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Tudo para se reeleger e vender mais livros
Um presidente pode mentir aos cidadãos e depois alegar que o fez para não criar pânico? E um jornalista? Pode guardar em segredo durante seis meses uma informação capaz de mudar o destino do seu país? Foi o que fizeram nos Estados Unidos Donald Trump e Bob Woodward, editor do jornal Washington Post.
Em fevereiro último, Trump declarou a Woodward, em conversa gravada, que o coronavírus era um problema grave – o contrário do que dizia em público. Famoso desde o escândalo que derrubou nos anos 60 o presidente Richard Nixon, o jornalista guardou a notícia para só publicá-la em livro a ser lançado na próxima semana.
“É um vírus problemático. É muito delicado. É mais mortal do que as gripes mais duras”, admitiu Trump. “E agora está se mostrando que não são apenas as pessoas mais velhas que morrem, Bob. Morrem também muitos jovens”. Foram 18 entrevistas concedidas por Trump ao jornalista entre dezembro e julho passados.
Numa delas, no dia 19 de março, o presidente reconheceu que minimizava a pandemia porque “não queria criar pânico”. Segundo ele, seu trabalho era “manter” os Estados Unidos “seguro”. Na mais recente entrevista, defendeu-se: “O vírus não tem nada a ver comigo. Foi a China que deixou o maldito vírus sair” de lá.
Trump é um mentiroso compulsivo. O Washington Post, em menos de quatro anos, já contabilizou e expôs parte das 20 mil mentiras esgrimidas por ele. A Woodward, autor do livro “Raiva” sobre a primeira metade do seu governo, aparentemente Trump não mentiu sobre a pandemia. O novo livro se chamará “Fúria”.
Os Estados Unidos são o país com maior número de contaminados e de mortos pelo vírus. Quantas vidas não poderiam ter sido salvas se Trump tivesse dito em público o que só disse ao jornalista? E quantas vidas não poderiam ter sido salvas se Woodward tivesse divulgado antes o que ouviu? Não o fez para vender mais livros.
Sob pressão do presidente John Kennedy, em abril de 1961, o jornal The New York Times deixou de publicar um furo mundial. Um grupo de paramilitares, treinado pela CIA e apoiado pelas Forças Armadas americanas, invadiria Cuba dali a alguns dias. A operação militar fracassou. O jornal arrependeu-se do que fez.
Até quando ficou impossível seguir mentindo, Trump sabotou as medidas de isolamento decretadas por governadores e prefeitos, tentou desacreditar as autoridades médicas, negou-se a usar máscara e anunciou o corte da ajuda financeira do seu governo à Organização Mundial de Saúde. Alguém o imitou por aqui…
E por que Trump procedeu assim? Não foi por desinformação ou ignorância. Ele pode ser tudo, burro não é. Foi por cálculo. Daqui a dois meses haverá eleições. Trump quer se reeleger. Por enquanto, está atrás nas pesquisas do candidato Joe Biden, do Partido Democrata. Mas a vantagem de Biden já foi maior.
No início de março deste ano, o presidente Jair Bolsonaro viajou aos Estados Unidos para mais um encontro com Trump. Ao voltar, soube pelo então ministro Luiz Henrique Mandetta, da Saúde, que se o governo não fosse bem sucedido no combate ao vírus, o número de mortos no Brasil passaria de 100 mil até setembro.
Foi justamente quando Bolsonaro afirmou: “Depois da facada, não vai ser uma gripezinha que vai me derrubar”. A gripezinha o derrubou, e ele levou duas semanas para recuperar-se. Teve mais sorte do que os 128.653 brasileiros mortos até ontem. Tudo pela reeleição que, no seu caso, só acontecerá ou não em 2022.
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