, terão de absorver as ações
reais. Hoje a inflação já roda acima da meta, resultado das incertezas criadas
pela condução errática do governo.
Nos últimos meses de 2024, a cotação do
petróleo, entre US$ 72 e US$ 75 o barril do tipo Brent, de certa forma
compensou a disparada do dólar, que quebrou a barreira dos R$ 6. Foi uma
desvalorização significativa de um produto que bateu picos de US$ 90 o barril
em 2023 e superou os US$ 100 em meados de 2022. A volatilidade do petróleo num
cenário geopolítico conturbado como o atual, porém, é muito grande. Agora
mesmo, diante da possibilidade de possíveis interrupções no fornecimento por
causa de mais sanções dos Estados Unidos contra a Rússia, o preço futuro começa
a passar da casa de US$ 80.
Como se vê, uma empresa como a Petrobras não
terá como colocar sua política comercial à disposição do lulopetismo por tempo
indeterminado. A Federação Única dos Petroleiros (FUP), entidade sindical que
elevou seu poder de influência na Petrobras sob a gestão petista, fez neste
início de ano um paralelo entre os preços nas refinarias da companhia em
dezembro de 2024 e em dezembro de 2022, antes, portanto, da posse de Lula. Os
cálculos apontam que a queda no preço do litro do diesel foi de 21,6%; para o da
gasolina, de 0,9%; e para o GLP (gás de cozinha), de 16,9% o botijão de 13
quilos.
Colocando-se como corresponsável pela
“conquista”, a FUP revela, para surpresa de ninguém, que as duas únicas
refinarias privatizadas não conseguiram manter o mesmo padrão. É óbvio que
nenhuma empresa sustenta reduções artificiais de preços. Por período prolongado,
nem mesmo gigantes como a Petrobras conseguem, como constatou o Tribunal de
Contas da União ao atribuir à venda de combustíveis abaixo do preço de mercado
entre 2011 e 2015 a rápida deterioração financeira da empresa.
O desafio dos carros chineses
O Estado de S. Paulo
Fusão entre Honda e Nissan mostra como é
difícil resistir à ofensiva chinesa
As montadoras Nissan e Honda assinaram
recentemente um memorando de entendimento (MOU) descrito pelas companhias como
uma “opção para manutenção da competitividade global”. Na prática, tentarão
combinar forças, em um movimento que pode também vir a envolver a Mitsubishi,
para não serem engolidas pelas automobilísticas chinesas.
A expansão dos carros híbridos e elétricos
chineses pelo mundo desafia a indústria mundial de automóveis como um todo, mas
a estratégia de fusão das companhias japonesas é carregada de simbolismo
porque, se agora são as montadoras chinesas que representam uma nova era de
avanços tecnológicos, nos anos 1980 e 1990 foram os carros japoneses, em geral
menores e menos poluentes, que revolucionaram o mundo e ganharam mercados como
o norte-americano, o que acabou por abalar o domínio da trinca GM, Ford e Chrysler
– as duas primeiras muito conhecidas do público brasileiro.
Desafiadas em seu próprio território, as
montadoras dos Estados Unidos foram buscar na China a expansão e os lucros que
minguavam em casa. E em um primeiro momento foram muito bem-sucedidas. A GM,
por exemplo, previu corretamente a força do mercado chinês, no qual chegou a
ser líder de mercado, e a importância dos veículos elétricos. Dados recentes,
porém, mostram que a GM amarga agora a 16.ª posição em vendas no maior mercado
de automóveis do mundo.
Parte do erro da GM, e das demais fabricantes
de veículos estrangeiras que se instalaram na China, foi subestimar a
capacidade dos chineses de aprender e inovar. Quando permitiu que montadoras de
outros países se instalassem em território chinês, Pequim ofereceu subsídios a
essas empresas, com a contrapartida de que houvesse transferência de
tecnologia.
Altamente dependente da importação de
petróleo, a China já planejava um mercado interno dominado por carros movidos
por fontes alternativas de energia, em especial as baterias elétricas.
Agora, as montadoras estrangeiras que
remetiam para suas matrizes os lucros polpudos que obtinham no mercado chinês
veem os carros desenvolvidos por concorrentes chinesas avolumarem-se não apenas
no país asiático, como proliferarem mundo afora.
De acordo com o Financial Times, as
vendas de veículos elétricos na China devem superar pela primeira vez, em 2025,
as dos tradicionais carros a combustão. A meta original do governo chinês era
de que tal marca fosse alcançada somente em 2035. Além disso, mesmo a Tesla,
outra líder global em veículos elétricos cujo desenvolvimento contou com
subsídios do governo dos EUA, produz boa parte de seus carros na China.
Às concorrentes estrangeiras, resta rever suas estratégias, como buscam fazer a Honda e a Nissan. Embora não se possa afirmar que o movimento das companhias japonesas dará certo, o fato é que as montadoras mais tradicionais estão atrasadas em relação às chinesas e precisarão se reinventar rapidamente. Não é questão de liderança nas vendas ou conquista de mercados, mas de vida ou morte.
Limite climático exige melhores respostas
Correio Braziliense
É suicida aceitar que fenômenos como seca
extrema, ondas de calor intenso e incêndios de grandes proporções farão
invariavelmente parte do cotidiano das cidades, demandando a resiliência de
seus moradores para se adaptarem aos novos tempos
Impulsionada pelo Globo de Ouro, Fernanda
Torres tinha uma série de compromissos em Los Angeles, na última semana, para
pavimentar o caminho de Ainda estou aqui rumo ao Oscar. A Califórnia,
porém, arde em chamas desde terça-feira, comprometendo a rotina da icônica
cidade norte-americana. Fernanda saiu de cena para se proteger de "uma
tempestade de fogo histórica e perfeita", resultado da combinação sem
precedentes de incêndios florestais, ventos fortes, seca extensa, pouco
controle e múltiplos focos. Mas o enredo é muito mais dramático: o desafio de
lidar com os recordes climáticos se espalha pelo planeta junto com a perigosa
sensação de que se configura um "novo normal" a partir da recorrência
dos fenômenos extremos.
Relatórios divulgados nos últimos dias por
diferentes centros de estudo climático confirmam a gravidade da situação. Como
esperado, 2024 foi o ano mais quente da história, mas também o primeiro em que
se ultrapassou o teto de aumento de temperatura de 1,5ºC, em relação a níveis
pré-industriais, definido no Acordo de Paris, em 2015. O limite foi
estabelecido, à época, para 2100. Porém, em três quartos dos dias de 2024, a
média registrada pelos termômetros ultrapassou o combinado, segundo o
observatório Copernicus, da União Europeia.
O Brasil fechou o ano passado com um
aquecimento médio de 1,8ºC, conforme o Berkeley Earth. O centro climático
estadunidense também calcula que 40% da população mundial, o equivalente a 3,3
bilhões de pessoas, enfrentou calor recorde nos últimos 12 meses — o número de
atingidos é mais um inédito. Na avaliação da Organização das Nações Unidas, o
compilado de dados prova "que o aquecimento global é um fato
incontestável". Irrefutável, mas não definitivo.
É suicida aceitar que fenômenos como seca
extrema, ondas de calor intenso e incêndios de grandes proporções farão
invariavelmente parte do cotidiano das cidades, demandando a resiliência de
seus moradores para se adaptarem aos novos tempos. Ultrapassar o teto
estipulado em Paris não pode ser entendido como o fim do acordo ou da esperança
de que é viável estabelecer uma relação sustentável com o planeta.
Ao Correio, Ernesto Rodríguez Camino,
meteorologista da Associação Meteorológica da Espanha, ressaltou que o mais
importante é evitar que os números recordes se tornem "uma nova norma de
longo prazo", o que demanda a adoção de outras medidas para limitar as
emissões de gases de efeito estufa, já que as atuais são "claramente
insuficientes". Não à toa, espera-se que os países cheguem à próxima
Conferência do Clima com as metas climáticas revistas e mais ambiciosas.
Nesse sentido, fará diferença a postura
adotada pelo Brasil nas próximas mesas de negociação climática. O país é sede
da COP30, em novembro, e preside, neste ano, o Brics, grupo com integrantes que
estão entre os maiores emissores de gases de efeito estufa do mundo, como
China, Rússia e Índia. A volta de Donald Trump, adepto do negacionismo
climático, à presidência dos Estados Unidos, deixa a agenda ainda mais
desafiadora. Com tantos conflitos de interesse e a comprovada trajetória
acelerada de aquecimento, é plausível esperar que 2025 não fuja da curva e
também registre os seus recordes. Mas que seja em um momento de redefinição de
rota. A barreira da sobrevivência ainda não foi definitivamente ultrapassada.
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