quinta-feira, 10 de setembro de 2020

Bernardo Mello Franco - Fux terá que escolher

- O Globo

A despedida de Dias Toffoli resumiu bem sua gestão à frente do Supremo. Enquanto os ministros da Corte faziam os salamaleques de praxe, Jair Bolsonaro adentrou o plenário cercado de aliados. Sem aviso e sem cerimônia, o capitão se refestelou numa poltrona e passou a acompanhar os discursos.

Não foi o único momento constrangedor da tarde. Indicado por Bolsonaro, o procurador Augusto Aras comparou o presidente do Supremo às flores do Cerrado. “No auge da seca, os ipês nos dão o melhor de si, embelezando a relva ressequida”, filosofou. Em nome da OAB, o advogado Marcus Vinicius Furtado Coêlho disse que a coragem é a “característica central” de Toffoli. Essa ninguém poderia imaginar.

Mais cedo, em visita ao Congresso, Toffoli já havia recebido uma curiosa homenagem do presidente do Superior Tribunal de Justiça. “Todo poder emana do povo. E o Toffoli é povo, o Toffoli é poder”, afirmou o ministro Humberto Martins. O senador Davi Alcolumbre identificou no presidente do Supremo a “coragem dos grandes líderes”. Imodesto, Toffoli concordou com tudo e descreveu sua própria gestão com as palavras “independência” e “altivez”.

Convidado a discursar no Supremo, Bolsonaro relembrou a colaboração do ministro com seu governo. “Até nos surpreendeu na sua capacidade de antecipar problemas e apresentar a solução antes mesmo que fosse procurado”, elogiou. Pareceu uma referência à canetada que suspendeu, por cinco meses, as investigações contra o primeiro-filho Flávio Bolsonaro.

Toffoli dará lugar a Luiz Fux, que toma posse hoje. O ministro vai comandar o Supremo até setembro de 2022. A múltiplos interlocutores, ele tem prometido descolar o tribunal dos interesses do Planalto. Ontem o capitão sugeriu o contrário ao cometer uma indiscrição e reproduzir uma conversa entre os dois. “Vossa Excelência falou pra mim: o que eu precisar do STF, assim como eu tive com Dias Toffoli, terei também com Vossa Excelência”, contou.

Pelo visto, o novo presidente do Supremo precisará escolher alguém para desapontar.

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