Governadores
e prefeitos precisam alertar a população para a importância da imunização
A
politização das vacinas no Brasil — assunto que deveria permanecer imune às
idiossincrasias da política — já começa a surtir efeitos nefastos para a saúde
pública, antes mesmo que qualquer uma das cerca de 200 candidatas pesquisadas
em todo o mundo tenha se tornado realidade.
Segundo
pesquisa PoderData, o percentual de brasileiros dispostos a se vacinar contra o
novo coronavírus caiu de 85% para 63% em menos de quatro meses (entre início de
julho e fim de outubro). A rejeição subiu de 8% para 22% nesse período. Não
surpreende que, entre apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (os que avaliam o
governo como ótimo ou bom), a rejeição à vacina seja de 33%, superando a dos
grupos que consideram a gestão ruim ou péssima (17%) e regular (11%).
Bolsonaro
tem sido protagonista de uma campanha contra a obrigatoriedade da vacina,
animando os terraplanistas de ocasião que fazem o Brasil regredir ao início do
século passado, quando houve no Rio de Janeiro a Revolta da Vacina. Já era
patético naquela época.
Em
conversa com apoiadores, Bolsonaro disse que “não pode um juiz decidir se você
vai ou não tomar vacina”. Soou como recado ao presidente do Supremo Tribunal
Federal (STF), Luiz Fux, que atribuíra à Justiça o papel de definir os
critérios para uma futura vacinação. Criou-se mais um conflito improdutivo,
depois do embate ríspido com o governador paulista, João Doria, em torno da
CoronaVac, a vacina chinesa testada pelo Instituto Butantan. Doria também
politizara a questão ao prometer, sem base técnica, começar a vacinar a
população em dezembro.
A
sucessão de controvérsias políticas cria o clima propício à desinformação e à
criação de expectativas irreais em torno da vacina. Muitos esperam proteção
total contra a Covid-19, mas isso é improvável. Uma vacina com 50% de eficácia
já seria um grande feito. Aplicada em larga escala, permitiria a retomada
sensata das atividades com baixo risco para os sistemas de saúde. Para ampliar
o benefício coletivo, é essencial que a maior parcela possível da população se
imunize. Daí a importância da vacinação compulsória. Sob a ótica da saúde
pública, é estéril a discussão sobre a obrigatoriedade. O Código Penal já prevê
punição para quem não se vacina. As sanções mais comuns nada têm de
policialesco. Envolvem multas ou comprovação de vacinação para matrículas ou
acesso a benefícios.
É
previsível que Congresso e Judiciário assumam algum protagonismo. Mas só leis e
decisões judiciais não bastam. O vírus só será derrotado se forem imunizados
brasileiros em número suficiente. “Uma mensagem clara e consistente para
administrar expectativas é chave para criar confiança”, recomenda a revista
científica “Nature Biotechnology”. Diante da hesitação do governo federal, é
essencial que autoridades estaduais e municipais se unam para, assim que
estiver disponível uma vacina de segurança e eficácia comprovadas,
conscientizar a população para os critérios de distribuição e aplicação. A
segunda onda da pandemia na Europa e nos Estados Unidos demonstra que não é
questão menor.
Bolsonaro mina a própria credibilidade ao retomar concurso para policiais – Opinião | O Globo
Presidente
induz desconfiança na reforma administrativa liderando pressão por aumento de
gastos
Jair
Bolsonaro e um dos seus filhos parlamentares, o deputado federal Eduardo,
anunciaram na semana passada a retomada de concursos públicos para contratar
quatro mil policiais federais ainda neste ano. O presidente fez até uma inusitada
gravação em vídeo de propaganda para o “cursinho” de um dos seus amigos
policiais, estimulando alunos a disputar vagas. As cenas de propaganda
estrelando a família presidencial expõem a fragilidade das decisões do Palácio
do Planalto.
É
difícil imaginar que Bolsonaro e seu filho Zero Três tenham esquecido a Lei
Complementar nº 173. Ela foi assinada há 150 dias pelo próprio presidente.
Estabelece de forma expressa que “é nulo de pleno direito” qualquer ato “que
provoque aumento da despesa com pessoal” até o último dia do próximo ano. É
inconcebível que o chefe do governo, a pretexto de atender a interesses
políticos e familiares, acene com a possibilidade de não obedecer à legislação
em vigor.
Notável
também é a fixação de Bolsonaro num único segmento do serviço público: os
policiais. No dia 25 de maio, ele assinou a Medida Provisória nº 971,
aumentando em 25% as gratificações de policiais militares e bombeiros e
reajustando em 8% o salário dos policiais civis do Distrito Federal e antigos territórios
— todos custeados pela União. Apenas 48 horas depois, assinou a lei
complementar que “congela” aumentos para o funcionalismo e proíbe contratações
até o final de 2021, véspera do ano eleitoral em que pretende disputar um
segundo mandato.
O
favorecimento a sua categoria predileta é mais um sinal da falta de vontade
presidencial para controlar os gastos, numa etapa em que o endividamento do
setor público alcança nível recorde, com aumento de 30 pontos percentuais em
relação ao patamar de cinco anos atrás, no governo Dilma Rousseff.
O
governo vai começar 2021 com um déficit colossal e a economia em frangalhos por
causa da pandemia. Bolsonaro contribui para aumentar a ansiedade dos credores
da dívida pública sobre a solvência do seu governo. Não é coincidência que o
real só tenha perdido em desvalorização este ano para as moedas do Suriname,
Zâmbia e das Ilhas Seychelles.
Ao
liderar a pressão para mais gastos com pessoal, Bolsonaro inviabiliza o
restabelecimento de um clima de confiança na responsabilidade fiscal do seu
governo. Também lança dúvida sobre seu compromisso com a reforma administrativa
que seu próprio governo enviou ao Congresso e que, embora tímida, representa um
primeiro passo na reformulação necessária do setor público. E, para completar,
manda a conta para o bolso dos governados.
Juros, dólar e inflação palaciana – Opinião | O Estado de S. Paulo
O
presidente é o sujeito oculto de pressões inflacionárias e do agravamento do
risco fiscal. O Banco Central só pode alertar.
O presidente Jair Bolsonaro deve ser grato – se for capaz disso – ao Banco Central (BC) pelo esforço para evitar uma crise mais grave. Qualquer aumento de juros, neste momento, seria perigoso. Complicaria a gestão da enorme dívida pública, muito pesada para uma economia emergente. Além disso, poderia prejudicar a retomada, já insegura, da atividade econômica. Apesar da reação, ainda se estima para 2020 um Produto Interno Bruto (PIB) entre 4% e 5% menor que o do ano passado, com retração na faixa de 4% a 5%. Mais de um ano será necessário, pelos cálculos correntes, para a economia brasileira retomar o nível de produção de 2019.
Nem
isso será possível, no entanto, se o crédito ficar mais caro e se a insegurança
dominar os mercados. O setor público devia cerca de R$ 6,4 trilhões, ou 88,8%
do PIB, no fechamento de agosto. A relação estará em torno de 100% no fim do ano
e deverá crescer nos próximos três anos. Só com muito cuidado e muita
responsabilidade será possível controlar essa expansão e manter a confiança na
ação oficial.
Não
há risco imediato de insolvência, mas essa palavra já apareceu, em linguagem
muito cautelosa, em comentários sobre a dívida pública e a política fiscal.
Longe de qualquer referência a esse risco, o Copom continua, no entanto,
chamando a atenção para a importância da responsabilidade fiscal.
A
mensagem apareceu, de novo, no informe divulgado depois da última reunião do
colegiado. Os juros tenderão a subir, voltou a advertir o comitê, se houver
dúvidas sobre a pauta de reformas e alterações permanentes no ajuste das contas
públicas. As possíveis alterações incluem a eventual manutenção dos estímulos
fiscais usados como resposta à pandemia.
O
“risco fiscal elevado” – expressão sem disfarce – reforça o perigo de inflação
mais alta no horizonte da política monetária, isto é, nos próximos dois anos.
Apesar disso, as projeções ainda apontam alta de preços, nesse período, em
ritmo compatível com as metas oficiais. Permanecem, portanto, segundo a
avaliação do Copom, condições para a manutenção da taxa básica de juros, a
Selic, em 2% ao ano.
Essa
avaliação envolve uma aposta um tanto ousada. A nota menciona o aumento recente
das pressões inflacionárias, mas o choque é qualificado como temporário. Diante
de números acima dos esperados, o Copom elevou sua projeção para os meses
finais de 2020, mas preservou as expectativas de inflação contida a partir daí.
De toda forma, o comitê continuará monitorando a evolução das pressões e dos
indicadores.
A
explicação do recente choque inflacionário é o ponto mais interessante dessa
passagem. O texto realça a “continuidade da alta nos preços dos alimentos e dos
bens industriais, consequência da depreciação persistente do real, da elevação
de preço das commodities e dos programas de transferência de renda”.
Se
a ordem das palavras faz diferença, essa análise atribui mais importância à
alta do dólar, como fator inflacionário, do que às condições do mercado
internacional e ao nível da demanda doméstica. Faltou explicar a depreciação do
real, ou, como contrapartida mais visível, a valorização da moeda americana
diante da brasileira.
Eventos
internacionais explicam parte da movimentação cambial, mas as causas internas
são importantes e manifestam-se com frequência. As causas internas mais
visíveis têm sido as tensões políticas e as incertezas sobre a evolução da
política fiscal. Essas incertezas são acentuadas pelas pressões por maiores
gastos.
A
equipe econômica tenta resistir, mas os ministros favoráveis aos gastos contam
com a tolerância presidencial. Além disso, o presidente cuida prioritariamente,
há muito tempo, da reeleição e de outros objetivos pessoais. Eventuais declarações
em defesa do teto de gastos são insuficientes para disfarçar as preocupações
eleitorais e a desatenção à política fiscal e ao endividamento. O presidente é
o sujeito oculto de pressões inflacionárias e do agravamento do risco fiscal. O
BC só pode alertar. Conter o presidente ultrapassa as suas funções.
Fantasias e planos – Opinião | O Estado de S. Paulo
Candidatos
a cargos eletivos devem apresentar planos factíveis aos eleitores.
Um candidato a cargo eletivo deve ter a capacidade de projetar no imaginário dos eleitores um mundo melhor do que o conhecido por eles, evidentemente. Porém, mais do que sonhos, os candidatos sérios apresentam planos factíveis ao escrutínio público. Os que agem assim demonstram ser responsáveis, conciliando o apelo emocional das propostas à sua viabilidade, o que é muito importante em uma campanha eleitoral. Por mais que a utopia perca o seu charme quando encontra as limitações da realidade, é sempre melhor ser claro e honesto com a sociedade.
Há
candidatos à Prefeitura e à Câmara Municipal de São Paulo que parecem
desconhecer os limites de atuação dos cargos que almejam ocupar, prometendo aos
paulistanos medidas que simplesmente não podem ser executadas em âmbito
municipal – como legislar sobre matéria penal, como fazem alguns candidatos à
vereança – ou são inviáveis do ponto de vista financeiro.
A
pandemia de covid-19 lançou luz sobre a necessidade de amparo socioeconômico
aos cidadãos mais vulneráveis. Propostas nesse sentido, claro, não escaparam ao
debate municipal e estão presentes nos programas de governo de todos os
candidatos à Prefeitura da capital paulista. Entretanto, muitas dessas
propostas extrapolam a esfera de atuação de um prefeito. Outras, embora não
sejam ilegais, são de tal ordem complexas que para serem realizadas exigiriam
uma engenharia técnica e financeira que acabaria por transferir recursos da
Prefeitura para áreas que não fazem parte de seu mister – a saúde, a educação,
a zeladoria urbana e o transporte.
Há
quem fale na criação de um banco municipal exclusivo para atender mulheres da
periferia de São Paulo, na concessão de uma linha de crédito para pequenos
comerciantes de até R$ 3 mil sem juros e sem necessidade de fiança e na redução
de impostos. São propostas com evidente apelo eleitoral, sobretudo em um ano em
que todos os cidadãos foram afetados pela pandemia em algum grau.
Diz-se
que “ninguém mora na União, as pessoas vivem nos municípios”. É verdade. A
prefeitura tem um papel importantíssimo na vida diária da população. Políticas
públicas adotadas na esfera municipal têm impacto direto na vida dos cidadãos.
Tanto é assim que, a despeito da deliberada distorção feita pelo presidente
Jair Bolsonaro, o Supremo Tribunal Federal (STF) já reconheceu este fato ao
reafirmar a competência concorrente da União, dos Estados e municípios para a
adoção de medidas de combate ao novo coronavírus. Mas a prefeitura será muito
mais útil na mitigação dos efeitos da pandemia caso se concentre em aprimorar a
qualidade da prestação dos serviços que já são de sua competência.
“Criar
um aparato público municipal ligado a crédito não é comum. Isso exige gestão de
ativos de um banco, eventuais aportes do Tesouro. Não que não possa ser feito,
mas não sei se os municípios têm bala na agulha para investimentos desse tipo”,
disse ao Estado o
analista Fábio Klein, da Tendências Consultoria.
Segundo
Marcos Mendes, pesquisador do Insper, medidas como a concessão de uma linha de
crédito poderiam ser viabilizadas a partir de um “fundo de aval” aprovado pelo
Poder Legislativo municipal. Mendes também destaca que não é preciso abrir um
banco municipal para oferecer microcrédito, é possível fazê-lo por meio de
convênio com instituições já estabelecidas. “Sairia muito mais barato. Um banco
exige capital, regulação, governança. Tudo isso consumirá tempo, dinheiro e
talentos”, disse o economista.
A
Prefeitura de São Paulo não pode se dar ao luxo de desperdiçar recursos humanos
e financeiros.
Os
programas de governo estão sob escrutínio público e um deles há de sair
vitorioso das urnas. É muito importante que os eleitores de São Paulo os
avaliem criteriosamente, identificando o que são planos factíveis e o que não
passa de uma fantasia. Serão anos muito difíceis até que o País esteja
plenamente recuperado das agruras de 2020. Não convém aprofundar a crise.
O desencanto dos jovens com a democracia – Opinião | O Estado de S. Paulo
Pandemia
despertou o espírito cívico, mas, passado esse salutar transe, futuro é
incerto.
Em nossa época o “mal-estar” da democracia tornou-se um lugar-comum. Um estudo do Centro para o Futuro da Democracia de Cambridge mostra que a sensação difusa de que os jovens estão “desconectados” do processo democrático espelha um fato mensurável. Com base em amplas evidências – são mais de 4,8 milhões de entrevistados e 43 fontes de 160 países entre 1973 e 2020 –, a pesquisa mostra que a insatisfação com a democracia não só é maior entre os jovens do que entre seus contemporâneos mais velhos, mas maior do que nas gerações anteriores no mesmo estágio da vida.
A
frustração é compreensível. Nos países desenvolvidos, há uma crescente
disparidade intergeracional nas oportunidades de vida: décadas de crescimento
da desigualdade relegaram aos jovens dificuldades em encontrar empregos
estáveis, adquirir uma casa, formar uma família ou subir na vida. Nos países em
desenvolvimento, passada a transição democrática dos anos 70 aos 90, muitos
enfrentam os desafios endêmicos da corrupção, ineficiência do Estado e
disparidades na aplicação da lei.
Uma
interpretação otimista é de que o declínio da satisfação com a democracia
reflete uma geração crítica ao seu funcionamento, mas não aos seus ideais. No
outro extremo, uma interpretação alarmista acusa uma crescente simpatia dos
jovens por valores autoritários. Por um paradoxo aparente, a emergência dos
populismos sugere que, entre a apatia e a antipatia em relação à democracia, a
verdade está no meio.
Nos
últimos anos, tropas dos chamados millennials apoiaram partidos populistas à
direita e à esquerda. O fenômeno intrigante é que as ondas populistas foram
acompanhadas de uma acentuada reversão do desencanto com a democracia. Ao fim
do primeiro mandato de um populista, os jovens chegam a estar mais satisfeitos
com a democracia do que seus pares em outros países – uma exceção notável foram
os EUA de Donald Trump, enquanto o Brasil de Jair Bolsonaro confirma a regra.
Ainda mais espantoso é que esse salto ocorre mesmo em casos de contração
econômica.
Ao
mesmo tempo, as tentativas de revitalizar o centro político mostram um efeito
pouco durável na satisfação dos jovens: após um ligeiro repique de um ou dois
anos, segue-se tipicamente uma precipitação do descontentamento e a renovação
das mobilizações populistas. Esse padrão provoca uma questão desconcertante:
será o populismo uma força revigorante?
É
evidente o fracasso dos estamentos democráticos tradicionais em solucionar
agruras como as desigualdades de renda, disparidades regionais, exclusão de
minorias éticas ou a corrupção das elites políticas. Mas se o centrismo pode
ser comparado a um cosmético ou um analgésico de curta duração, que alivia os
sintomas, mas não ataca suas causas, o extremismo populista, ao catalisar
ressentimentos profundos da população, age como um entorpecente: um poderoso
estimulante que intoxica os desiludidos com a democracia com a ilusão da
transformação. Mas no médio prazo, quanto maior a ilusão, maior a frustração.
Se
num primeiro momento o populismo no poder – o delírio do povo “puro” varrendo
as elites “corruptas” – revitaliza a satisfação com a democracia, os dados
mostram que, “quando os governos populistas duram além de dois mandatos, a
satisfação com a democracia declina primeiro gradualmente, depois acentuadamente”.
Qual
será então o remédio? Como concluem os autores do estudo, é preciso “menos foco
no ‘populismo’ como uma ameaça e mais nas promessas fundadoras da democracia”.
Um
efeito de crises globais como a de 2008 ou a atual é expor agudamente as disfuncionalidades
crônicas dos sistemas sociopolíticos. Como dizia Aristóteles, toda tragédia
desperta uma purificação (catharsis)
pela experiência do pavor e da compaixão. A catástrofe da covid-19 despertou o
espírito cívico, manifesto em expressões de solidariedade viralizadas por todo
o planeta. Mas, passado esse transe salutar, o futuro é incerto. A crise pode
ser o início de uma radical, mas conscienciosa, reforma do pacto social – ou de
uma espiral de degradação democrática.
Segunda onda – Opinião | Folha de S. Paulo
Retomada
de pandemia na Europa abala mercados e ameaça recuperação do Brasil
Outubro
termina com a notícia de que a Europa cresceu bem mais do que o esperado no
terceiro trimestre do ano. Quase ao mesmo tempo, as maiores economias da zona
do euro anunciam a volta de medidas sanitárias estritas a fim de evitar
aglomerações e um descontrole ainda maior da pandemia —agora em sua segunda
onda.
O
Produto Interno Bruto conjunto dos países que adotam a moeda comum elevou-se
em 12,7% do segundo para o terceiro trimestre, embora siga 4,3% menor
que no mesmo período do ano passado. Segundo as previsões de governos e bancos
centrais da região, ademais, haverá nova recessão no quarto trimestre deste
2020.
O
Banco Central Europeu já indicou que vai promover nova rodada de estímulo à
economia no final do ano. Resta agora apenas esperar que a segunda onda e a
recaída na recessão sejam tão breves e brandas quanto possível.
Os
sinais da retomada do contágio apareceram no início de setembro, e o aumento do
número de mortes ganhou velocidade desde então. Na União Europeia, o número de
óbitos por milhão de habitantes era de 0,82 no início de outubro, de 1,23 em
meados do mês e de 2,86 nesta sexta (30) —acima da taxa brasileira, de 2 por
milhão, e da americana, de 2,43.
Ainda
no mês, um indicador econômico que antecipa o desempenho do PIB já mostrava
contração, pois o declínio do setor de serviços —o maior em qualquer economia
moderna— apagou o ainda bom resultado da indústria. Com os novos lockdowns, o
resultado será notavelmente pior em novembro.
A
situação da atividade nos Estados Unidos é ligeiramente melhor que na Europa,
com queda do PIB de 2,9% em relação ao ano passado (dados do terceiro
trimestre).
Já
a situação
epidêmica é algo incomparável —no conjunto, o país vive uma espécie de
terceira onda, sem que tenha jamais controlado a doença de modo que os europeus
o fizeram em julho e agosto.
Os
mercados financeiros, em parte também estressados por causa da eleição
americana, refletem o medo de grave recaída recessiva. Na média mundial, as
Bolsas tiveram a pior semana desde março.
Como
seria de esperar, o Brasil sofre o contágio, por ora, nos
mercados. Fragilizado pela epidemia e pela paralisia da política econômica,
pode ver sua recuperação abalada, ao menos em parte, pela retração nos EUA e na
Europa.
O
aperto das condições financeiras, refletido em altas do dólar e das taxas de
juros de longo prazo, pode ser maior, dada a tensão mundial renovada. A
turbulência é agravada pela incerteza quanto ao Orçamento e as reformas
—enquanto da política sanitária de Jair Bolsonaro nada se pode esperar.
Em
meio a dificuldades da esquerda nas eleições, Lula e Ciro retomam diálogo
Foi
encarada com ceticismo em toda parte a notícia de que o ex-presidente Luiz
Inácio Lula da Silva (PT) e o ex-ministro Ciro Gomes (PDT) ensaiam
uma reaproximação, após dois anos de estranhamento.
Afastados
desde a campanha presidencial de 2018, eles se reencontraram em segredo no
início de setembro e passaram uma tarde conversando sobre suas desavenças e a
conjuntura política, em São Paulo.
Revelado
o movimento pelo jornal O Globo na quinta-feira (29), os dois campos emitiram
sinais trocados sobre seu significado, expondo as dificuldades que a esquerda
encontra para aglutinar forças desde a eleição de Jair Bolsonaro.
Ciro
se declarou disposto a dialogar com todos os que se opõem ao atual governo. A
presidente do PT, Gleisi Hoffmann, condicionou qualquer avanço do diálogo a um
pedido de desculpas público de Ciro pelos ataques desferidos contra Lula e seu
partido no passado.
O
ex-ministro ficou em terceiro lugar no primeiro turno da eleição presidencial e
depois se recusou a apoiar o petista Fernando Haddad, que fracassou na
tentativa de uma aliança mais ampla para enfrentar Bolsonaro na segunda rodada.
O
encontro de Lula e Ciro teve como pano de fundo as dificuldades enfrentadas
pela esquerda nas eleições municipais deste ano, em que os principais partidos
preferiram lançar nomes próprios e se distanciaram de tradicionais aliados.
PT
e PDT se separaram na corrida às prefeituras das capitais e se uniram apenas em
cidades menores. Em São Paulo, Jilmar Tatto (PT) e Márcio França (PSB, apoiado
pelo PDT) estariam fora do segundo turno hoje. No Rio e em Fortaleza,
candidatos das duas siglas disputam os votos à esquerda.
Confrontados
com o risco de sofrer novas derrotas nas urnas neste ano, é natural que Lula e
Ciro olhem o futuro com apreensão e sentem para pôr a conversa em dia. É
possível que tenham aberto caminho para alianças que evitem o pior no segundo
turno da eleição.
Daí
para a formação de uma coalizão capaz de enfrentar Bolsonaro em 2022, como o
líder petista sugeriu nesta semana, há um longo caminho a percorrer —e tudo
indica que será bastante acidentado.
Ciro, que persegue a Presidência da República desde as eleições de 2002, não dá mostras de ter desistido dessa ambição. Lula segue impedido pela Justiça de concorrer, mas nem assim o PT parece disposto a abrir mão do protagonismo que exerceu nos últimos anos.
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