Correio Braziliense
Estava escrito nas estrelas
que as emendas parlamentares, sem transparência e rastreabilidade, se tornariam
caso de polícia. Mas são como pasta fora do tubo
A 1ª Turma do Supremo
Tribunal Federal (STF) marcou para 25 de fevereiro o julgamento da denúncia
apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra os deputados
Josimar Maranhãozinho (PL-MA), Pastor Gil (PL-MA) e Bosco Costa (PL-SE),
acusados de desviar recursos das emendas parlamentares. Os três pediram propina
aos prefeitos dos municípios beneficiados pelas emendas. Dezenas de
parlamentares estão sendo investigados em sigilo de Justiça por causa de
suspeitas de irregularidades das chamadas emendas secretas.
Esse julgamento deve aumentar a tensão já latente no Congresso entre os caciques da Câmara e do Senado e o STF, em razão da suspensão da execução de emendas parlamentares pelo ministro Flávio Dino, por falta de transparência. Os presidentes de Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), pretendem se reunir com o presidente do Supremo, Luís Roberto Barroso, para buscar uma solução para o impasse envolvendo as emendas parlamentares.
No caso dos deputados do PL,
o sigilo da investigação foi retirado pelo relator, Cristiano Zanin, que
encaminhou o caso para julgamento. Como presidente da 1ª Turma, é o responsável
pela pauta. Segundo a denúncia, os três parlamentares pediram, "de modo
consciente e voluntário", propina de R$ 1,6 milhão ao prefeito de São José
do Ribamar (MA), José Eudes Sampaio Nunes. O valor seria dado em contrapartida
à destinação de recursos públicos federais ao município. A PGR pede que os
deputados sejam condenados pelos crimes de corrupção passiva e de pertencimento
a organização criminosa. Requer também a perda da função pública.
Outro caso que eleva a
tensão entre os Poderes é a investigação sobre as emendas de comissão suspensas
por Dino. O caso envolve diretamente o ex-presidente da Câmara Arthur Lira
(PP-AL), que transferiu a responsabilidade de indicação das emendas para o colégio
de líderes. O deputado José Rocha (União-BA), que foi presidente da Comissão de
Integração Nacional da Câmara, há duas semanas prestou depoimento à Polícia
Federal como testemunha do caso, a pedido de Dino.
"Formalizei aquilo que
já vinha dizendo publicamente: o Arthur Lira impediu que eu cumprisse
determinação do ministro Flávio Dino de apresentar os nomes dos autores de
todas as emendas propostas pela minha comissão", disse Rocha, após o
depoimento. Lira teria determinado que R$ 320 milhões em emendas fossem
destinadas para Alagoas, sua base eleitoral.
Segundo Rocha, o fato de ter
se recusado a liberar as emendas sem que as determinações de Dino fossem
cumpridas é que levou Lira a suspender as sessões das comissões e atribuir ao
colégio de líderes a responsabilidade de indicar as emendas de comissão, cujos
autores não tiveram os nomes revelados, ou seja, que substituíram o chamado
orçamento secreto.
Tensão entre Poderes
Estava escrito nas estrelas
que as emendas parlamentares, sem transparência e rastreabilidade, se tornariam
caso de polícia. Mas também que são como pasta de dente fora do tubo: não tem
volta. Desde o governo Dilma Rousseff, mas também no governo de Michel Temer e
no governo Bolsonaro, o Congresso avançou de forma gradativa sobre o Orçamento
da União; neste ano, o equivalente a R$ 38, 9 bilhões. Assim como o presidente
do Senado, Davi Alcolumbre, o novo presidente da Câmara não pretende abrir mão
dessa fatia do Orçamento. Quando fala em independência e harmonia entre os
Poderes, o discurso subliminar de Motta é de que o Supremo avança sobre as
prerrogativas do Congresso, quando manda sustar as emendas.
"O que nós temos de
discutir com o Supremo, que não vejo como um embate, mas, sim, como um processo
em que temos que diminuir a tensão, é sobre quais critérios devem ser adotados.
Nós não temos dificuldade em discutir transparência e rastreabilidade. Temos
confiança de que esse diálogo, que se dará agora durante o mês de fevereiro,
irá apresentar, sim, uma solução e um modelo em relação ao Orçamento, para que
essa página possa ser virada", disse Motta, a propósito do contencioso
sobre as emendas parlamentares.
Acontece que Dino suspendeu
o pagamento de R$ 4,2 bilhões em repasses feitos pelos parlamentares que
descumpriram regras de transparência e rastreabilidade. Somente uma parte dos
recursos, destinados à Saúde, foi liberada pelo ministro, a pedido da Advocacia-Geral
da União (AGU). Emendas destinadas a 13 organizações não governamentais (ONGs)
e entidades que não atendiam aos requisitos de rastreabilidade também foram
suspensas, em janeiro deste ano.
Segundo a própria
Controladoria-Geral da União (CGU), 33 entidades, entre 676 beneficiadas pelos
repasses em dezembro de 2024, foram fiscalizadas por amostragem. Apenas 15%
agiram com transparência. Das 13 que tiveram recursos bloqueados, apenas uma
segue com os valores bloqueados. O restante das entidades teve os repasses
restabelecidos após a CGU informar ao Supremo que as entidades promoveram
ajustes e agora cumprem as exigências.
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