No
Brasil, talvez não seja viável uma virada como a do americano
A política econômica do governo Joe Biden vem atraindo certo entusiasmo nas correntes políticas da oposição, pela esquerda, ao governo Jair Bolsonaro. É compreensível. Após muitos anos de difusão do chamado Consenso de Washington, eis que na capital de mesmo nome surge uma administração a propor, entre outras coisas, emitir moeda, reforçar o papel do investimento estatal e taxar quem tem mais para distribuir a quem tem menos.
A mudança ali, com as ondas de influência irradiadas mundo afora, soma-se vetorialmente por aqui a uma certa frustração com a colheita das políticas aplicadas desde pelo menos a Ponte para o Futuro de Michel Temer. Na sequência veio a dupla Bolsonaro-Paulo Guedes. É razoável admitir que existe alguma continuidade nas orientações definidas para a economia pelos governos que mandam no Planalto desde a ruptura de 2016.
Claro
que a análise objetiva exige levar em conta as circunstâncias. Cada um de nós é
ele mesmo e suas circunstâncias. Uma foi o governo Temer ter entrado em modo de
sobrevivência por razões da área policial. Depois, a pandemia de Covid-19 pegou
pela proa a administração Bolsonaro. Mas aí enveredamos pelo terreno das
explicações e justificativas. E na política, a exemplo de outras esferas da
vida, quem começa a se explicar e se justificar já está perdendo.
“Qual
candidato com chance vai propor fazer dívida pública pesada para ampliar o
investimento estatal?”
Os
ventos bidenistas e a crônica pasmaceira econômica acenderam no Brasil o desejo
de uma guinada. Mas qual a viabilidade dela? Que candidato com chances vai
pegar a estrada em 2022 dizendo que fará dívida pública pesada para ampliar o
investimento estatal e prometendo tomar o dinheiro dos “ricos” (que no Brasil,
na prática, incluem uma gorda fatia da classe média) para redistribuir renda
pela mão do Estado?
Políticas
econômicas precisam ter, antes de tudo, viabilidade política. Há sim teóricos
respeitáveis que garantem: fazer dívida em moeda nacional não produz inflação.
Mas qual presidente vai arriscar, no sempre instável cenário institucional
brasileiro, colocar todas as fichas numa teoria contraintuitiva? Se der errado,
seus autores no máximo farão autocrítica. Já o político provavelmente terá ido
para o cadafalso, talvez metafórico.
Há
uma diferença importante entre o Brasil e os Estados Unidos. Eles podem
legalmente imprimir dólares sem lastro e nós podemos imprimir reais sem lastro,
mas não parece que as consequências venham a ser as mesmas. Isso e outros
fatores devem impelir os candidatos competitivos a buscar soluções mais
convencionais. Uma em especial: a atração maciça de capitais externos para
fazer subir a taxa de investimento privado.
Eis
por que no próximo governo, pois entramos na etapa conclusiva deste, talvez um
ministério de importância renovada será o das Relações Exteriores. E quem sabe
não deveríamos voltar nossos olhos também para o Oriente, em vez de apenas para
o Norte? É pouco razoável imaginar que a economia brasileira vai se erguer
puxando os próprios cabelos para cima. Ou colocando todas as fichas de política
exterior numa única casa.
Publicado
em VEJA de 12 de maio de 2021, edição nº 2737
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