quinta-feira, 6 de fevereiro de 2025

Governo sem foco nem luz - Maria Hermínia Tavares

Folha de S. Paulo

As dificuldades são de três tipos: institucionais, políticas e de clareza de objetivos

O presidente Lula chega à metade de seu mandato carente do entusiasmo que despertou no passado.

Recente pesquisa Genial/Quaest mostra queda da aprovação do seu trabalho; pela primeira vez, desde 2023, mais entrevistados o desaprovam. A perda de apoio é significativa por também ocorrer entre seus eleitores fiéis.

Os bons indicadores econômicos —crescimento do PIB e do emprego— não amainaram as críticas dos formadores de opinião que duvidam de sua sobrevida a médio prazo. O aumento do preço dos alimentos parece impedir que aqueles resultados se traduzam em sensação de melhoria para os muitíssimos que vivem com dinheiro contado.

Nenhuma iniciativa do governo tem conseguido erguer o ânimo popular. Muito menos o das elites que desconfiam do mandatário e de seu partido.

Diante disso, fraqueja a fidelidade das legendas de direita que formam a coalizão governista. Dez entre dez analistas preveem obstáculos políticos no Congresso ao longo dos quase dois anos que restam à Presidência Lula.

As dificuldades do governo são de três tipos: institucionais, políticas e de clareza de objetivos.

A arquitetura política brasileira inibe a concentração de poder decisório no Executivo nacional. Federação; multipartidarismo; e, em consequência, governo de coalizão; Congresso bicameral; e Corte Suprema com amplos poderes são a fórmula institucional que desconcentra poder, restringe a capacidade de ação unilateral da Presidência e bloqueia governos de um só partido. Assim, obriga a negociação de consensos entre lideranças e legendas distintas.

O resultado é um processo sempre lento e difícil de administrar. E ainda mais complicado quando, ao longo da última década, o Legislativo se fortaleceu frente ao Executivo.

Nesse arranjo, líder apto é aquele que agrega, negocia, convence e concede; nunca o que trata de impor sua vontade ou o programa de seu partido.

Se as coalizões de governo são sempre necessárias, porque resultantes de fatores institucionais, a atual administração enfrenta outra dificuldade —esta, de natureza propriamente política: para governar, o presidente de centro-esquerda precisa das forças de direita, majoritárias no Congresso. Porém, ter a direita no governo naturalmente reduz a ambição de qualquer agenda progressista.

Nada disso é novidade para o presidente Lula. Afinal, no passado, ele governou com coalizões que incluíam partidos do centrão. Negociador nota 10, soube construir consensos em torno de políticas de inequívoco impacto social.

Embora as instituições e as novas prerrogativas de um Legislativo dominado pelos conservadores imponham limites a iniciativas de centro-esquerda, não parece estar principalmente aí o nó que amarra a gestão atual a um desempenho fosco.

Pois já não basta ao seu condutor dizer que suas metas são cuidar do povo e garantir trabalho e comida para todos os brasileiros. Faltam a Lula 3 nitidez de objetivos, foco e prioridades claras —uma política econômica que explicite compromisso com a estabilidade da moeda e o crescimento sustentável e uma agenda social inovadora que enfrente a questão da qualidade dos serviços públicos e da criação de oportunidades de desenvolvimento para pessoas e famílias.

 

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