Por Thiago Prado / O Globo
A temporada de projeções sobre a eleição de
2026 continua e chegamos à segunda entrevista da nossa série com estrategistas
políticos e donos de institutos de pesquisas para avaliar as chances de Lula conseguir
seu quarto mandato.
Desta vez, falamos com Marcello Faulhaber, o coordenador das
últimas campanhas de Eduardo Paes no Rio, que vai contra a corrente das falas
dos últimos sete dias. Economista, Faulhaber também esteve no núcleo de
estratégia da campanha de Lula contra Jair
Bolsonaro em 2022, ao lado do atual Secretário de Comunicação do
Planalto, Sidônio Palmeira.
Na semana passada, Renato Pereira, o novo marqueteiro do governador de Minas
Gerais, Romeu Zema (Novo), cravou para o Jogo Político que a próxima corrida ao
Planalto será de mudança. Foi o mesmo espírito da fala do presidente do
PSD, Gilberto
Kassab, que disse que Lula perderia a disputa se ela ocorresse hoje.
Faulhaber está mais alinhado a outra linha de
pensamento, que se fortaleceu nesta semana, após a divulgação da pesquisa Quaest colocando o petista na frente dos
adversários de direita em todos os cenários analisados.
Destaco dois artigos na imprensa que também
enxergam Lula como favorito. Nesta terça-feira, no GLOBO, o editor-executivo Paulo Celso
Pereira escreveu que será difícil derrotar o PT em 2026: "Lula tem a
máquina pública a seu favor, o maior partido do país, o segundo maior fundo
eleitoral e controla o tempo". Na "Veja", Thomas Traumann
foi pelo mesmo caminho em texto da última segunda-feira: "Lula terá a
máquina federal nas mãos. Apenas o ex-presidente Jair Bolsonaro conseguiu
perder uma eleição estando no cargo. Do lado da oposição, há muita vaidade e
pouca organização".
Abaixo, os principais trechos da conversa com Faulhauber.
Por que você discorda de Renato Pereira e
Kassab e acha que Lula é favorito para vencer em 2026?
Por quatro razões. Primeira: a economia vai
melhorar. A bolsa vai subir, ao contrário do ano passado, a curva de juros vai
cair e o dólar também. Voltaremos ao patamar de R$ 5,50.
São projeções completamente diferentes das
feitas pelo mercado...
Mas isso é porque houve chantagem, pressão e
percepção equivocada. O mercado ficou muito tenso com a entrada do Gabriel Galípolo
no Banco Central, igual esteve quando o (Fernando) Haddad entrou no Ministério
da Fazenda. Queriam saber: "Vai trabalhar para a gente ou para o
governo?". Como ele começou subindo os juros, já deram uma acomodada. Já
trabalhei no mercado, sei como funciona. Não dá para apostar contra durante
tanto tempo.
E o impacto das decisões de Donald Trump na
economia global e no Brasil?
Não acho que a política de tarifas do Trump
nos afetará. Temos a China como grande parceiro comercial. No limite, Trump
pode acabar fazendo o dólar cair no mercado mundial. Também não acho que ele vá
querer subir juros agora. Ou seja, tenho uma visão bem mais otimista da
economia. Tirando a inflação de alimentos, que vai cair, o povo está vendo um
país melhor. A economia está muito superior ao que se pinta aí, com bons
índices de crescimento e emprego. Mais uma vez, é só o mercado que está vendo
pior.
Mas e a queda da popularidade de Lula entre
os mais pobres, apontada pelas pesquisas?
Foi basicamente o estrago feito pela crise do Pix. Lula
enfrenta uma direita engajada e mentirosa. E hoje vivemos em um país diferente
dos governos Lula I e II. Ele nunca mais vai ter aqueles patamares de
popularidade. Arrisco a dizer que nunca mais um governante terá mais de 65% de
aprovação popular. Tem um terço da população que não quer ouvir o outro lado,
não interessa se a vida está melhorando.
Quais as outras razões que tornam Lula
favorito para 2026?
A direita vai vir muito esfacelada. Ronaldo
Caiado, Romeu Zema,
um candidato do Bolsonaro, Gusttavo
Lima, Pablo
Marçal. Vai haver uma guerra fratricida entre eles, e o voto não se unirá
no segundo turno. Terceira razão: Donald Trump, com essa postura de imperador
do mundo, vai forçar uma união global contra os Estados Unidos. A direita vai
ficar sozinha defendendo alguém que acha que brasileiro é nada. Isso pode
mobilizar um sentimento patriótico verdadeiro.
O boné azul "O Brasil é dos
brasileiros" usado pelos governistas já é pensando nisso?
Com certeza. Na América Latina, por mais que
a elite financeira se ajoelhe para os Estados Unidos, o povo não gosta de
postura submissa, independentemente da cor ideológica. Getúlio Vargas já surfou
nessa onda, Ernesto Geisel... Sempre acontece quando os Estados Unidos adotam
essa postura de Doutrina Monroe que o Donald Trump está usando.
E a quarta razão para Lula ser favorito?
É mais histórica, mais destino, quase
metafísica. Antes do Big Ben, já estava escrito nas estrelas que o Lula
entraria para a história como o maior presidente do país. Ele é uma espécie de
Romário da política. Sabe aquele papo de "Deus olhou lá de cima e apontou
e disse: esse é o cara"? Ele é escolhido, a história dele é contra todas
as possibilidades, against all the odds.
Você concorda com a crítica de que o governo
Lula III não tem uma marca?
Marca é um negócio muito de marqueteiro. Qual
foi a marca do Bolsonaro? Nas pesquisas, aparecia o Pix e tal, mas, no geral,
não tinha nada. E, mesmo assim, quase ganhou a eleição. Não sei se isso é
fundamental, não. Mas ajuda, claro. O governo, de fato, não tem uma marca. Mas
poderia ter. O Desenrola é um ótimo programa que comunicaram muito pouco. A
volta do aumento real do salário mínimo deveriam comunicar muito mais, já que,
com Bolsonaro e Temer, isso não ocorreu. O Pé-de-Meia é muito bom. Acho que a isenção de imposto de renda para quem ganha menos de
R$ 5 mil pode gerar uma marca, precisa pensar um nome para isso.
O fato de estar engessado por um Congresso
hostil e com tanto dinheiro destinado às emendas também não atrapalha o
governo?
Essa é uma realidade a que todos temos que
nos acostumar. Não vai mudar nunca mais. O Brasil tem um presidencialismo refém
do Legislativo. Emenda vai ser muito útil, até o dia em que acontecer uma nova
Lava-Jato. A melhor forma de o país melhorar seria caminhando para um
parlamentarismo no pós-Lula. Para evitar a política pop de cantores e
apresentadores. Isso obrigaria o país a girar em torno de partidos. "Ah,
mas o Centrão vai ficar 30 anos no poder". Será? O povo vai se adaptar.
Hoje, toda a crise de popularidade cai na conta do presidente, quando aqueles
que comandam Câmara e Senado têm o mesmo poder. Com o parlamentarismo, não vai
ter como se esconder. O governo vai ser tocado pelo Hugo Motta,
pelo Arthur
Lira, pelo Eduardo
Cunha, e eles serão cobrados por resultados.
Você acha que Lula deveria repetir a chapa
com Geraldo Alckmin para 2026?
Acho que não, mas é o que ele vai fazer.
Deveria procurar um vice não de São Paulo, mas de Minas Gerais ou de Goiás,
onde estarão os adversários.
O governador de São Paulo, Tarcísio
de Freitas, não pode ser um adversário de Lula?
Não acredito que venha candidato. Ele é
conservador e toma poucos riscos. Tem uma reeleição bem tranquila em São Paulo
e 2030 vai ser uma reedição de 1989. Esquerda e direita bem divididas e ele
sendo governador de São Paulo sairá bem favorito.
Então quem é o nome da direita mais apto a
desafiar Lula em um segundo turno?
Os governadores de Minas Gerais, Romeu Zema,
e de Goiás, Ronaldo Caiado. Podem atrair o eleitor médio, vão ter dois
mandatos, coisa para mostrar. Não levo fé em Gusttavo Lima, acho balão de
ensaio, e penso que Pablo Marçal estará inelegível.
Não acredita no potencial de Eduardo ou
Michelle, caso sejam escolhidos por Bolsonaro?
Há muita rejeição contra o sobrenome. No
primeiro turno até saem na vantagem contra os governadores, mas depois eles
teriam que carregar isso em um segundo turno, fica mais difícil de atrair o
eleitor pendular que ora está com a direita e ora está com a esquerda. A marca
Bolsonaro acaba afastando.
Ainda acha a economia tema mais importante
que a segurança para eleger um presidente?
Sim, a economia ainda é a o fator
preponderante para a eleição presidencial. Segurança é muito colada na eleição
para governador.
A propósito, esse é o tema que Eduardo Paes,
seu cliente, está batendo o tempo todo nas redes. Ele virá como candidato a
governador ano que vem?
Quem sou eu na fila do pão para te responder
isso?
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