- Valor Econômico
Grupo de Bolsonaro sai desmoralizado em disputa pelo PSL
O PSL era uma casa que não tinha teto, não tinha nada. Na Rua dos Bobos, cresceu com a chegada do número zero. Bolsonaro converteu o casebre num palácio partidário. Realizou benfeitorias, mas o inquilino, por mais poderoso que seja, não porta o título de proprietário. É aluguel. E o locador - o fundador da legenda, Luciano Bivar, ele mesmo eleito deputado na esteira da campanha presidencial - exige a devolução do imóvel. O confronto que implode o PSL não pode ser entendido sem se considerar o poder que os caciques partidários têm no Brasil, bem como a liderança que Bolsonaro perdeu entre os próprios pares, em apenas dez meses de mandato.
Não é todo dia que um presidente da República é abandonado por mais da metade da bancada de seu partido na Câmara, cujo líder o xinga e diz que vai implodir o chefe do Executivo. Não é todo dia que um presidente está na mira para ser enxotado do partido junto com os filhos 01, o senador Flávio, e 03, o deputado federal Eduardo Bolsonaro, prestes a serem apeados do comando dos diretórios estaduais do Rio e de São Paulo.
É esse o resultado do dia de temperatura mais elevada na guerra de facções entre bivaristas e bolsonaristas, que levou ainda à destituição da líder do governo no Congresso, Joice Hasselmann, e o vazamento de gravações depois de um duelo de listas de assinaturas pelo controle da liderança da bancada do PSL na Câmara.
Bancado pelo pai, Eduardo viu, ao fim e ao cabo, seu brinquedo negado. Não precisou nem chegar ao escrutínio do Senado. Para quem perdeu a queda de braço numa disputa partidária interna, o sonho do “capo” das relações externas brasileiras de ser embaixador nos Estados Unidos ficou para trás. Bolsonaro desistiu de indicar o filho para o posto, pois é assim que costuma agir. Vitorioso em todas as eleições de que já participou, preferiu recuar a se ver exposto a derrota que envolva votos. A suposta influência sobre Donald Trump já havia sido desmascarada com a decisão dos Estados Unidos de não indicar o Brasil à Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). A pataquada virou até meme em que o presidente americano faz troça com Bolsonaro: “Fiz OCDE bobo”. A crise no PSL tornou o plano ainda mais inviável.
Em dez meses, a ideia de indicar Eduardo à embaixada foi o fato que causou mais desgaste no eleitorado bolsonarista. Agora, no pior momento desde o início do governo, o presidente recua em favor do filho para não ampliar o estrago. O time está perdendo. Bolsonaro não sabe sequer para onde e como levar o seu grupo político, ferido e desmoralizado no embate com os próprios correligionários, que não querem mais sua presença. Ficou radioativa.
A fúria com que o líder Delegado Waldir vociferou contra Bolsonaro, durante conversa com a ala bivarista do PSL, mostra o nível de ressentimento, raiva e desconfiança que tomou conta da legenda. No áudio vazado pelo deputado infiltrado Daniel Silveira (PSL-RJ), o parlamentar reclama para os colegas: “Eu andei, no sol, 246 cidades gritando o nome desse vagabundo”. Diz ainda ter uma gravação comprometedora contra Bolsonaro: “Eu implodo o presidente. Acabou o cara”. Constrangido pela revelação dos diálogos, Waldir atribuiu a fala a um “momento de emoção”. Pelo jeito, todos estavam “emocionados”. Outro deputado reclama da intimidação de Bolsonaro para que deixasse de apoiar Waldir e assinasse a lista em favor de Eduardo: “Ele me ligou, constrangendo, meu irmão”. Outro relata: “A gente foi tratado que nem cachorro desde que ele ganhou a eleição. Nunca atendeu a gente em p. nenhuma”. Um terceiro se queixa: “Só liga quando precisa de favor para f. com alguém?”. O quarto ironiza: “Eu nunca fui tão assediado como agora. Nunca ele [o presidente] ligou tanto pra mim, desde a minha posse. Fiquei importante da noite pro dia”.
Em outro áudio, mais antigo, mas que passou a circular em meio ao tiroteio, o deputado federal Julian Lemos, da Paraíba, coordenador da campanha de Bolsonaro no Nordeste, minimiza o atentado sofrido pelo então candidato. “Jair não levou mais facada do que eu. Jair levou uma, eu levei umas cinquenta e estou bem e tirando o cabelo da testa”, diz o parlamentar, aliado do ex-ministro Gustavo Bebianno, o primeiro a ser exonerado pelo presidente. Ao interlocutor, num comentário sobre as eleições municipais, Lemos diz que a percepção no PSL é que a capacidade de Bolsonaro de eleger candidatos não vai se repetir em 2020. “Aquela onda Bolsonaro só existiu por vários fatores, desde facada ao anti-PT. O discurso do bandido bom é bandido morto tem limite”, afirma.
Essa parece ser a mesma avaliação de pré-candidatos a prefeito do PSL que veem com certa indiferença o resultado da contenda entre bivaristas e bolsonaristas. Para o deputado estadual Marcelo do Seu Dino, de Duque de Caxias (RJ), o apoio de Bolsonaro é importante na eleição a prefeito, mas também os recursos do fundo eleitoral, controlado por Bivar, e os 3’30 do tempo de propaganda que, estima, terá. “Ideologia é bom para fazer campanha para o Legislativo. Mas para o Executivo o candidato precisa ter uma quantidade muito maior de votos. Tem que mostrar propostas para todos os segmentos”, diz.
O cálculo político já prevê a desvalorização de Bolsonaro. Mas não a ponto de desprezá-lo totalmente. Apesar da cólera nos bastidores, Delegado Waldir contemporizou em público: “Somos Bolsonaro. Somos que nem mulher traída, que apanha e volta pro aconchego. Nosso papel na liderança é pacificar”.
Mas num dia de derrotas para Bolsonaro, até o filho 02, o iracundo Carlos (PSC-RJ), meteu os pés pelas mãos. O vereador do Rio se desculpou por ter postado, na conta presidencial no Twitter, sem autorização do pai, o apoio à prisão após condenação em segunda instância. O tema começou a ser analisado ontem pelo STF e é alvo de PEC no Congresso. Mas o que é digno de nota é a admissão pública de que Carlos fala por Bolsonaro nas redes sociais. Pelo menos, o pitbull não é filiado ao PSL.
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